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Governo federal quer instalar 17 redes de monitoramento da qualidade do ar do país

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Inexistem fronteiras para a poluição do ar e é impossível dissociá-la da saúde e das emissões de gases de efeito estufa. Essas afirmações foram descortinadas durante o lançamento esta semana, ao vivo pelo YouTube, da nova versão da Plataforma da Qualidade do Ar, ferramenta criada e gerenciada pelo Instituto de Energia e Meio Ambiente (IEMA) que reúne  dados governamentais sobre qualidade do ar do Brasil.

Além de serem apresentadas as novas funcionalidades do site, Adalberto Felicio Maluf Filho, Secretário Nacional de Meio Ambiente Urbano e Qualidade Ambiental que compõe o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima (MMA), Daniela García da Associação Interamericana de Defesa Ambiental (AIDA-Américas) e Alberto Setzer, do Programa Queimadas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) debateram o problema em nível nacional e da América Latina. Assista na íntegra: https://www.youtube.com/watch?v=AdTHIedxEUg

Planos do governo federal

“A agenda da qualidade do ar é um dos assuntos prioritários para nós”, afirmou Adalberto Felicio Maluf Filho, do MMA. O especialista ressaltou que a poluição urbana é uma das problemáticas que mais impacta as pessoas em áreas vulneráveis das cidades. E também lembrou que houve avanços na melhora da qualidade do ar do país, mas nos últimos anos há uma estagnação desse progresso. “A Secretaria Nacional de Meio Ambiente Urbano e Qualidade Ambiental colocou como prioridade revisitar a Resolução Conama 491/2018, que atualiza as normas dos padrões de qualidade do ar”, contou Maluf Filho. “Não faz sentido criar um padrão de qualidade do ar que não tem prazo de quando será implementado”, completa. Segundo o especialista, o objetivo a curto prazo é atuar para auxiliar os estados a terem monitoramento da qualidade do ar; 17 dos 27 estados não têm rede de monitoramento atualizada. “Então, isso é prioridade absoluta. É importante ter os dados analisados pela sociedade civil, mas também um sistema que produza relatórios avançando nas resoluções”, completou.

 

Além disso, segundo o secretário, o MMA deve revisitar o Programa de Controle da Poluição do Ar por Motociclos e Veículos similares (Promot), Resolução Conama (Conselho Nacional do Meio Ambiente) Nº 493/2019. “O Promot sofreu um lobby muito grande da indústria de motos. Foi uma disputa acirrada, se perdeu a ambição de poluentes para motos”, disse. Para piorar a questão, com o aumento da desigualdade e da pobreza, o emprego de motos voltou a crescer. O que gera ainda mais emissões de poluentes, em um ciclo de impactos socioambientais. Na apresentação, ele também abordou a questão da inspeção veicular. “Existem caminhões novos que emitem mais que velhos devido a ilegalidades e veículos novos também emitindo mais, por conta de má manutenção”. O Ministério deve implementar programas de inspeção e manutenção de veículos em uso e elaboração de planos de controle da poluição veicular.

 

Referente ao sistema de informação de qualidade do ar do governo federal, ele reconheceu a dificuldade em ter projetos nacionais envolvendo todos os estados. Mas o governo pretende auxiliá-los no sentido da qualificação. Uma das medidas é o curso on-line sobre qualidade do ar oferecido pelo MMA. Uma nova turma será aberta em julho. Além disso, há uma busca por entender picos de poluição local e também ter um protocolo de ação com alertas para proteger a saúde das pessoas nesses casos. O que dialoga com o problema das queimadas: “O governo federal acrescentou ao Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia Legal (PPCDAm) uma rede de monitoramento exclusiva para as cidades amazônicas para que a população saiba o impacto das queimadas na qualidade do ar. Nos próximos anos, nossa meta é ter esse sistema de monitoramento, sensores e monitoramento por satélites em pontos críticos mais avançados”.

 

Brasil no contexto latino

“A qualidade do ar não respeita limites territoriais, não tem fronteiras e, como região, encontramos uma oportunidade em como enfrentar a qualidade do ar a partir dessa perspectiva”, ressaltou Daniela García, da AIDA-Américas. Em sua apresentação, a especialista salientou que respirar um ar limpo é um direito. “Isso está implícito em diversos instrumentos internacionais e faz parte de obrigação e de compromissos exteriores dos Estados. A poluição da atmosfera impacta a vida de milhares de pessoas, afetando 90% da população mundial”, lembrou.

 

“Na América Latina existem alguns problemas dos quais compartilhamos”, afirmou García. Ela pontuou especialmente três: a falta de acesso à informação adequada para poder ter ações como cidadãos e como Estados; os incêndios florestais que impactam mais que um país, mas uma região toda; os processos de produção energética na região têm impactos na qualidade local e regional. De acordo com García, na América Latina, há características  particulares de  contaminação do ar, decorrente da forma como nos relacionamos com o solo e com a energia.

