Farsa. Por Claudio Guedes
Existem farsas e farsas. As primeiras são processos onde o comportamento ardiloso é bem tramado, sofisticado. É farsa, mas é farsa de qualidade.
E existe a farsa grotesca, de concepção trivial, medíocre, quase burlesca, ridícula.
Por que estou a falar sobre farsa?
Porque li agora na Folha de S. Paulo de hoje, 19/05, matéria sobre o TRF-4. Nesta o jornalista José Marques aponta que o Tribunal não é mais o mesmo. A eficiência demonstrada no processo contra o ex-presidente Lula evaporou-se. O Tribunal voltou ao seu ritmo normal.
Confesso que não esperava nada diferente. Sou um interessado na justiça. Sempre que posso acompanho processos envolvendo questões constitucionais e envolvendo julgamento de políticos. Há alguns anos o faço.
Nunca vi, nem antes, nem depois, algo como o julgamento dos recursos do ex-presidente Lula pela 8° Turma do TRF-4.
Nunca vi.
Minha impressão é que se tratou de uma farsa grotesca.
A justiça quando exige que em 2° instância o recurso de um processo penal seja apreciado, em primeiro lugar, por três (3) desembargadores, o faz para diminuir as chances de erro do estado (autor da ação) contra o cidadão. Três juízes experientes para analisar o processo: a sentença do juiz de 1° instância, os posicionamentos/opiniões da defesa e o teor da acusação. Cada qual, independentemente, deve analisar o processo e se manifestar com base nos autos e nas intervenções orais quando da sessão do julgamento.
O que vimos em 24/01/2018, em Porto Alegre, sede do TRF-4, não foi um julgamento. Foi um linchamento combinado. Três desembargadores agindo de forma ensaiada, negando todas – sem exceção – as questões colocadas pela defesa e tratando um processo penal específico como o julgamento político de um adversário.
A farsa foi, contraditoriamente, denunciada pelos próprios votos dos desembargadores ao concordarem que estavam apreciando uma questão complexa. Sem dúvida não poderiam negar essa característica da questão que praticamente dividiu a comunidade jurídica nacional.
Mas, apesar da complexidade, nenhum dos desembargadores pediu vista ao processo. Todos os três fizeram uma mesma apreciação sobre a conduta do réu, nenhum dos três questionou nenhuma das provas (muito polêmicas) apresentadas pelo MPF, nenhum dos três analisou o comportamento polêmico (e questionado inclusive por ministros do STF) do juiz da instância inferior. Nada.
E não só isso: todos os três concordaram nos votos em negar o recurso apresentado pela defesa e, de forma idêntica, discordaram da pena atribuída ao réu pelo juiz de piso. Discordaram da mesma forma, com precisão matemática.
Qual a probalidade de três juízes independentes ao avaliarem um processo complexo, controverso, com provas e procedimentos penais questionados por parte expressiva de comunidade jurídica nacional, concordarem absolutamente nos votos e discordarem exatamente da mesma maneira do juiz de 1° instância quanto à dosimetria da pena? Baixa, muito baixa.
O resultado do julgamento de Lula no TRF-4 e os julgamentos dos recursos que se seguiram pelo próprio tribunal, sugerem, apontam, para uma articulação prévia pela condenação de forma a impossibilitar uma série de recursos previstos em lei quando existem discordâncias. A unanimidade seria, assim, uma estratégia do tribunal em detrimento do réu. Uma estratégia para apressar o cumprimento da pena pelo réu.
Farsa e pressa. Pressa e farsa.
Os fatos anteriores e os fatos posteriores, cada dia com mais clareza, expõem uma face condenável da justiça brasileira no seu comportamento atípico, singular e parcial, quando do julgamento de uma liderança política da envergadura do ex-presidente Lula.
O processo contra Lula, seja nos procedimentos questionáveis da 13° Vara Federal de Curitiba, seja no trâmite singular, acelerado, no TRF-4, envergonha o país.
Claudio Guedes é empresário e professor.
