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Atrás da cabeça de Gilberto Gil, pululam astros do firmamento, Por Valber Carvalho

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Valber_Carvalho

Sempre que nos cabe uma oportunidade desse tamanho: falar de um ícone de nossa cultura como Gilberto Gil uma preocupação nos invade.

Como falar de alguem tão especial, tão multifacetado sem escancarar enormes lacunas e buracos de esquecimento? Então desde já eu peço a todos que me perdoem.

Gilberto Gil nos orgulha muito porque conseguiu a proeza maior para um artista: ele consegue ser universal sem nunca deixar de ser local. Há muito tempo Gil passou a ser um artista internacional, um daqueles que representa a Bahia em todo o mundo, mas nunca deixou de ser baiano.

Quantas vezes o vimos fazendo dos palcos europeus, asiáticos, africanos e americanos, uma alegre reedição das ruas de Salvador. Estava no Japão e carregava consigo o Terreiro de Jesus, ia aos Estados Unidos da América e levava esse nosso Pelourinho, ou na África, quando encarnava as ruas da Liberdade. Ao vê-lo no Festival de Montreux na Suiça parecia que estávamos com ele na Praça Castro Alves.

Com sua naturalidade, às vezes desconcertante, você Gil, assim como Jorge Amado, transporta essa Bahia preta, alegre e popular, ao imaginário do mundo. Somos imensamente gratos e temos muito orgulho disso.

Mas somente isso não bastaria para Gil ser Gilberto Gil.

Alguem já disse que um grande artista tem que ser um tradutor de seu povo, uma espécie de adivinhador de seus quereres, capaz de identificar e de reverberar o que fala à alma de sua gente.

Toda menina baiana tem um santo que deus dá…

 

Nessa questão Gilberto você é nossa maior referência. Nessa terra de tantos credos e religiões que outro baiano esquadrinhou tanto a busca de Deus quanto você?

Qual de nós buscou tão longe esses retiros espirituais? Mergulhou profundamente na cultura oriental, vasculhou o sentido de deus nos mantras budistas, no deus branco judaico cristão e principalmente no universo politeísta dos deuses africanos.

Mas onde você foi, esteve sempre amarradão na torre de um equilíbrio existencial que lhe permitiu conhecer o extremo do mundo inteiro, mas era só balançar que a corda lhe trazia de volta, sem radicalismos, sem paixões desmedidas e, ao contrário de tantos outros que buscam o conhecimento, voltava mais humilde, mais risonho e infinitamente mais tranquilo, porque mais sábio.

Há quase quatro anos estou pesquisando sobre Irmã Dulce, fazendo um livro sobre a vida dela entre nós e isso está me ajudando a entender melhor a verdadeira espiritualidade.

Para ser um apóstolo do verdadeiro amor cristão, aquele que se baseia no amor entre os homens, é preciso perceber o seu semelhante, e para isso é fundamental diminuir o ego e o orgulho.

E aqui, invocando os orixás, Senhor do Bonfim, Mãe Menininha, a sabedoria de Mãe Stela, Gandhi, Cosme de Farias e Irmã Dulce, nossos protetores populares, vou destacar duas frases de Gilberto Gil que nos servem de pontes para entender esse saber adquirido na busca pelo divino.

Uma na música “Se eu quiser falar com Deus”, você diz assim “se eu quiser falar com Deus tenho que lamber o chão dos palácios dos castelos suntuosos do meu sonho”. Meu Deus! Temos que entender nossa verdadeira dimensão para poder construir nossos sonhos, e só escapando das armadilhas do ego, é que podemos ser felizes e assim chegar a Deus.

A outra ponte está na música “Amarra o teu arado a uma estrela”, e você nos diz: “quanto mais longe da terra/ tanto mais longe de Deus”. Não basta estar confinado em uma igreja, rezando, orando, jejuando ou fazendo suas obrigações em um terreiro.

É preciso atuar para diminuir os solos áridos da desigualdade e do racismo, na comunidade, na sua cidade, no mundo. Semear solidariedade, levar amor e promover quem precisa de nós, é a nossa contrapartida se queremos Deus, ou um lugar melhor.

E por isso tudo que você fez e continua fazendo pela Bahia, pelo Brasil, empoderando de auto estima aqueles que não têm voz, que Geraldo Badá, esse incansável batalhador da cultura popular e seu amigo leal, tomou essa belíssima iniciativa de unir a todos nós que amamos sua arte, sua luz e seu carisma e aqui estamos felizes com a recuperação de sua saúde para que irmanados possamos juntos agradecer por sua vitalidade.

Gilberto Gil, nosso querido irmão baiano, brasileiro, ser do universo, o melhor lugar do mundo é aqui e agora, porque estamos aqui agradecendo aos céus por sua saúde.

Pedindo por você, a Deus, a Oxalá, ao Senhor do Bonfim, justamente nessa igreja onde os negros da Bahia plantaram sua bandeira de fé e ecumenismo, rasgando os estreitos e ridículos limites dos dogmas – que separam ao invés de agregar todos os que buscam a luz, todos os que procuram Deus.

Nesse momento, essa imensa família que você semeou entre seus amigos e admiradores, agradece e pede axé, para você, para sua companheira Flora, para Pedro Gil, sempre presente, para suas filhas e todos os que cuidam e estão perto de você.

Axé para Gilberto, a benção meu Deus para Gil. Não é natal, nem carnaval, nem ano bom, e não há no céu nenhum sinal do Armagedon. Só estamos aqui porque lhe amamos.

Vida longa a Gilberto Passos Gil Moreira!!

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Caricatura por Caó Cruz Alves

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