Não sou petista. Você nunca foi meu ídolo. Pouco nos conhecemos. Te vi uma vez e tomamos um chopp em Vila Madalena, lá pelos idos de 1983.

Te encontrei novamente agora, no lançamento do teu livro em Salvador. Trocamos umas palavras, um abraço, e só.
Falei sobre você aproveitar seu tempo e você falou que estava com o pé na estrada. Claro que eu já pressentia mais uma prisão.
Não sei o que você fez de errado. Nem sei se fez algo de errado. As denúncias e condenações são sempre nebulosas.
Você virou símbolo de “corrupção” no Brasil. A Ação Penal 470 te condenou “com base na literatura”. Lewandowski disse que não viu crime praticado por você.
Mas acho que sei porque você foi condenado: você é ousado em demasia. Esse foi seu crime maior.
Você foi o pedreiro que preparou a argamassa que colocou de pé a única experiência de governo de esquerda no Brasil em mais de 500 anos. 
Você descobriu onde as cobras moravam e aprendeu a conviver com elas. E tentou domesticá-las.
Hoje você volta à cadeia. Admiro sua tranquilidade. Você não é desse mundo. Ninguém que eu conheça tem essa tranquilidade ao encarar situações tão adversas.
Farão livros e filmes sobre sua vida. Tentarão decifrar esse enigma que é Zé Dirceu: instigante, combatente, coerente, vivo.
Mas o que mais admiro em você é sua dedicação ao povo brasileiro e à luta pela diminuição das desigualdades.
Eu sempre soube, Zé, que o maior problema do Brasil é a desigualdade e não a corrupção. 
Você é um gigante, diante de figuras pequenas e medíocres que as elites produzem para aprofundar o fosso das desigualdades.
Você paga o preço por ser o estrategista da nossa melhor experiência política (mesmo que tão precária).
Você ousou colocar em prática os melhores sonhos.
Sobrou pragmatismo? Faltou maior vigilância contra as armadilhas que viriam para te aniquilar?
Não te aniquilaram, Zé.
A roda da história continua girando e, logo ali, um tsunami afoga o obscurantismo.
Força Zé.

Renan Araújo é médico perito.

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