Aldeia Nagô
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As feridas e os feridos (CPMF) por Flávio Aguiar

4 - 6 minutos de leituraModo Leitura

Em meio a promessas de bonança, começam a aparecer os
verdadeiros estragos feitos pela derrubada da CPMF. E não parece que seja o
governo que esteja chorando mais…

Logo depois da derrubada da CPMF, houve uma gritaria tentando
convencer as gentes que "haveria mais dinheiro no bolso", que "o crédito ia
ficar menos caro", e assim por diante. Mas ao longo dos dias, vão aparecendo os
verdadeiros estragos feitos pela votação desastrada da noite de 12 para 13 de
dezembro.É certo que a vitória da rejeição do imposto só foi possível
com a sinistra deserção de senadores da base aliada. Sozinhos, PSDB + DEM +
PSOL, mais isto e mais aquilo, não conseguiriam rejeitar o imposto. Mas não é só
isto. O que vai ficando cada vez mais claro é que, por exemplo, levado pela
fúria vingativa de alguns senadores (como apontou Kennedy de Alencar em artigo
na Folha de S. Paulo, já em 13/12), aliada a uma estratégia de
clarividência duvidosa articulada por Fernando Henrique Cardoso, o PSDB
conseguiu uma proeza que em geral só o PT conseguia: derrotar a si mesmo.

Na sexta-feira, no lançamento do novo carro da Ford em S. Bernardo (mostram as
fotos dos jornais de sábado), quem estava de cara amarrada era Serra, não era
Lula. Para vencer em 2010, Serra precisa conquistar votos que foram petistas em
2002 e em 2006. Para vencer em 2010, ele precisa, por exemplo, manter a Saúde
como bandeira sua, ministro que dela foi. Mas a pressa e o açodamento de impor
uma derrota a Lula e de conquistar o agrado da Fiesp, na verdade verdadeira das
coisas, tirou-lhe a bandeira das mãos. Por quê? Porque se apesar de tudo a Saúde
melhorar e se expandir mais neste país, o mérito será do governo federal que,
"apesar da perda da CPMF", a terá feito progredir. Se isso não acontecer, Serra
terá de arcar com o contra-argumento de que "foi o seu partido" que se curvou
aos "pró-magnatas" do DEM e espandongou as verbas da Saúde.

Por sua vez,
a gritaria na Câmara Federal é enorme: deputados e deputadas se sentem
apunhalados e abandonados a sangrar pelos senadores dos seus partidos, pois
parecer ser inevitável haver o contingenciamento e cortes de verbas nas emendas
orçamentárias aprovadas. E a grita maior vem de deputados e deputadas dos
próprios PSDB e DEM, que, com razão, se sentem mais ameaçados.


 
Também na Folha de S. Paulo, só que desta vez na de sábado, 15/12, em
artigo de Marcos Cézari na seção Dinheiro, se lê que com o fim do imposto os
assalariados de baixa renda terão uma perda, ainda que pequena em termos
individuais, porque passarão a ter de pagar mais para a Previdência que antes
lhes diminuía o desconto como uma compensação pelo imposto.

Ou seja,
enquanto o governo vai remanejar verbas, podendo jogar todos os ônus para as
oposições e para a irresponsabilidade de alguns de seus aliados menos aliados,
quem se lascou mais foi o PSDB. Parece aquela jogada estúpida: na hora de dar a
punhalada, o DEM segurou o punhal pelo cabo e o PSDB pela lâmina. Resultado: no
alvo a faca feriu, mas nem entrou tanto. Já um dos esfaqueadores periga perder
os dedos, e ainda está na UTI costurando as feridas.

Ainda uma palavra. É verdade que o PSDB está dividido, pelo menos desde a
eleição de 2006. Mas agora está estraçalhado. Parece um ator que entrou
endomingado em cena e sai em farrapos e andrajos. Qual o sentido de Fernando
Henrique ter manejado tanto as cordinhas de Arthur Virgílio? A mim me parece um
único. Pelo menos, quero dizer, um único faz sentido, porque o de ter jogado o
partido e seus possíveis candidatos numa arapuca não faz. Como aquele cuja era
ele queria acabar ao chegar à presidência, Fernando Henrique sabe que um dia ele
deixará a vida para entrar na história (esperemos que daqui há muito tempo e de
modo não tão trágico como o daquele seu antecessor). E ele está arriscando-se a
entrar para a história como um mero prefácio às gestões de Lula e até mesmo de
Serra, se este conseguir chegar à presidência. Neste último caso, reconheça-se,
há o risco dos incontáveis retrocessos em todas as frentes, da política social à
externa, que a sanha de tucanos e democratas trará. O segundo mandato de
Fernando Henrique desteceu tudo que ele tecera para seu verbete nas
enciclopédias durante o primeiro. Por isso, vanitas vanitatis, faz sentido criar
todas as pedreiras possíveis no caminho de Lula.

Mas pressionado
tardiamente por Serra e Aécio (que nesse sentido também foram lerdos, como foram
o governo e o PT), o ex-presidente tentou jogar toda a responsabilidade pelo
acontecido nos ombros de Arthur Virgílio. Mas quem acompanhou desde sempre essa
farsesca tragédia anunciada, viu que FHC também ajudou a alevantar o punhal
contra César. Só que César, ainda que contrariado, passa bem nos braços do povo.
E alguns dos pretensos esfaqueadores também saíram esfaqueados. Por eles mesmos
e seus comparsas. 

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