Baianos, Gregos e Troianos. Por Zuggi Almeida
– Boa tarde, minha baianinha! Já tá saindo aquele acarajé quentinho da hora?- Daqui a pouco meu filho. Você vai querer com muita ou pouca pimenta?- Olha baiana você coloca do jeito que você agüenta. Certo ?
A sutileza e a elegância presentes nesse diálogo representam, e muito bem a irreverência e espontaneidade no jeito de ser baiano. Afinal, o baiano possui a capacidade de quebrar regras de comportamento pré-estabelecidas e pode surpreender a qualquer momento. O baiano é a própria caixinha de surpresas. Um atributo colocado de forma errada é que o baiano é ‘entrão’ , invasivo ou adora aparecer em certas ocasiões sem o convite. Muito pelo contrário, o baiano consegue otimizar situações adversas em benefício próprio. Vejam essa historinha.
“ Um domingo de BA x VI e Luíz Fofinho, torcedor ferrenho do rubro-negro resolve aparecer próximo ao meio-dia na casa do amigo, Jorge da Tricolor, morador do Tororó e daí seguirem juntos pra velha Fonte Nova.Jorge recebeu a dádiva por ser filho de Dona Maricota, também torcedora do Baêa e eximia cozinheira com destaques para todos os tipos de muquecas. A mesa já estava posta e Dona Maricota faz o convite comum nas casas de baiano.
– Luís, meu filho venha fazer uma boquinha aqui junto com a gente !O convidado de imediato lembrou-se dos conselhos dados por sua mãe que deveria recusar almoços em casa alheia por uma questão de educação e respondeu:Muito obrigado Tia Maricota, mas hoje acordei mais tarde e tomei um café acompanhado de cuscuz e ensopado de carneiro.
Muito Obrigado. Luís Fofinho continuou na sala assistindo os gols dos jogos da véspera na Tv. Os olhos na tela e os ouvidos antenados nos sons que vinham da sala de jantar.
Jorge elogia Dona Maricota.
– Puxa mainha, hoje a senhora superou na comida. Parece até que já está homenageando a vitória do nosso Esquadrão, mais tarde.
Fofinho já não consegue prestar atenção na TV e beira ao desespero quando o cheiro da muqueca de vermelhinho ariocó invade a sala.Jorge da Tricolor continua dirigindo os mimos pra mãe.
– Dona Maricota, a senhora caprichou nessa farofa de dendê e esse feijão de leite… aí é pra comer rezando.A saliva causada pelo paladar já quase afogando Jorge Fofinho quando ele ouve a pergunta, logo transformada em senha.
– Mainha passe o molho de pimenta por favor.Um Jorge com ar desesperador aparece na porta da sala e dispara a pergunta certeira.
– Dona Maricota tem molho de pimenta ?- Mas é claro meu filho!
– Então eu aceito o convite !Natural quando se trata de uma família baiana.Dona Maricota coloca mais um prato na mesa. Foi um domingo que deu empate no BA x VI.”
Uma outra condição inoportuna é considerar que o baiano adora fazer um fuxico. O baiano sempre esteve na vanguarda das formas de comunicações e o fuxico apenas antecedeu as redes sociais.
Existe certa diferença entre o fuxico e a fofoca. O fuxico tem o objetivo de transmitir assuntos de ordem privada para outrem. Isso sem o devido consentimento da parte envolvida.
Já a fofoca é a distorção da verdade com objetivo de difamar, detratar a imagem da outra pessoa.
Geralmente o conteúdo da fofoca contém inverdades. Portanto acredito que a prática da fofoca não se adéqua à maioria dos baianos. Já o fuxico vem da ancestralidade, no caso dos terreiros de candomblé onde é uma prática feita à pequena boca, mas que fica limitado aos muros das roças de santos.
Quem nunca participou de uma conversa, tipo:
– Olha, eu estou lhe contando isso, mas estou apenas repassando o que me falaram. Você sabia que Emilinha, a filha de Oscar da Petrobras está saindo com um homem casado?
Pode ser originado de uma situação real, aí qualifica-se como um fuxico. Cabe a você ouvir e manter o sigilo não compartilhando com a divulgação do fato.
Por outro lado, se a história não revela a verdade, e você retransmite a informação, nesse caso também é um fofoqueiro nato.
Quanto aos gregos e troianos do título desse texto acho que não merecem maiores esclarecimentos, pois a história desse povo revela um caso de trairagem envolvendo um cavalo presenteado com recheio de soldados invasores.
Isso é uma atitude traíra e o baiano não é capaz de praticar um tão ato infame com um amigo.
Por acaso você conhece algum baiano traíra ?
– Zuggi Almeida é baiano, escritor e roteirista.
