Comissão de Anistia quer ir além das reparações econômicas. Por Brunna Rosa
A comissão de Anistia do Ministério da Justiça lança nesta quinta-feira, 21,
o projeto Anistia Cultural. O objetivo é dar um caráter cultural e pedagógico às
ações da comissão e divulgá-las entre estudantes universitários e servidores da
pasta.
Para inaugurar o projeto, foi convidado o dominicano Carlos
Alberto Libânio Christo, o Frei Betto. Ele relembrará a importância da luta
empreendida por setores da sociedade pela volta da democracia no período da
ditadura militar.
A palestra de Frei Betto será apenas a primeira do
projeto. Ao longo do ano, estão previstas mostras de filmes, charges e
fotografias, além de debates com pessoas que vivenciaram a ditadura. Em
entrevista Fórum, o presidente da Comissão de Anistia, Paulo
Abrão Pires Júnior, fala sobre o lançamento da Anistia Cultural e sobre as
outras atividades da Comissão.
Fórum – Como funcionará o
projeto Anistia Cultural?
Paulo Abrão Pires Júnior – O projeto
Anistia Cultural compõe várias atividades que estamos inaugurando na comissão de
Anistia. A função primordial é resgatar e apresentar a sociedade, sobretudo aos
jovens, o regime autoritário que o Brasil sofreu e principalmente como alguns
nomes tomaram de golpe o Estado e, por uma ideologia que nunca teve respaldo
pelo crivo democrático do pais, perseguiram, torturaram e mataram. A comissão da
Anistia não pode se limitar ao dever intrínseco de simplesmente julgar os
requerimentos dos perseguidos políticos de 1964 a 1988, é preciso levar ao
público a verdade histórica, como processo de reparação histórica aos que foram
presos e prejudicados.
Fórum – Quais são as atividades
previstas?
Paulo Abrão – Está previsto o projeto educativo da
comissão, com nove ações diferentes. A Caravana da anistia, que vamos iniciar em
abril, realizando sessões reais de julgamento nas cidades brasileiras. Vamos
sair das quatro paredes do Ministério e ir para as cidades, junto a suas
comunidades, afinal foi lá que os ex-presos e ex-perseguidos, foram execrados e
tiveram suas dignidades feridas. Outra ação do projeto educativo é a confecção
de material didático voltado a juventude, para que ela possa conhecer o passado
para construir o futuro.
Fórum – E quanto às atividades da
Anistia Cultural?
Paulo Abrão – São dois eixos. Um ciclo de debate
com atividades mensais temáticas do período de repressão, crivadas em processos
de pessoas que resistiram ao regime e encontram seus processos na comissão para
serem julgados. Como o papel das mulheres no regime militar, que terá uma sessão
especial de julgamentos de mulheres que resistiram a ditadura, o papel da
repressão militar no campo, as ligas camponeses e os anos de chumbo. Depois
pretendemos falar dos estudantes sobre o papel da resistência, o papel da Igreja
na democracia, a Teologia da Libertação e sua influência na
redemocratizaçã
fotografia, filmes, charges, entre outras, conectadas às Caravanas de Anistia.
Fórum – As atividades já têm data definida?
Paulo Abrão
– Ainda não temos data exata. Em abril, provavelmente dia 4, na sede da
Associação Brasileira de Imprensa (ABI), vamos julgar processo de jornalistas
perseguidos pela ditadura e comemorar o Centenário ABI. Em março, nossa intenção
é realizar o julgamento das mulheres que resistiram a ditadura, como forma
comemorativa do dia internacional da mulher.
Fórum – A
comissão de Anistia está adotando um processo que se assemelha ao de
constituição da verdade e da justiça na África do Sul?
Paulo Abrão
– São processos diferentes, embora com objetivos comuns. A finalidade é
a mesma: não deixar que o passado fique escondido e trazer à tona a história
real. Na comissão de verdade, instituída na África do Sul, os militares
opressores vão até a comissão e revelam as informações que têm. A partir disso,
da confissão de seus crimes, o anistiam. No Brasil foi diferente, em 1979, os
militares se auto-anistiaram. Quanto à reparação econômica aos perseguidos
políticos, a finalidade não é apenas econômica é transformar o processo em
aprendizado.
Fórum – Este ano completam-se 40 anos do Ato
Institucional nº 5. Está previsto algum encontro nacional que discuta a questão?
Paulo Abrão – Por enquanto não. Em agosto acontecerá,
provavelmente em Brasília, o encontro nacional de ex-presos e perseguidos
políticos, com organização e iniciativa autônoma, a partir das próprias
associações. Quanto a comissão, estamos organizando para que aconteça em agosto,
no Rio de Janeiro, um seminário internacional sobre sistemas de repressão e
reparação na América Latina. A finalidade é promover uma integração dos países
quanto à formas e formatos das reparações econômicas e históricas.
Brunna Rosa