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Abuso de autoridade: a colheita do que alguns plantaram. Por Marcelo Auler
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Cidadania
Sáb, 03 de Dezembro de 2016 15:44

marcelo-aulerNo momento em que membros do ministério público e magistrados reclamam do Projeto de Lei de Abuso de Autoridade aprovado sorrateiramente por 313 deputados, muitos deles envolvidos em investigações criminais, convém lembrar casos narrados neste blog, em que sobressai a suspeita do abuso de autoridade envolvendo justamente a Força Tarefa da Lava Jato.

Reforço, nesta postagem, o respeito e a admiração que o Ministério Público como um todo, em especial a Procuradoria da República, sempre mereceram de minha parte desde o início dos anos 90, ou seja, período pós Constituição Cidadã. Da mesma forma que registro meu reconhecimento pela necessidade da luta contra a corrupção no país, notadamente no meio político. Mas, isto não ode nem deve se tornar uma prioridade única, a ser feita a qualquer preço, menos ainda passando por cima das leis e do respeito aos cidadãos. Isso, porém, jamais me impediu de pontualmente divergir de alguns deles. Mas, vamos aos fatos para os quais até hoje não obtivemos esclarecimentos.

No domingo,16 de agosto de 2015, a primeira página do Estado de S. Paulo estampava a notícia “MP denuncia dissidentes por calúnia na Lava Jato” (veja ao lado). A chamada não especificava os “dissidentes”. Na página interna, porém, apresentava os nomes do delegado Mario Renato Castanheira Fanton e do Agente de Polícia Federal, Dalmey Fernando Werlang (do qual publicaram foto), acusados de se associarem para “ofender a honra dos colegas” ao apontarem grampos ilegais na cela do doleiro”.

A denúncia, impetrada eletronicamente em 11 de agosto, em pleno feriado do Judiciário no Dia do Advogado, não chegou a ser distribuída à assessoria de imprensa da Procuradoria da República do Paraná. Mas, no final de semana seguinte, o Estadão e o seu blog noticiavam com destaque o fato, publicando fotos da primeira página da acusação.

Na página interna do jornal, a identificação dos réus denunciados por crimes que nem o juízo, nem o tribunal reconheceram

Na página interna do jornal, a identificação dos réus denunciados por crimes que nem o juízo, nem o tribunal reconheceram.

A peça em si foi decidida rapidamente. Os cinco principais delegados da cúpula da Superintendência Regional do DPF no Paraná (SR/DPF/PR) – Rosalvo Ferreira Franco (superintendente), Igor Romário de Paula (diretor da Delegacia Regional de Combate ao Crime Organizado – DRCOR), Maurício Moscardi Grillo (chefe do Grupo de Investigações Sensíveis – GISE), Daniele Gossenheimer Rodrigues (chefe do Núcleo de Inteligência Policial – NIP), Érika Mialik Marena (chefe da Delegacia de Combate ao Crime Financeiro – Delefin) e Márcio Adriano Anselmo (da Delegacia de Combate ao Crime Fazendário – Delefaz) – representaram ao Ministério Público Federal (MPF) dizendo-se caluniados pelos dois colegas, com as inverdades que fizeram constar das investigações, conforme noticiamos em Calúnia na PF-PR: juiz rejeita denúncia e critica MPF.

A representação, datada de 7 de agosto, foi distribuída a um dos procuradores da República de Curitiba encarregados do Controle Externo da Polícia, Daniel Coimbra. Ele, na denúncia, classificou os dois policiais como “dissidentes”.

Logo após protocolar eletronicamente o documento, Coimbra viajou no gozo de suas férias. Ou seja, subtende-se que foi considerado algo tão importante que não poderia aguardar seu retorno.

Curiosamente, os dois policiais não aparecem como investigados no Inquérito Policial 737, instaurado pelo próprio Fanton para apurar a possível venda de dossiês contra a Lava Jato. Uma investigação que surgiu a partir de informes gerados pelo delegado Igor Romário. O “crime” de Fanton foi justamente suspeitar que o IPL 737 foi criado em retaliação. Graças a esta sua desconfiança, ele acabou obtendo de Werlang a confissão da instalação de um grampo ilegal na cela de Alberto Youssef e outro no fumódromo da Superintendência Regional do Departamento de Polícia Federal do Paraná (SR/DPF/PR).

Relembre-se que àquela altura, uma sindicância presidida pelo delegado Maurício Moscardi Grillo concluíra que o grampo da cela não estava ativo, o que, a partir do trabalho de Fanton, mostrou-se falso. Mas nada disso atraiu a atenção dos procuradores do Grupo de Controle Externo da Polícia, da Procuradoria da República do Paraná que na denúncia por calúnia se mostraram ágeis, embora não precisos.

