Aldeia Nagô
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Depredação dos monumentos públicos por Almandrade

3 - 4 minutos de leituraModo Leitura
almandrade

A depredação e o abandono dos monumentos públicos vêm chamando a atenção na paisagem urbana e traz para a cena uma discussão sobre a cidade, cidadania, a responsabilidade pelo bem público e educação patrimonial.

Não se trata de revolta contra valores, personagens, datas que esses monumentos significam ou representam, as intervenções e agressões não passam por nenhuma consciência crítica. Ao longo do tempo a cidade constrói histórias e guarda nas ruas, praças e monumentos, várias memórias. Esse território simbólico é propriedade de todos. Mas o desconhecimento e o desprezo pela cultura e a memória da cidade coloca em cheque a noção de cidadania e a responsabilidade pela guarda, vigilância e conservação dos monumentos.

Se a cultura está cada vez mais associada a entretenimento, tudo é diversão. O vandalismo é um comportamento de uma sociedade individualista, que deu as costas aos valores e princípios, da moral e da ética. Estes foram substituídos por um desejo perverso de deixar na cidade o registro da violência e da impunidade. Uma brincadeira que aponta para a falta de compromisso com a coisa pública e com a memória da cidade, e se espalha como um vírus. Talvez os heróis da cidade não sejam mais os homens públicos ou personagens da história da cidade, do Estado e/ou do País, os que estão sinalizados no espaço público, e sim como proclama um apresentador de TV, são os halterofilistas de banalidades e da vulgarização do sexo que aparecem nesses programas líder de audiência.

Não só os monumentos, as fontes, o mobiliário e equipamentos urbanos como os telefones públicos, pontos de ônibus, lixeiras são alvos de alguma forma de depredação. A cultura da cidade está em recessão. Houve uma perda de sentimento e cuidado com o patrimônio coletivo, sem esquecer o aumento da população marginalizada, sem acessos às mínimas condições de sobrevivência. Paralelo ao crescimento da cidade se desenvolveu todo tipo de marginalidade e violência.

Os bens públicos, administrados pelo Estado, são de responsabilidade de todos. Mas uma população que despreza a memória, ninguém mais presta atenção nem de quem é o busto, o que significa o monumento, muito menos se interessa em saber do serviço que aquele equipamento presta a população e muito menos ainda o quanto custa a sua manutenção. Não há mais tempo para a educação e o frenesi da rua, ela é apenas o lugar de passagem de trabalhadores e consumidores. E uma vez por ano é a estrada do trio elétrico que arrasta o que resta nela e deixa no dia seguinte cicatrizes no patrimônio natural e cultural.

Por outro lado, em nome da arte deposita-se qualquer coisa em qualquer lugar, como se a cidade fosse um reservatório de uma forma estranha de auto-afirmação. Aprendemos com o progresso a produzir lixo, toda espécie de lixo que lançado na cidade. É a barbárie moderna que decretou o fim da paisagem urbana, como uma construção coletiva e civilizada. Mais uma forma de degradar o espaço público. As intervenções da arte obedecem a outro raciocínio.

A educação deveria ser o principal meio de recuperação da civilidade e dos valores indispensáveis à vida social. Mas na própria escola se desencadeiam os pequenos atos de vandalismo, que começa com o chiclete na carteira e as pichações até a depredação das esquadrias e do mobiliário da escola. Faltam também planos de ações preventivas e uma política pública para a preservação do patrimônio. O que está em discussão não é somente preservar, mas o incremento do processo de educação e conscientização da comunidade para que a proteção do patrimônio público se efetive.

Almandrade (artista plástico, poeta e arquiteto)

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