Denuncismo, um vírus mais letal que o zika. Por Alex Solnik
Um vírus pior que o zika está se disseminando entre os brasileiros: o vírus do denuncismo. É assustador porque a sociedade brasileira nunca suportou delator. Simonal era o cantor mais popular do país depois de Roberto Carlos, mas foi alijado do cenário artístico pelos colegas depois de ele mesmo dizer que era dedo-duro da ditadura.
Com a Lava Jato a delação ganhou status. Os delatores corruptos de bandidos viraram mocinhos por denunciarem políticos corruptos.
Denunciar o outro, seja do que for, tornou-se condição sine qua non de ser brasileiro.
Não importa o alvo, o que importa é denunciar. Não importa se é verdade, não importa se há provas. Importa apontar o dedo. Olha lá o que ele fez! Olha lá como ele é!
Olha o sítio do Lula. Olha o tríplex do Lula. Olha o barco da Marisa. E o dedo em riste.
A Preta Gil está gorda. E o dedo em riste.
Chico Buarque enriqueceu com a Lei Roaunet. E o dedo em riste.
Olha o Caetano, foi cantar em Israel. Olha o Jean Willys, foi visitar Israel. E o dedo em riste.
Denunciar está na moda. Triste moda essa. E nem só políticos são vítimas.
Um veterinário foi denunciado outro dia, se não me engano em Santo André, por – pasmem – atender de graça e por isso pode ser multado, a associação o obriga a cobrar. É o rabo abanando o cachorro.
Não importam as circunstâncias, denunciar é preciso. Mesmo quando haja uma interferência indevida na liberdade individual de cada um.
Um pai foi denunciado porque no carnaval vestiu no filho fantasia de macaco. Não importa quem seja ele, nem seu filho, ele foi detonado na internet.
Denuncismo instaura um clima de medo e suspeita constantes que não combinam com democracia. Eu suspeito de alguém e sei que alguém suspeita de mim. Vou denunciar o outro antes que o outro me denuncie.
Marca registrada de regimes autoritários, o denuncismo está se expandindo em plena democracia como nunca se viu antes e com mais força que o aedes egypti.
É um vírus difícil de combater porque ataca em todos os meios de comunicação, dos mais globais aos mais artesanais e principalmente no boca a boca, afeta todos os que não estão vacinados contra a guerra de informações vigente e corrompe a sociedade, pois sinônimo de corromper, segundo os dicionários é “tornar podre, estragar, decompor,
alterar, adulterar, perverter, depravar” e não apenas “subornar, peitar, comprar”…
Alex Solnik é jornalista. Já atuou em publicações como Jornal da Tarde, Istoé, Senhor, Careta, Interview e Manchete. É autor de treze livros, dentre os quais “Porque não deu certo”, “O Cofre do Adhemar”, “A guerra do apagão”, “O domador de sonhos” e “Dragonfly” (lançamento setembro 2016).
Artigo publicado originalmente em http://www.brasil247.com/pt/blog/alex_solnik/216782/Denuncismo-um-v%C3%ADrus-mais-letal-que-o-zika.htm