Bem do Século por Delfim Neto
O que está por tras de Belo Monte? – "Brasil, potência hídrica do século 21" é o título bastante sugestivo da matéria de capa de recente edição especial da National Geographic em português, que traz considerações interessantes sobre o aproveitamento do que certamente será a riqueza mais disputada nos próximos mil anos em nosso planeta.
Desde algum tempo tenho procurado mostrar que a água (mais que o ouro,
minérios ou petróleo) é o que preocupa e motiva o enorme esforço de
marketing promovido por ONGs de várias partes do mundo com o objetivo de
provar que os brasileiros são incapazes de:
1 – Proteger o meio-ambiente, especialmente na região Amazônica.
2 – Respeitar as populações indígenas, idem.
3 – Realizar o desenvolvimento "sustentado", alguma coisa com diferentes
significados no Brasil, na China e nos EUA. São meros pretextos.
Apesar de gastos, funcionam…
A conclusão, óbvia, é que a Amazônia precisa ser internacionalizada para
evitar que utilizemos os recursos de água daquela bacia hidrográfica
para produzir energia e proporcionar o desenvolvimento daquela região em
nosso benefício exclusivo. Então para começar, é urgente impedir a
construção das hidrelétricas, enviando seguidas delegações de notáveis
que se prestem a fazer o ridículo papel de defensores de etnias das
quais mal conhecem a designação correta e certamente desconhecem a
localização das aldeias (alguns acreditam que se trata de remanescentes
de tribos astecas…).
Esta semana tivemos a demonstração de como a pregação, mesmo infantil,
pode influenciar burocratas mal informados de organismos internacionais:
uma obscura e inoperante comissão de direitos humanos da OEA aliou-se à
tese de tantas outras obscuras ONGs, pedindo a suspensão (!) da
construção da Usina de Belo Monte, no rio Xingu.
O referido pedido, baseado numa denúncia feita em 2010 por "diversas"
ONGs (não identificadas), não produz nenhuma consequência prática
imediata, mas ficou a ameaça de que "poderá vir a ser submetido a exame
na Corte Interamericana de Direitos Humanos, também da OEA, caso não
sejam aceitas as explicações do governo brasileiro sobre o resultado de
consultas submetidas às populações indígenas". A reação oficial foi
imediata: o Itamaraty classificou como "precipitadas e injustificáveis"
as solicitações da OEA; o senador Flexa Ribeiro, presidente da
subcomissão que acompanhará o andamento das obras no Pará, qualificou de
"absurdo" o pedido "que até fere a soberania nacional" e o diretor da
Agência Nacional de Energia – Nelson Hubner – foi direto: "A OEA
conhece muito pouco do processo de licenciamento para dar parecer sobre
a obra".
O que as ONGs (de longa data), agora apoiada pela sub-burocracia da OEA,
pretendem bloquear, em realidade, não é a obra em si, mas a condição
brasileira de produzir mais energia limpa para prosseguir no seu projeto
de desenvolvimento sustentável, inclusive na região Amazônica.
Significa demonstrar a capacidade nacional de conservar, administrar e
utilizar as riquezas de um território que detém 11% de toda a água doce
do globo, onde correm 12 mil rios que respondem por 16% de toda a água
enviada ao mar pelos rios do planeta.
Muitos brasileiros só em anos recentes tomaram conhecimento que, além do
aquífero Alter do Chão, que contém as águas do subsolo amazônico, o
aqüífero Guarani, no subsolo das regiões Centro-Sul-Sudeste do Brasil e
partes do Paraguai, Uruguai e Argentina, guarda volume superiror ao seu
congênere do Note. Segundo os cálculos apresentadosna edição especial
da National Geographic, juntamente com um mapeamento bastante preciso,
"não há fartura semelhante em outros cantos do globo: considerando essa
abundância, teoricamente cada brasileiro teria à sua disposição, 34
milhões de litros de água por ano, uma quantidade fabulosa, 17 vezes
maior do que a ONU considera média confortável de consumo".
Com todo o progresso civilizatório que se produziu no mundo, digamos,
nesse meio século mais recente, a maioria das nações refreou a cobiça em
relação aos bens alheios (com notórias exceções provocadas pela
exacerbação terrorista). Só não podemos ignorar que a fartura de água,
que nos favorece, está destribuída de forma extremamente desigual entre
as regiões e os povos. A carência nem sempre tem simetria com o estágio
de desenvolvimento de cada país, inclusive das potências econômicas
(as petroleiras, por exemplo). São nações com poder de influência
suficiente para arrancar resoluções de organismos internacionais
capazes de validar argumentos (não importa quão cínicos sejam) que
permitam intervir onde exijam seus interesses vitais.
Não tenhamos dúvida de que a água figura no alto da agenda dos
interesses vitais com potencial de produzir grandes atritos neste
século.