A partir destes fatos, Werlang – que até hoje não teve seu pedido de aposentadoria homologado – e Fanton passaram a ser tratados como personae non gratae.

Agente Dalmey Werlang (à esquerda) e DPF Mario Renato Fanton,denunciados por calúnia após revelarem o grampo ilegal.

Agente Dalmey Werlang (à esquerda) e DPF Mario Renato Fanton denunciados por calúnia após revelarem o grampo ilegal.

Corrupção imaterial – Presidido posteriormente pela delegada Tânia Fogaça, da Coordenadoria de Assuntos Internos (Coain) da Corregedoria Geral (Coger) do Departamento de Polícia Federal (DPF), este inquérito, como também noticiamos em Com ajuda de jornalistas, delegados criaram versão do dossiê contra Lava Jato, gerou suspeitas de ser uma retaliação ao vazamento, para o mesmo Estadão, das páginas do Face Book de alguns destes delegados que assinaram a representação. Nestas páginas, eles faziam proselitismo político pró Aécio Neves e contra Dilma Rousseff e o então presidente Lula, na campanha eleitoral de 2014.

Na 12ª Vara Federal de Curitiba, o juiz Danilo Pereira Júnior, não apenas rejeitou a denúncia, como em uma crítica velada ao MPF, apontou erro na capitulação do tipo penal.

Pereira Júnior entendeu que os policiais, em tese, agiram como deveriam, informando aos superiores aquilo que supõem crime. Somente no caso de as suas informações não se confirmarem é que teriam incorrido em ato criminoso. Mas não seria a Calúnia, prevista no art. 138 do Código Penal (com pena de detenção de seis meses a dois anos) e sim a Denunciação Caluniosa – art. 339 do CP, com possibilidade de prisão de dois a oito anos.

A decisão do juiz de primeira instância foi mantida pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, extinguindo assim o feito, já que não coube mais recursos. Mas a pecha de caluniador e dissidente permaneceu no ar contra os dois policiais. O Estadão não mais voltou ao caso.

Acusação leviana – Este, porém, não foi o único  ato que se pode considerar como abuso de autoridade proveniente da Força Tarefa da Lava Jato, cujos procuradores chegaram a ameaçar a deixar as investigações de lado, caso o Senado confirme a legislação aprovada pelos deputados. Não percebem que eles próprios, junto com delegados da Polícia Federal e com o próprio juiz Sérgio Moro, criaram situações que servem hoje aos políticos corruptos ou não de motivação para dar limites ao trabalho que realizam.

Ou seja, juízes e magistrados de todo o país colhem hoje o que uns poucos plantaram.

Na revista Época a acusação a Gnazzoi

Na revista Época a acusação a Gnazzo…

Citemos o caso do delegado Paulo Renato Herrera que junto com o ex-agente da Polícia Federal, Rodrigo Gnazzo e os advogados Marden Maués e Augusto de Arruda Botelho de Castro foi apontado como dissidente e indiciado pela delegada Tânia Fogaça pelo crime de “corrupção imaterial”.

Por tudo que se apurou do caso, o único “crime” que ele e os demais cometeram foi o de tentar levar ao conhecimento das autoridades superiores irregularidades que estavam sendo cometidas nas investigações da Lava Jato. Falavam, por exemplo, da tentativa de investigar suspeitos com direito a foro privilegiados, utilização de grampos ilegais, intimidação de presos preventivamente para se obter delação premiada, entre outras irregularidades.

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… que o ofício do DPF desmente.

Foram acusados de elaborar um dossiê – jamais apresentado, simplesmente por não existir -, para vendê-lo a advogados de forma a melar toda a investigação da Lava Jato. Destaque-se que até hoje não surgiu nenhum advogado que admita ter recebido a oferta. Na reportagem que já citamos acima – Com ajuda de jornalistas, delegados criaram versão do dossiê contra Lava Jato – mostramos evidências de que esta acusação foi criada por delegados da Lava Jato, inclusive com a ajuda de jornalistas, após a divulgação do “furo” da repórter Julia Duailibi, no Estadão, das páginas do Face Book destes mesmos delegados com posicionamentos políticos.

No auge da disputa entre esses dois grupos dentro da SR/DPF/PR, surgiram novas denúncias na imprensa, certamente vazadas por membros (autoridades) da Força Tarefa.

Gnazzo, por exemplo, teve o nome envolvido pela revista Época em um caso de desaparecimento de recursos de uma operação policial. Informação veiculada em outubro de 2015, no bojo de uma matéria especulatória sobre uma reunião do ex-presidente Lula com o já ex-ministro da Justiça. Marcio Thomaz Bastos. Porém, como se nota no ofício reproduzido ao lado, assinado pela corregedora regional do DPF, Rosicleya Baron de Albuquerque Barradas, no mês seguinte, novembro de 2015, constatava-se que “não foi localizado nenhum registro de inquérito policial (ou investigação preliminar) em curso ou já encerrado” envolvendo o ex-agente do DPF.

