A Política dos EUA na Bolívia por Marco Aurélio Weissheimer
Os movimentos de um embaixador especialista em conflitos
separatistas
Deputados bolivianos divulgam documento denunciando as
articulações promovidas pelo embaixador dos Estados Unidos na Bolívia, Philip
Goldberg, contra o governo de Evo Morales. Considerado um especialista em
conflitos separatistas, Goldberg foi enviado a La Paz depois de chefiar a missão
dos EUA no Kosovo, onde trabalhou para consolidar a separação e a independência
dessa região, depois da Guerra dos Balcãs.
Marco Aurélio Weissheimer
Quatro deputados do Movimento ao Socialismo, partido do
presidente da Bolívia, Evo Morales, divulgaram um comunicado denunciando ações
do governo dos Estados Unidos, por meio de seu embaixador em La Paz, Philip
Goldberg, para derrubar o governo eleito do país. César Navarro, Gustavo
Torrico, Gabriel Herbas e René Martinez relacionam um conjunto de fatos
ocorridos nos departamentos da região leste do país que obedeceriam a uma
estratégia fixada pela oposição em conjunto com o embaixador Goldberg.
Os fatos apontados pelos parlamentares bolivianos são os
seguintes:
No dia 13 de outubro de 2006, os Estados Unidos enviam a
Bolívia, como embaixador, Philip Goldberg, um especialista em fomentar conflitos
separatistas. Entre 1994 e 1996, foi chefe da secretaria do Departamento de
Estado para assuntos da Bósnia (durante a guerra separatista dos Bálcãs). Entre
2004 e 2006, Goldberg foi chefe da missão dos EUA em Pristina (Kosovo), onde
trabalhou para consolidar a separação e a independência dessa região, marcada
por uma luta que deixou milhares de mortos.
Segundo os deputados, Philip
Goldberg foi enviado a Bolívia com a missão de desestabilizar o governo de Evo
Morales, principalmente incentivando o separatismo das regiões orientais. Na
Bolívia, depois do triunfo de Evo Morales na eleição de 18 de dezembro de 2005,
os partidos tradicionais e as elites sofreram um duro golpe, Goldberg se
encarregou de reorganizá-los e de construir um caminho conspirativo para
desgastar o novo governo.
Plano midiático de
desinformação
Goldberg organizou uma grande coordenação com empresários
do leste, com donos de meios de comunicação e políticos do movimento Podemos
para colocar em marcha um grande plano de desinformação com respeito à gestão de
Evo Morales, tudo isso dentro do marco de uma intensificação das lutas regionais
contra o Estado boliviano. Esse plano de desinformação era constituído pelos
seguintes passos:
a) Mostrar que o narcotráfico estava crescendo na
Bolívia;
b) Os meios de comunicação precisavam mostrar que Evo estava
governando mal e que a inflação, a corrupção e o desgoverno estavam
crescendo;
c) Os meios de comunicação também deviam imputar ao governo a
responsabilidade pela violência no país. Começou a ser difundido aí o conceito
de que "Evo dividia a Bolívia".
Consolidados esses passos, Goldberg
reúne-se, na primeira semana de maio, com Jorge Quiroga e acertam a aprovação,
no Senado, do referendo revogatório.
Eles estavam convencidos que Evo
Morales não conseguiria obter mais de 50% dos votos e, uma vez deslegitimado nas
urnas, a oposição e os prefeitos da chamada "Meia Lua" pediriam a renúncia do
presidente por "ilegítimo, mau governante e por dividir a Bolívia". No entanto,
os prefeitos dos departamentos (equivalentes a governadores) não foram
consultados sobre este plano e acabaram se opondo a ele, por achar que não daria
certo. No dia 23 de junho, reúnem-se em Tarija e elaboram um pronunciamento
escrito para rechaçar o referendo revogatório. Dias antes, em 17 de junho,
Philip Goldberg viajou para os EUA, alegando uma suposta crise
diplomática.
