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Entre o longo passado e o curto futuro. Por Paulo Fábio Dantas Neto
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Cidadania
Dom, 29 de Junho de 2008 04:38
Pra quem foi à convenção do PT e ouviu o discurso do Governador Jacques Wagner pôde ficar um pouco mais tranquilo quanto aos fundados temores de Paulo Fábio. O artigo é uma aula de como se conjectura e exercita a grande política, entre a firme linha de argumentação e a sábia elegância de estilo. Vale a pena a leitura. Numa reflexão sobre o tempo, a história e a política, Hannah Arendt sugere que o presente é o momento e a posição criados pelo homem ao inserir-se no tempo para preencher uma lacuna entre o passado e o futuro. O peso da tradição e a tirania dos projetos e ambições atuariam em paralelo, e simultaneamente, para constranger o agir humano, ao qual não restaria, para manter sua condição criadora, outra chance senão encontrar uma diagonal pela qual saltasse por cima da linha de embate entre passado e futuro, embate que é um dilema kafkiano. Essa diagonal é a condição da intervenção do homem no tempo histórico numa perspectiva verdadeiramente política, isto é, criadora do presente.

A lembrança e a interpretação livre do texto da filósofa alemã vieram a propósito da atitude política assumida pelo Governador Jacques Wagner na convenção do PMDB de Salvador que homologou a candidatura do atual prefeito à reeleição. Convenço-me de que o governador ainda não achou a sua diagonal. Com olhos presos ao retrovisor e pensamento fixado no horizonte de 2010 traçou uma linha reta que quer atropelar o presente e tentar repetir, em 2008, o plebiscito que há quatro anos elegeu João Henrique.

O desejo de juntar, indiferenciadamente, os candidatos da "base" do governo contra ACM Neto reitera o bordão de 2004, quando os candidatos da então oposição confundiram-se, em tom pastel, contra César Borges. Mas, para além desse anacronismo que contradiz o discurso de renovação da política baiana, é preciso ver que na fala do governador também houve a preocupação habitual de impedir que fluam, antes de 2010, o conflito próprio do tempo de transição que vive a elite política baiana e a pluralização política que dele decorreria. A "necessidade histórica" da reeleição levanta-se como sombra a nublar as identidades políticas. Ao lado dela, outra necessidade "histórica", também datada em 2010: alimentar regionalmente o centauro de duas cabeças e corpo difuso que se tornou a "base" do governo Lula.

Pode-se contra-argumentar, com alguma razão, que o zelo do governador para com seus aliados da situação municipal da capital deve-se a preocupações do presente com a "governabilidade" do Estado, em destaque a correlação de forças na Assembléia Legislativa. Mas tal contra-argumento é limitado quando se sabe que, na capital, numa queda de braço entre PT e PMDB, ao segundo seria mais seriamente avisado que se comedisse, pois não se precisa de muito para saber que o ministro Geddel depende mais do governo federal do que dependem dele ambos os governos (federal e estadual) juntos. Não é principalmente de governabilidade que se trata, mas de alianças eleitorais futuras.

O presente em Salvador é a decisão sobre o destino do seu governo. Este o conteúdo político substantivo, se pensamos política como coisa pública, não como arena de um jogo corporativo. O que têm a nos dizer as elites políticas sobre isso? Será bom conselho trocar o cenário de uma disputa aberta, no primeiro turno, entre quatro campos reais da política da capital por um plebiscito abortivo que pode amontoar três desses campos num lado só em nome da volta a uma contenda maniqueísta que se teima em não enterrar? O eleitorado soteropolitano, faminto de urna, será vítima, outra vez, de uma blitz dietética sobre o seu cardápio político-eleitoral?

Espera-se mais do governador que tomou a si a missão renovadora. Não se questiona o seu comparecimento à convenção do PMDB, mas o seu discurso. Em vez de declarações sobre uma comunhão de vísceras entre si e o grupo anfitrião bastaria uma sóbria exposição do óbvio: o governador tem responsabilidade de não hostilizar aliados nem permitir que a máquina do governo seja instrumentalizada por qualquer candidatura. Mas também tem partido e com ele votará, conforme a grande política. Em outras palavras, bastaria que o governador fizesse suas recentes palavras do próprio ministro Geddel e lembrasse aos incautos que entre o PMDB e o governo petista há aliança, não fusão. Dizendo o que disse, sente-se cheiro de pequena política rarefazendo o ar. Faz o dever de casa para a sucessão de Lula e para a sua própria reeleição. Mas que será de sua liderança política no pós-Lula, quando assentar a poeira de agora? É imenso o risco das pequenas habilidades de hoje serem deitadas ao chão, com a poeira.

O parto a fórceps da candidatura do deputado Walter Pinheiro resulta desse embate entre passado e futuro. O possível discurso do candidato é esvaziado no prelo, pelo do governador. Pois que sentido haverá na candidatura se prevalecer a idéia de que tanto faz qualquer resultado, desde que se derrote ACM Neto?

Diz a turma do deixa-disso ser bom esperar o que Wagner dirá nas convenções dos demais aliados. Aposta-se na sabedoria verbal do conjunto das falas, da qual não duvido. Mas creio que para as eleições e a saúde política de Salvador melhor é prestar atenção na reação dos prejudicados pelo discurso continuísta do governador. Fará toda a diferença se, numa primeira hipótese, Pinheiro, o PT e os partidos aliados vestirem a carapuça de contrariados e realizarem uma campanha diferenciada, de modo a levarem Wagner a um reposicionamento; ou se, numa segunda hipótese, acomodarem-se ao script e buscarem, cada qual, seu quinhão na futura prefeitura, ou nas chapas de 2010, como cachês políticos pela encenação de um novo plebiscito. A diferença entre as duas hipóteses refletirá nos ônus e bônus que a cidade receberá de suas elites políticas, nos próximos quatro anos. Os últimos quatro terão bastado como lição?


 Professor de Departamento de Ciência Política, pesquisador e atual Diretor do CRH/UFBA. e-mail: [email protected]

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