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Conselhos ao jovem jornalista econômico. Por Luis Nassif
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Comportamento
Qui, 20 de Agosto de 2020 03:47

Luis_NassifPeriodicamente o jornalismo se torna vítima de determinados bordões.

Hoje em dia, este risco se tornou maior, pelo opinionismo desenfreado decorrente das redes sociais e do jornalismo televisivo atual, com profusão de comentaristas, âncoras, dos quais se exige opinião formada sobre todos os temas.

Como todo fato exige um comentário, vão se cristalizando os bordões, o efeito manada, o uso de afirmações recorrentes, a maioria em cima do senso comum mais raso.

Nessa balbúrdia informacional, há aqueles jovens jornalistas que pretendem se distinguir, não ser apenas o repórter-massa alinhado apenas com o bordão do dia.

Os conselhos vão para essa minoria.

1. Afirmar que tudo o que beneficia o cidadão é populismo político é desconhecer os fundamentos da democracia.

Esse é um dos piores bordões do momento. Qualquer tipo de gasto que possa reverter, ainda que minimamente, aos cidadãos, imediatamente é classificado de “populismo”, de “interesse eleitoreiro”.

Vamos a um pequeno jogo lógico:

* A função principal do Estado é levar o bem estar à população, garantir alimentação, saúde, educação, redução de desigualdades.

* A maneira de medir a atuação do Estado é através do orçamento.

* Em uma democracia representativa, há uma enorme influência de grupos políticos e econômicos sobre o orçamento.

* A única arma do cidadão para ser beneficiado pelos gastos públicos é através das eleições. É com as eleições que se consegue mais atenção à saúde, educação, obras públicas.

* O mérito de um Estado se analisa pela forma como gasta o orçamento, não pela economia que faz.

Quando o político planeja gastos públicos, ele está atendendo à pressão dos chamados interesses do seus eleitores. E quando aumenta o orçamento para educação, saúde, está atendendo aos interesses difusos da sociedade. É da própria essência da democracia. Tratando todo gasto público como politiqueiro ou ilegítimo, significa deslegitimar o próprio exercício da democracia.

Portanto, o papel do bom jornalismo é separar os gastos legítimos dos gastos ilegítimos, jamais o de criminalizar os gastos públicos ou de jogar todos os gastos no mesmo balaio.

2. Todo gasto público é desperdício

Essa generalização é de um primarismo desmoralizante, a chamada lógica da dona de casa. O papel do Estado é gastar os recursos que arrecada através dos impostos. O papel do jornalista sério é analisar a natureza do gasto, sua maior ou menor eficiência.

Além disso, há uma enorme teoria econômica consolidada, sobre o papel do investimento público na reativação da economia e na geração de emprego. Pode haver um questionamento em relação ao nível ou à qualidade do investimento. A generalização do investimento público é o maior atestado de ignorância que um jornalista pode apresentar.

3. Toda privatização é virtuosa ou toda estatização é benéfica

Uma economia não pode ser binária. Há setores em que estatais são essenciais; em outros, o setor privado responde melhor. Opinar sobre privatização exige do jornalista conhecimento muito amplo, da estrutura de funcionamento da economia, da identificação dos setores chaves, os setores essenciais não atendidos pela iniciativa privada, os setores que não comportam monopólio privado.

Por exemplo, o financiamento de longo prazo nem sempre atrai o financiador privado pela falta de funding de longo prazo e pelo baixo retorno do investimento. Daí a necessidade de bancos de desenvolvimento públicos.

Energia é setor essencial. Hoje em dia, o que segura o baixo custo da energia é a Eletrobras, controlando usinas hidrelétricas já amortizadas e fornecendo energia contratada para distribuidoras. Privatizada, os contratos serão substituídos pela venda de energia no mercado aberto, impactando o custo da energia para todos os consumidores. Então, é uma empresa essencial.

