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Os desafios do presidente Pedro Castillo. Por Mariana Álvarez Orellana
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Comportamento
Sáb, 31 de Julho de 2021 06:25

MARIANA_LVAREZ_ORELLANAPedro Castillo, filho de um trabalhador agrícola da região de Cajamarca, beneficiário da Reforma Agrária de 1969, no governo de Juan Velasco Alvarado, é o novo presidente do Peru. A parcela de terra obtida mudou radicalmente a vida de sua família e Pedro pôde frequentar a escola, tornou-se professor e hoje detém o mais alto cargo da república, depois de derrotar a candidata de ultradireita Keiko Fujimori.

Keiko foi a mais impopular dos 18 candidatos presidenciais que participaram das eleições de 2021, com mais da metade dos eleitores declarando que nunca votariam nela. Mas o reconhecimento de seu nome a ajudou novamente, e ela conseguiu disputar o segundo turno com Pedro Castillo, que nunca tinha ocupado um cargo público, e foi desprezado por muitos observadores e analistas por sua condição de agricultor e professor rural.

Foi uma surpresa? Uma pequena maioria dos setores mais pobres impôs-se à poderosa elite peruana quando era previsível que aqueles que detêm em suas mãos os recursos do poder assegurariam sua continuidade, ao menos pela via eleitoral. Mas a classe dominante não foi capaz de controlar o cenário político: os peruanos comuns, os terrucos [esquerdistas], fartos do modelo que privilegia a iniquidade, o racismo, o ódio, a exclusão, a discriminação, disseram basta.

O modelo neoliberal declinava fazia um tempo. Uma série de presidentes acabaram sendo acusados de corrupção, presos, fugiram ou suicidaram-se. A atenção à saúde e a educação tornaram-se um negócio lucrativo, mas desmesuradamente às custas dos “deserdados da terra”, desesperados com a incapacidade absoluta de um Estado subsidiário dos interesses das elites.

E assim nasceu um governo dos pobres, que agora tem a tarefa de provar que também é para os pobres. O governo do professor rural socialista suscitou grandes expectativas entre o povo, e preocupações entre as elites diante da emergência de um governo progressista, patriótico, democrático, autônomo e anti-imperialista, nacionalista e popular (ao menos no papel), não apegado a ideologias ou dogmas.

E a promessa de uma nova Constituição que plasme o novo Peru. Para que o sonho se realize, é necessário consolidar a unidade das forças progressistas, atuar com serenidade e cautela, banindo o sectarismo, o caudilhismo e o hegemonismo. A direita tenta introduzir moldes que separem Pedro Castillo de Vladimir Cerrón, o Perú Libre do Juntos por el Perú e as forças independentes dos partidos de esquerda. O objetivo é rachar (e se possível destruir) o mosaico que garantiu o triunfo popular.

Durante a campanha, Castillo estabeleceu uma estreita aliança com Verónika Mendoza, do partido progressista Juntos por el Perú, duas vezes candidata a presidente, e procura construir uma coalizão funcional com outros partidos de centro, como Somos Perú, ou com seu próprio partido em relação a questões-chave em direitos humanos, incluindo os direitos LGBT+, direitos das mulheres e a pena de morte.

Hoje a unidade não é suficiente, precisamos da organização da frente social de mudança que se inicia, em que trabalhadores, camponeses, mulheres, técnicos, estudantes e especialistas, vítimas do modelo neoliberal que deveria acabar com a comemoração do Bicentenário, se somem na defesa militante de um governo popular e parte de uma democracia participativa, a garantia da irreversibilidade das mudanças. Hoje, na América Latina, a esquerda é a rua.

A direita já desenvolveu sua política de assédio. O prolongado julgamento causado pela grande mentira de Keiko Fujimori sobre uma fraude eleitoral contribuiu para sabotar a confiança nas instituições eleitorais peruanas e a legitimidade da presidência de Pedro Castillo.

Sua narrativa de fraude, que foi misturada com discursos racistas e macarthistas, também contribuiu para a radicalização dos apoiadores de Fujimori, que recorreram à perseguição e ao assédio de autoridades eleitorais, protestos nas ruas e ataques violentos contra jornalistas e dois ministros de estado.

Seu único objetivo é destituir o novo presidente ou, pelo menos, tornar seu governo insustentável. Já o fez entre 2016 e 2021, quando suas táticas obstrucionistas resultaram na remoção de dois presidentes e na nomeação de outro, o que resultou em protestos em massa contra ele, conduzindo à nomeação do atual presidente, Francisco Sagasti.

A tática de Keiko é semelhante à do ex-presidente estadunidense Donald Trump, que se recusou a reconhecer sua derrota para Joe Biden, procurou pressionar as autoridades eleitorais a “encontrarem” votos para alterar os resultados, e se sustentou num ecossistema de notícias conservadoras dispostas – num episódio dourado de terrorismo mediático – a difundir esta “grande mentira” da fraude eleitoral.

A “grande mentira” de Keiko, repetida pelos meios de comunicação hegemônicos, corre o risco de minar a confiança nas eleições e nas instituições democráticas. Tenta impor o imaginário coletivo de que uma suposta injustiça foi cometida, mas também representa uma ameaça existencial para o futuro do país, porque alimentar medos e ódios pode estabelecer um clima político que venha a ser utilizado para justificar a necessidade de medidas extremas: uma destituição pelo Congresso ou um golpe militar.

Keiko não está disposta a aceitar a derrota pela terceira vez, e adotou a mesma tática de terra arrasada, evidente durante sua recente atuação como líder da oposição.

O mestre da manipulação de seu pai (o ditador Alberto Fujimori), Vladimiro Montesinos, interveio da prisão militar em que se encontra, aconselhando Keiko sobre como debater com Castillo e como subverter os resultados eleitorais, incluindo a arrecadação de fundos para esta iniciativa.

Alguns de seus aliados mais próximos, como o romancista Mario Vargas Llosa, justificaram abertamente um golpe de Estado: “Tudo o que for feito para frear essa operação obscura contra a legalidade, contra a democracia, é perfeitamente justificado”, disse ele.

Hoje, a possibilidade de um golpe militar parece remota. Mas um cenário possível é que os vários partidos de direita no Congresso se unam para forçar a saída de Castillo do cargo, utilizando a cláusula de “incapacidade moral” da Constituição, que requer apenas 87 dos 130 votos dos congressistas.

É a primeira vez na história do Peru que alguém como Pedro Castillo, filho de camponeses analfabetos, ganha a presidência, e que resistiu à avalanche de ataques macarthistas, insultos raciais e esforços para roubar as eleições.

Mas, em 28 de julho, se tornará presidente de um país profundamente dividido e especialmente atingido pela pandemia. Castillo carece de uma maioria no Congresso, com apenas 37 dos 130 assentos, e enfrentará um bloco hostil de partidos de direita que buscará frustrar sua agenda política e poderia tentar removê-lo.

Não há dúvida de que o establishment continuará – tal como os meios de comunicação hegemônicos – com sua postura hostil em relação a seu governo, pressionando para levar o Peru ao ponto de ruptura. Castillo terá que desenvolver sua habilidade de construir uma frente sólida e avançar para uma democracia participativa, resistindo às tempestades e turbulências que se formam na teia corrupta das instituições.

*Mariana Álvarez Orellana, antropóloga e professora, é pesquisadora do Centro Latinoamericano de análisis estratégico (CLAE).

Tradução: Fernando Lima das Neves.

Publicado originalmente no portal do Centro Latinoamericano de análisis estratégico.

 

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