Aldeia Nagô
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Jornalismo econômico por Marcelo Miterhof

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Participei da enquete feita pela ombudsman Suzana Singer para sua coluna de 26/1/2014 na Folha de São Paulo. A questão foi: a cobertura econômica está excessivamente pessimista?

A conjuntura não é ruim, embora tampouco seja empolgante. Porém a observação da grande imprensa sugere um pessimismo exagerado. Por exemplo, na sexta passada, um ganho real dos rendimentos médios de 1,8% em 2013 foi manchete negativa na Folha.

O pessimismo (ou o caráter crítico) é uma marca do jornal. Mas o didatismo e a pluralidade, também. Assim, faço a reflexão a seguir, que vale para o jornalismo econômico em geral.

Meu sentimento é que falta esforço para entender a racionalidade econômica não convencional. A tarefa não é fácil.

O liberalismo econômico tem duas vantagens em termos de persuasão. Por ser um paradigma de equilíbrio, que, na teoria, tem dinâmicas autoajustadas (o equilíbrio geral), é mais simples de entender. Além disso, ele evoca um principio “moral” poderoso: a parcimônia, principalmente quando aplicada a terceiros.

O governo deve gastar menos, buscando a eficiência, para manter a inflação baixa e, assim, dar espaço e confiança aos empresários para investir. Para aumentar a competitividade sistêmica, o gasto público deve priorizar a infraestrutura e a educação. De resto, o livre mercado resolve ou “faz sua mágica”.

Um governo agir com uma lógica distinta significa contrariar a “natureza” da economia e invariavelmente tem um resultado final ruim.

A maioria dos economistas crê nisso. Mas o conhecimento econômico tem graves dificuldades de verificação empírica e é viesado por ideologias. Frequentemente, ocorre defesa de interesses específicos como se fosse uma causa pública.

Por isso, a cobertura precisa diversificar suas análises e suas fontes. O período é particularmente relevante, pois o país vive uma batalha ideológica e distributiva em razão da tentativa do governo de enfrentar o histórico problema dos juros altos.

A disputa se iniciou há dois anos e meio, quando o BC baixou os juros, contrariando o manual do mercado. A reação foi histérica (tudo seria voluntarismo) e uníssona nos meios de comunicação. Poucos jornalistas ao menos desconfiaram.

Diante do recrudescimento da crise global, alguns reconheceram o erro. Porém não é fácil mudar de entendimento. Ademais, a tenacidade do rentismo é alta e nem mesmo o governo sinaliza ter disposição para manter o caminho que tomou.

A queda dos juros e a crise mundial explicitaram conflitos que tinham hibernado em razão da apreciação cambial da última década. Agora, há uma disputa de paradigmas: a redistribuição para crescer e seus desequilíbrios (de indicadores econômicos, infraestrutura, sociais etc.) versus a busca por um equilíbrio que promete o crescimento… mas só no futuro.

Nesse contexto, é fácil e legítimo fazer uma cobertura verificando o cumprimento de metas oficiais de inflação e superavit primário. Porém melhor é entender as razões de analistas de distintas cores. Afinal, o ajuste contracionista não é o único caminho possível. As perguntas a seguir sugerem uma investigação.

Superavit primário é relevante em que circunstâncias? A dificuldade de cumprir sua meta significa que a situação fiscal está ruim? O Estado brasileiro é mesmo tão ineficiente? Algum governo pós-democratização fez ajuste fiscal pelo corte de despesas? Se não, por quê? Os gastos públicos são rígidos?

Inflação anual de 6% é alta? Basta compará-la ao atual teto do regime de metas ou à inflação dos países ricos? Um país que passa por mudanças sociais e civilizatórias não tem uma inflação mais alta? Por exemplo, que ocorre se o frete sobe porque a jornada dos caminhoneiros foi mais bem regulada?

Algo parecido vale para o câmbio: um país em desenvolvimento tem balanço de pagamentos mais volátil? Isso implica padrão inflacionário mais elevado? Choques de custo devem ser compensados por juros mais altos e/ou aperto fiscal? Houve reindexação porque a inflação estourou o teto da meta de 2001 a 2003?

As respostas apontam diferenças entre as abordagens econômicas. Há nisso implicações teóricas (neutralidade da moeda, causalidade entre investimento e poupança etc.) e ideológicas, difíceis de entender e separar, repletas de conflitos.

O esforço de traduzi-las seria uma bela contribuição da imprensa para o amadurecimento do país, como tantas vezes ela foi e é capaz de proporcionar.

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