Pode-se ou não falar em abuso de autoridade no vazamento de tal informação?

O abuso de autoridade ocorreu ainda em episódios famosos, como a divulgação dos áudios da conversa entre o ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva e a então presidente Dilma Rousseff; as conduções coercitivas sem que fossem feitas intimações anteriores; o longo período de prisões temporária e/ou preventiva para forçar delações; e até pressão para réus mudarem os advogados.

Mas o abuso de autoridade também ocorrer com a omissão. O chamado crime de prevaricação, quando um agente público deixa de cumprir deu dever, por motivações variadas, Inclusive para beneficiar apadrinhados. Infelizmente isso também ocorreu na Lava Jato e não foram fatos isolados.

Meire Poza e Nelma Kodama, personagens que não mereceram a devidas atenção do MPF.

Meire Poza e Nelma Kodama, personagens que não mereceram a devidas atenção do MPF.

Irregularidades nessa operação foram muitos e aqui falamos de algumas desde agosto de 2015 quando abordamos o assunto pela primeira vez em Lava Jato revolve lamaçal na PF-PR. A doleira Nelma Kodama, por exemplo, mandou um bilhete ao desembargador Pedro Gebran Neto reclamando que quando se recusou a colaborar com uma delegada federal, foi imediatamente transferida para o presídio onde teve a cabeça raspada e perdeu 13 quilos.

Nesse bilhete, como mostramos na reportagem Quem com ferro fere… Força Tarefa da Lava Jato pode tornar-se alvo de delação premiada, ela não só revelou a pressão para se tornar “colaboradora”, como mostrou que desde o início da Operação Lava Jato – ela foi a primeira a ser presa quando embarcava para Milão, na Itália, dois dias antes de deflagrarem a primeira fase – delegados e procuradores tinham como alvo os políticos com direito a foro especial, mesmo sem nada comunicarem ao Supremo Tribunal Federal.

Aos amigos, tudo; aos inimigos, a lei – A mesma postagem fala do papel da “infiltrada” Meire Bonfim da Silva Poza usada pelo delegado Marcio Adriano Anselmo como informante e que hoje vive amedrontada com a ameaça de alguns processos contra ela. Nos seus relatos, reafirmados em depoimento prestado ao procurador regional da República em São Paulo, Osório Barbosa, ela cita até “busca e apreensão” montada para que a polícia justificasse documentos que já estavam sem seu poder. O que fez o Ministério Público Federal, a quem cabe o controle externo da polícia? Nada.

A omissão mais grave, porém, diz respeito ao grampo encontrado na cela do doleiro Alberto Youssef, no final de março de 2014. Muitas das minhas fontes e/ou amigos, inclusive desembargadores e procuradores, questionam o que dizem ser minha obstinação com este caso. Fique claro, que não imagino que a divulgação do resultado das novas investigações já concluídas, porém mantidas em sigilo pela Polícia Federal, Ministério Público Federal e o próprio juiz Moro, vá melar a Operação Lava Jato como um todo. Isso, hoje, é impossível de acontecer.

Mas, atingirá diretamente o núcleo central da Força Tarefa dentro da Superintendência da Polícia Federal, justamente por ele ter sido instalado com o conhecimento do superintendente, Rosalvo Ferreira Franco (superintendente), Igor Romário de Paula (diretor da Delegacia Regional de Combate ao Crime Organizado – DRCOR) e Márcio Adriano Anselmo (da Delegacia de Combate ao Crime Fazendário – Delefaz). Envolveu ainda outros dois delegados, Maurício Moscardi Grillo (na época chefe do Grupo de Investigações Sensíveis – GISE) e Daniele Gossenheimer Rodrigues (chefe do Núcleo de Inteligência Policial – NIP). Tais envolvimentos talvez justifiquem o sigilo que se mantém sobre este caso. Evita-se, assim, a punição que tal “crime” deveria gerar, o que não deixa de ser uma prevaricação.

O caso do outro grampo – instalado no fumódromo, sem autorização judicial, para bisbilhotar o que os servidores da Superintendência comentavam – mostra bem o jogo de interesses e a parcialidade da Força Tarefa da Lava Jato quando se trata dos seus. A ilegalidade do grampo ficou patente na sindicância feita de Coain/COGER/DPF. Não havia autorização judicial para sua instalação. Ainda assim, a única consequência dele foi a suspensão da delegada Daniele, autora da ordem para a sua instalação. Foi suspensa, mas sequer perdeu o cardo de chefia que já ocupava.

Pode-se ou não falar em tratamento diferenciado?

Artigo publicado originalmente em http://marceloauler.com.br/abuso-de-autoridade-a-colheita-do-que-alguns-plantaram/#sthash.BspIk9Sz.dpuf

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