Aldeia Nagô
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Zé Não é gente deste mundo. Por Ernesto Marques

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Há mito tempo digo que Zé Dirceu não é gente deste mundo. Basta olhar a expressão dele aos vinte e poucos anos, preso numa Veraneio daquelas que a PF usava pra ver que uma pessoa normal não manteria aquele olhar blasé, como quem vai de carona ao teatro.

Por acaso é um ser normal, um sujeito que lidera uma passeata com 100 mil pessoas em plena ditadura, sem sequer um velho megafone?

É gente deste mundo um cara entre os mais procurados pelo regime militar, que entra e sai do país com passaporte falso para organizar a resistência contra os golpistas? Não parece coisa de cinema, o sujeito fazer plástica para não ser reconhecido, voltar ao seu país com identidade falsa, casar sem envolver sua companheira nos riscos da atividade política e ter uma vida clandestina em paralelo?

É gente deste mundo um sujeito genial, como muitos da geração de 1968, em vez de fazer inflexões ao centro ou mesmo à direita e se manter no mesmo campo para fundar um partido operário e manter-se na luta, trocando as armas pela institucionalidade?

É gente deste mundo um cara com méritos para ocupar, na política, espaços que foram ocupados por gente como José Serra, Aloízio Nunes Ferreira e tantos outros convertidos, e prefere estar ao lado de um peão ainda bruto e falando errado?

É gente deste mundo um gênio da política como ele é – nem seus mais severos detratores podem negar sua genialidade – saber-se segundo e conduzir o metalúrgico nordestino, como o primeiro dos nossos a chegar à Presidência da República?

Não. Definitivamente, Zé Dirceu não é gente deste mundo. Eu já o odiei várias vezes e tive minhas razões para isso. Xinguei a sua última geração quando ele orquestrou a abertura do capital das empresas de comunicação para o capital internacional. Vociferei quando ele saiu de seus cuidados em Brasília para impedir a eleição de Jandira Feghali para o Senado, pelo Rio de Janeiro e fazer Francisco Dornelles senador, para vingar-se da altivez da deputada comunista quando da votação da reforma da Previdência.

E, claro, sempre creditei a ele, principalmente, tudo que amargamos por conta da política de alianças que nos levou a vitórias eleitorais e a essa tal “governabilidade”. Continuo achando que ele errou muito feio. Entre outras consequências, salvou os oligopólios midiáticos que hoje expõem suas vísceras para as bicadas de corvos, urubus e tucanos. Mas quem não comete erros?

Devo reconhecer que em contraponto aos tantos erros dos governos petistas, sobejam acertos indelevelmente inscritos na História. Os mais de 40 milhões de pessoas resgatados da miséria, a criação do mercado interno que nos livrou das consequências da crise internacional que devastou economias mundo afora, a criação de oportunidades para milhões de jovens sem qualquer perspectiva num governo ‘austerocrata” tucano… sem falar nas repercussões dos acertos petistas por quase todo o hemisfério sul. Em tudo isso tem o dedo desse cara.

Definitivamente, José Dirceu de Oliveira não é gente deste mundo. Gente deste mundo, como eu e provavelmente você, depois da morte fica na lembrança apenas das pessoas mais próximas e queridas. Ele já está eternizado pela História, ainda em vida. Gente como Zé Dirceu pode amargar uns tantos anos de cadeia na juventude e na velhice, seja pelo tacão de um ditador, seja pela caneta de um juiz de primeira instância. Mas ao fim e ao cabo, só quem julga gente como José Dirceu de Oliveira é a História.

Foto de Ernesto Marques.

Foto de Ernesto Marques.
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