O objetivo real de sua viagem, dizem os deputados, foi
definir um plano, junto a agências publicitárias, para desenvolver uma guerra
suja que pudesse causar a derrota de Evo no referendo. No dia 2 de julho,
Goldberg regressou a La Paz e, imediatamente, reuniu-se com cada um dos
prefeitos opositores para convencê-los a aceitar o referendo. No dia 5 de julho,
os prefeitos opositores anunciam que aceitam disputar o referendo.
Os
donos das grandes empresas de comunicação também participaram deste plano,
denunciam os parlamentares. Isso explicaria, por exemplo, porque nos principais
programas políticos destes meios as pesquisas sempre apontavam Evo Morales com
cerca de 49% dos votos. A tentativa de derrubada do governo pelo voto estava em
marcha. Além desta campanha nos programas políticos, também foi executada uma
outra no terreno da publicidade. A oposição contratou uma agência de publicidade
para elaborar os primeiros spots contra Evo Morales. Ao dar-se conta que os
roteiros e o dinheiro vinham dos EUA, esta agência decidiu não produzir mais os
comerciais.
O Plano B do embaixador
O plano para tirar Evo do
governo acabou sendo frustrado pelo resultado do referendo. O presidente se
legitimou com mais de 67% dos votos e Goldberg passou então a colocar em marcha
um Plano B, que incluem greves, bloqueios e ações violentas que buscariam dois
resultados alternativos.
1) O conflito se generaliza e obre o leste e
parte do oeste do país. A população começa a se cansar, as forças da ordem
entram em ação, com muitas mortes. Neste caso, Evo teria que convocar eleições
ou deixar o governo depois dos conflitos com mortes. A insistente provocação
para que as forças policiais e as forças armadas atuem se encaixa neste
plano.
2) Caso não ocorra o cenário anterior, a oposição contaria ainda
com uma segunda possibilidade: uma vez desalojada a polícia e o Estado Nacional
das regiões, em meio à violência, Goldberg oferece aos prefeitos opositores a
vinda de mediadores internacionais, inclusive tropas da ONU para concretizar o
separatismo dos quatro departamentos rebeldes, como fez no
Kosovo.
Seguindo esse plano, Goldberg viajou a Sucre e se reuniu com a
prefeita Savina Cuellar, que pediu a renúncia do presidente. No dia 21 de
agosto, o embaixador encontrou-se clandestinamente com o prefeito de Santa Cruz,
Rubén Costas, e com quatro congressistas norte-americanos. No dia 25 de agosto,
mais uma reunião com Rubén Costas. Paralelamente, a oposição rejeitou o chamado
de diálogo feito pelo governo e, no dia 24 de agosto, convocou uma greve geral.
Seguindo a linha proposta por Goldberg, denunciam ainda os parlamentares do MAS,
os prefeitos impuseram um plano de desgaste de médio prazo, incluindo destruição
de instituições públicas e provocações à polícia e às forças armadas.
Na
mesma linha golpista, em Santa Cruz e em Tarija começou-se a falar de
federalismo e até de independência. Como o empresariado cruceño estava mais
interessado na Feira de Santa Cruz (que deve iniciar no dia 19 de setembro) que
nas greves e bloqueios, o Departamento de Estado convocou Branco Marinkovic para
uma conversa nos EUA. No dia 1° de setembro, em um pequeno avião Beechcraft,
matrícula C-90A, Marinkovic viajou aos Estados Unidos onde o convenceram de que
o plano estava em sua trama final e que era preciso jogar-se todo nele. No dia 9
de setembro, horas depois do regresso de Marinkovic a Santa Cruz, iniciam
protestos violentos, com invasão e queima de instituições públicas e novas
agressões às forças armadas e à polícia.
Este é o plano golpista que está
em marcha com o apoio da embaixada dos EUA, dizem os deputados. Foram essas
razões, asseguram, que levaram o governo boliviano a pedir sua saída do país.
Eles manifestam confiança que esse plano fracassará porque o governo de Evo
Morales segue controlando o conflito, com paciência e dentro da legalidade,
mantendo-o em sua dimensão regional. "A violência gerada por grupos
impulsionados por este plano golpista é a forma pela qual os setores
conservadores mostram sua decisão de acabar com a democracia, já que ela não
serve mais aos seus interesses", concluem.