Pesquisas em saúde são essenciais, conforme a pandemia demonstrou. Há a necessidade de investimento em pesquisa, sem se pensar em retorno de curto prazo. O papel dos institutos públicos, como Fiocruz, Farmanguinhos, Butantã, é essencial, assim como os fundos públicos de financiamento da pesquisa, como as Fundações de Amparo à Pesquisa e a Finep (Financiadora de Estudos e Projetos). Não se trata de uma exigência de país emergente, mas um padrão de país desenvolvido.

Do mesmo modo, financiamento de agricultura familiar, de pequena e micro empresas, programas como Luz Para Todos, essenciais para o desenvolvimento do país, não são atraentes para o setor privado, exigindo a intervenção pública.

4. Gastar menos não é necessariamente indicativo de eficiência fiscal

Uma empresa privada visa o lucro. Mas se se guiar exclusivamente palor resultados de curto prazo, arrisca-se a comprometer seu futuro, deixando de lado produtos e planos estratégicos que só maturam no médio prazo.

O produto principal do serviço público é a entrega de serviços. Na educação, entregar vagas escolares e bom aprendizado; na saúde, garantir universalização do atendimento. E assim por diante. Essa é a métrica principal: quanto entrega à população em cada área.

Em cima disso, entra a segunda métrica: os recursos investidos em cada entrega, para fazer mais com o mesmo ou mais com mais.

Com as carências sociais do país, uma das maiores iniquidades é punir o gestor eficiente cortando seus recursos. É o que acontece com as Universidades, por exemplo. Se um gestor consegue economizar em determinado setor, no ano seguinte seu orçamento será cortado, para manter o mesmo gastos do ano anterior.

Gestor eficiente é o que faz mais com menos. E, mostrando eficiência, tem que ser premiado com mais recursos, sabendo que resultarão em mais serviços à população.

5. Há excesso de Estado no país

É uma afirmação chocante. Como se falar em excesso de Estado, se não chega nas periferias das cidades, no campo, nas favelas, nas populações mais humildes, justamente as que necessitam de Estado? É tão ridícula a afirmação quanto a de colocar todo funcionário público na condição de privilegiado.

Há uma discussão muito mais complexa e sofisticada entre áreas fim – aqueles que prestam serviços diretamente à população – e áreas meio. E entre as diferenças abissais de salários do funcionalismo, especialmente de categorias influentes, como Judiciário e alta tecnocracia pública.

Não analisar separadamente cada caso é terraplanismo econômico.

6. As Organizações Sociais são mais eficientes que o serviço público direto

Identificam-se contratos mal feitos pelo serviço público direto e apresenta-se como alternativa a Organização Social usando métodos de gestão do setor privado. No caso das OSs, ela é responsável por todos os contratos firmados. Sem indicadores corretos de avaliação dos serviços, tenderá a superfaturar os contratos ou reduzir a qualidade dos serviços para maximizar o lucro.

Não se pode falar em privatização de serviços públicos sem garantir uma regulação e uma fiscalização adequadas. Portanto, maior ou menor eficácia e lisura não depende da natureza do serviço, mas das formas de controle social.

7. A carga fiscal brasileira é alta.

Alta em relação a quê? A tendência é comparar com outros países latino-americanos. Como 7a ou 8a economia do mundo, a comparação relevante é com economias do mesmo tamanho, Analisar a carga tributária como um todo esconde um engano que compromete o analista. A carga tributária é composta por impostos indiretos (que incidem sobre consumo), impostos que incidem sobre salários e impostos diretos (que incidem sobre a renda). Em estudos recentes, se mostrou que o Brasil é um dos países com maior carga de impostos sobre consumo (afetando pobres muito mais do que ricos) e dos últimos em tributação sobre ganhos de capital.

Colocar todos os tributos no mesmo balaio é tarraplanice.

Artigo publicado originalmente em https://jornalggn.com.br/coluna-economica/coluna-economica-conselhos-ao-jovem-jornalista-economico/

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