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Os ratos e o barco: Moro, militares e o governo Bolsonaro. Por Felipe Demier
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Dando o que Falar
Sáb, 25 de Abril de 2020 05:26
FelipeA ala dos cruzados cátaros, os reacionários moralistas togados liderados por Moro, parece estar abandonando o barco neofascista, o que, possivelmente, arrastará um amplo setor das classes médias reacionárias se não para uma oposição ao governo, ao menos para uma indiferença política apática. Os ratos, é verdade, não costumam se enganar quanto à ocorrência de um naufrágio, pois, localizados nos porões, são os primeiros a perceber a água entrar na embarcação. No entanto, diferentemente de seus congêneres no reino animal, Moro e seus albigenses não cometem suicídio ao pularem para fora da nau, já que há botes burgueses a os esperar, com bem mostrou o convite feito por Witzel ao ministro demissionário. Assim, como a metáfora roedora não é perfeitamente ajustável aos acontecimentos em tela, os quais permitem possibilidades que naquela são quase impossíveis, a saída de Moro não necessariamente sentencia o naufrágio, e sim o fato de que agora o capitão se vê obrigado, ou mesmo talvez tenha optado, a depender cada vez mais dos seus colegas de farda para conduzir o leme.

 

Enquanto isso, uma parcela dos tripulantes da segunda classe se inclina a tomar o caminho dos ratos, e saltar ao turbulento mar e se agarrar aos botes, mas fazendo pomba de leão, embora mal disfarce que, por um instante, mais precisamente pela manhã desta sexta-feira, ficou tão confusa quanto bois que ouvem ao mesmo tempo dois berrantes soarem em margens opostas do rio. Na terceira classe, uma enorme quantidade da tripulação está sendo lançada ao mar para por ora distrair os tubarões e diminuir o peso da nau, o que permite também consertar certos rombos em seu casco, em especial um que não existe, mas que todos os marujos creem tal qual nas sereias, o chamado rombo previdenciário. Outra parcela desta pobre tripulação, tomada pelos cantos dessas mesmas sereias neofascistas e neoliberais, se atira voluntariamente ao mar, acreditando que os tubarões são só uns peixinhos, como lhe disse pelo alto-falante seu capitão. Outra parcela, no entanto, já começa a perceber, mesmo que lentamente, mesmo que mais devagar do o afundar do barco, que o seu capitão só pode lhe oferecer um caixão ou o estômago de um tubarão.

Já na primeira classe, em meios aos múltiplos acontecimentos que conformam um turbilhão, fica clara a indecisão, a divisão e, por conseguinte, "reina a confusão", como gosta de dizer um marujo vermelho, o meu amigo Jorge. Praticamente toda a tripulação desta primeira classe, mesmo que não lá muito satisfeita, confiou a sua viagem, segurança e milhão às mãos do capitão, afinal, mesmo que agressivo e vulgar, era melhor ele, pensaram, do que um cordato timoneiro, mas com barba de Brutus e cheiro popular. Agora, no entanto, perceberam que essa opção por um capitão que, relativamente autônomo, decide ele mesmo o trajeto do cruzeiro, e nele inclui propositalmente rochedos e icebergs prometendo que depois destes haverá uma ilha paradisíaca com submissos selvagens sem direitos a servir a todos, é um pouco arriscada demais. Assim, alguns desses insignes senhores da primeira classe da nau podem já estar cogitando que, sim, os rombos no casco devem ser retificados, os pobres tripulantes devem ser jogados aos tubarões e os selvagens serviçais sem direitos serão bem vindos, mas, para tal, faz-se necessário reagrupar alguns ratos cruzados que pularam para os botes, convidar um médico que há pouco também o fez citando canções pantaneiras, e, assim, convencer os almirantes ao lado do capitão que são eles, de preferência um deles, quem devem assumir o leme do barco, de modo que o naufrágio seja evitado e o cruzeiro ultraneoliberal seja continuado. Esse almirante, claro, poderia ser também um neofascista e saudosista dos tempos em que as chibatas faziam jorrar rubras cascatas, poderia ser ele também um defensor do tempo em que os homens de um delegado – falecido, aliás, num barco – seviciavam e torturavam à vontade no porão, mas não deveria ele, Mourão, falar isso em alto e bom som. Afinal, o barco tem que ter estabilidade, e estão "todos nesse mesmo barco", mesmo que seus destinos sejam muito diferentes.

O capitão, por sua vez, ainda com o apoio discreto de altos conspícuos membros da primeira classe, e ainda sustentado por outros nada discretos entre ela, parece ter decidido que agora é hora de jogar logo todos os pobres e velhos ao mar e ir pra cima dos rochedos e icebergs, que este caminho, o do genocídio, o dos ímpios, é o único caminho, e que ele é quem vai mostrar isso à primeira classe, pois é ele quem sabe o que é bom pra ela. Ao acelerar, assim, um barco no qual a água já pode ser vista no convés, o capitão, entre uma tosse viral e outra, estufa seu peito de atleta e diz que agora é tudo ou nada, que ele não veio até aqui para afundar, e que o barco será salvo por ele, seus filhos a bordo, os almirantes, os homens de bem e uns piratas bem experimentados em viagens de Rio de Pedras, os quais ele nunca escondeu de ninguém, muito menos da primeira classe, que eram seus amigos de Escritório.

Assim, nas duas opções mais prováveis de serem tentadas, direta ou indiretamente, pelos egrégios homens da primeira classe para fazê-los chegar seguros em terra firme, e, de preferência, aportarem na tal ilha paradisíaca ultraneoliberal, o papel dos almirantes parece ser decisivo. Em uma delas, pelas mãos dos almirantes, o capitão é derrubado, na outra, também por aquelas mãos, ele é ainda mais empoderado. Nas duas, entretanto, a chibata vai ter lugar, uma parcela de ratos vai constar e os tubarões vão fartamente se alimentar. Em nenhuma delas, haverá quaisquer glórias para nossas vidas e lutas inglórias. Resta, assim, à terceira classe, ao menos aos que não quiserem se arriscar a nadar num mar bravio, agrupar-se, organizar-se, acender o pavio, iluminar o chão, ganhar o apoio de muita gente da segunda classe com razão e bom coração, não dar ouvido às sereias, chutar os ratos pelo caminho, e se dirigir ao convés, ciente de que o leme não pode estar nas mãos de ninguém escolhido pela primeira classe, sob pena de só nos restar a morte e, quem sabe, um monumento com as pedras pisadas do cais.

Artigo publicado originalmente no Esquerda On Line

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