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Um dia de Cordeiro na Timbalada. Por GalindoLuma
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Seg, 01 de Março de 2021 04:47

Geraldo_GalindoSábado de carnaval à noite. Vários blocos na fila. Foliões inquietos, ansiosos. Na concentração, bebidas, conversas, pinturas no corpo. Muito movimento de cordeiros, seguranças, retaguarda da banda, jornalistas, fotógrafos.

A poderosa banda liderada por Denny iria descer a bela Avenida Oceânica uma hora depois. Ao primeiro cordeiro que encontrei perguntei:

-  Você sabe se ainda tem vagas para trabalho de cordeiros?  - Acho que não, procure o Coronel no carro de apoio.

A todos que perguntei, ninguém conhecia o tal coronel. O último com quem falei  me mandou ir à sede da PM ou ao Corpo de Bombeiros. Um gozador. A alternativa que imaginei foi tentar comprar a camisa de um cordeiro que já estava fardado.  Tinha saído no Bloco no dia anterior e o acompanharia fora da corda no dia seguinte. Não vejo muita diferença. Aliás, na maioria das vezes, fora da corda é mais confortável, menos apertado. A ideia inicial era ser cordeiro em outro bloco, o Camaleão, mas de repente pintou a vontade.  O primeiro cordeiro que tentei subornar não aceitou e passou o recado ao segundo, que passou ao terceiro e assim fui  parar no número 417, bem pertinho do trio, exatamente onde queria. – Quais são as condições? – Bem, lhe pago R$30,00, você trabalha de garçom pra mim e bebe de graça no percurso. – Negócio fechado. Confesso que não entrei pensando em segurar corda – queria me divertir e passar pela experiência ao lado dos cordeiros. E o pior é que tenho a mão muito fina e poderia feri-la. Alguns dizem que ela é fina porque não trabalho e eu revido de que não trabalho porque é fina.

Antes do bloco sair, fiquei me  lembrando dos discursos de Carlinhos Brown  contra as cordas e elas ali bem arrumadinhas no bloco de sua propriedade. Demagogia pouca é bobagem. E o bloco saiu, e  eu tinha que “trabalhar”.  – Seu bosta, segure essa porra dessa corda ou eu boto você pra fora debaixo de porrada,  disse  meu afável  supervisor no nosso primeiro contato. – Eu não tenho luvas. – E você não pegou na hora que recebeu a desgraça do lanche? - Eu também não recebi o lanche e exijo os dois agora, além do protetor auricular. – Quem você pensa que é?  Nesse momento outros colegas também protestaram exigindo luvas e lanches e o nosso superior desapareceu momentaneamente. Rapidamente já tava virando líder daqueles pobres coitados humilhados e explorados. Ganhar R$30,00 depois de uma extenuante e periculosa  jornada lembra a escravidão. O lanche era um suco aguado e um pão surrado com um pedaço de mortadela. 

Fato interessante é que nossos chefes crescem na hierarquia a depender do tamanho. Quanto mais alto, mais autoridade. E a cada momento um deles vai na corda tirar sua lasquinha. Uns gostam de dar tapas nas nossas cabeças apenas por diversão. Outros nos dão uns cascudos tão fortes que chega a ficar careca o local do couro agredido. Os colegas me diziam pra não reclamar senão além de apanhar mais,  eu seria escorraçado. É uma cena bárbara quando os supervisores expulsam um de nós. Eles rasgam a camisa do trabalhador ainda no corpo dele e os jogam do outro lado da corda dando murros e chutes, como a nos dizer: comportem-se.  O Bloco seguia e Denny arrasava como sempre. Meu garçom ia me abastecendo religiosamente e também pelo menos outros dez cordeiros ao nosso lado. É que ficamos amigos e todos já sabiam da história. Eu só segurava agora na corda quando meus amigos anunciavam a presença dos inspetores ou para a saída ou entrada dos foliões no bloco. Alguns desses foliões me  olhavam meio desconfiados. – Eu conheço você de algum lugar? me perguntou uma paulista que flertara comigo no dia anterior dentro do bloco. – Não, deve ser engano. Era muito legal nossa relação de amizade com vendedores de cerveja e catadores de lata. É incrível a solidariedade entre os miseráveis. Quando eles se aproximam com o isopor ou o saco de plástico a gente levanta a corda e eles entram. Não demora muito para serem expulsos e aparecerem novamente mais adiante. Um vendedor de cerveja terminou ficando ao meu lado até o fim, já que vendia para mim e meus próximos e entrava no bloco a hora que quisesse. Quanta promiscuidade! Meus novos amigos me explicaram que eu devia tomar cuidado com a temível tropa de choque. Diziam que aqueles brutamontes adoram bater em cordeiros. Tinham tanto cuidado comigo que quando um pelotão desses aparecia me tiravam da corda por uns instantes. Duas negras lindas, jovens, faziam minha segurança. Em determinado momento, chamei um fotógrafo que havia me fotografado no dia anterior. Queria um registro junto com meus novos amigos.

- Sai pra lá que eu num perco tempo fotografando cordeiros. – Mas eu pago. – Eu faço exposição das fotos  no Shopping Barra, lugar onde você nem entra. – Eu pago à vista. – Pare de me insultar ou chamo a polícia. Logo após, encontro uma colega de trabalho dentro do bloco  que vai fazer as fotos, deixando os supervisores meio desconfiados. Chegaram minhas primas, minhas amigas do Ceará, de São Paulo e de Minas ao lado da corda.  Aquele monte de mulher cheirosa, bonita e bem arrumada me abraçando e  me servindo bebida atraía a curiosidade dos associados e dos chefetes. Estávamos em frente a um famoso camarote do Carnaval e lá de cima o governador, senadores e deputados acenavam pra mim, todos estranhando o  fato inusitado de eu ser um cordeiro de bloco de carnaval. Deviam estar a pensar: que porra GalindoLuma está fazendo ali? No dia anterior eu estava lá com eles no mesmo ambiente. 

Os fiscais achavam cada vez mais estranha aquela situação. Nem ligava pra eles. Eles deviam pensar assim: “ que diabo de cordeiro esquisito é esse”? O bom foi que pararam de me dar cascudos quando viram que o governador me acenou.  Logo resolvi sair. Se continuasse poderia prejudicar meu amigo da camisa 417.  Os 10 amigos e amigas que  conheci nessa fantástica experiência antropológica, todos residentes no Planeta dos Macacos, favela próxima ao aeroporto, foram meus convidados na noite seguinte num prestigiado camarote do circuito. Eles beberam, comeram do bom e do melhor, cortaram cabelo, fizeram unha, tomaram massagens, dançaram na boate, enfim, se divertiram como nunca antes na história do carnaval dos cordeiros. Até hoje são meus amigos, inclusive arranjei uma namorada lá na comunidade, Camila. Ela era tão bonita e gostosa que parecia ser de outro Planeta.

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