 

“Falar da qualidade do ar é importante porque é uma das estratégias que nos ajuda a conhecer o qualidade do ar na região e também nos articularmos em diferentes instrumentos de cooperação técnica, financeira, entre Estados, internacional para o desenvolvimento e programas de gestão da qualidade do ar, do clima e da saúde”, salientou. “Contar com instrumentos como a Plataforma é fundamental para enfrentar a problemática na região e com mecanismo de cooperação entre países que escale um exercício de governança. Assim, podemos enfrentar a poluição atmosférica e a crise climática de uma forma conjunta”, finalizou García.

 

Poluentes sem fronteiras

“As queimadas devem ser consideradas como um dos elementos chaves na questão da saúde”, disse Alberto Setzer, do INPE. “Afinal, em situações mais agudas, graves, temos cerca de dez a 20 mil detecções por dia de focos diferentes de queima de vegetação, gerando uma nuvem que se propaga por milhares de quilômetros”, explicou o pesquisador. Ele lembrou que as queimadas e a questão da poluição do ar estão estritamente relacionadas com as mudanças climáticas: nos anos mais críticos, 75% das emissões brasileiras são provenientes das queimadas e dos incêndios florestais. Isso gera níveis elevados de poluição atmosférica, muito superior aos limites indicados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), no país inteiro e que se espalha pelo continente. “Os dados mostram que a extensão da fumaça das queimadas de 20 de agosto de 2021, por exemplo, atingiram oito milhões de quilômetros quadrados”, contou. Nesse dia, originadas do estado de São Paulo, elas chegaram ao Brasil Central e a países vizinhos da América Latina, nitidamente sendo barradas pela Cordilheira dos Andes. O que gerou grande concentração de poluentes em toda essa imensa região latina.

 

Enquanto o monitoramento da qualidade do ar não é realizado em todos os estados, o intuito é que o sensoriamento remoto estabeleça uma base de análise para tomar decisões relevantes. “No Mato Grosso, havia previsões de qualidade do ar a partir do Vigiar, do Sisam, quando fechavam-se escolas para as crianças não serem expostas a grandes níveis de poluição do ar, por exemplo”, disse o pesquisador. Para criar diretrizes semelhantes de ações do Ministério da Saúde, ainda este ano, deve entrar no ar uma nova versão com dados atualizados do Sistema de Informações Ambientais Integrado à Saúde (Sisam), do INPE.

 

O objetivo é que seja uma ferramenta para apoiar a vigilância ambiental do Ministério da Saúde no monitoramento de dados de qualidade do ar, focando na detecção de poluentes via satélites. “Temos a previsão de incorporar os dados do IEMA, servindo como validação dos nossos que são feitos por satélites, via sensoriamento remoto”, explicou Setzer. Ou seja, a intenção de integrar o SISAM à Plataforma é usar estes dados como referência no processo de validação dos dados do SISAM. Além disso, o banco de dados históricos deve ser recuperado (desde 2000), haverá apresentação da situação atual e, também, previsão da poluição atmosférica com até três dias de antecedência. Os dados gerados somam informações como chuvas, temperatura do ar, umidade relativa do ar, vento e velocidade e focos de queimada. “Sobre a questão do impacto na saúde, as questões atmosféricas também devem ser consideradas. Se a umidade relativa do ar estiver muito baixa, em 30% por exemplo, o número de casos de internação por problemas respiratórios será muito maior do que se ela estivesse entre 70% ou 80%, faixa de controle”, disse Setzer sobre a relação entre os parâmetros meteorológicos.

 

Sobre a Plataforma da Qualidade do Ar

A ferramenta, empregada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como fonte de consulta oficial dos dados brasileiros, ganha duas novas versões: em espanhol e em inglês. O trabalho deve reforçar a atuação internacional em conjunto com outras organizações em busca da redução da poluição do ar, principalmente, na América Latina. “Ela foi criada em 2015, onde o Ministério do Meio Ambiente fez parte desse projeto”, relembrou David Tsai, gerente de projetos do IEMA.

 

Entre suas novas funcionalidades, a Plataforma da Qualidade do Ar traz concentrações mensais, além das diárias e anuais. “Com essa nova visualização percebemos mais facilmente que durante o inverno há mais concentração de poluentes do ar”, explicou Helen Sousa, responsável pela Plataforma. Outra novidade é a visualização dos dados diretamente sobre o mapa do Brasil para auxiliar o debate sobre como está a qualidade do ar em determinada área e os avanços necessários. “Pensamos na Plataforma para disponibilizar a informação e transparência e, também, mostrar como funcionam esses dados de qualidade do ar e educar com relação à como podemos interpretá-los”, explicou Sousa.

 

Além disso, a Plataforma da Qualidade do Ar inclui como referencial de avaliação as diretrizes de qualidade do ar da OMS mais atualizadas, que são mais restritivas que os atuais padrões de qualidade do ar brasileiros, apresenta médias anuais dos poluentes- onde percebe-se, por exemplo, que as concentrações de poluentes do ar em São Paulo eram quase o dobro do que as atuais há poucas décadas, mas ainda seguem acima dos padrões da OMS. Há a seção de download dos dados agregados e padronizados e também links para os órgãos ambientais dos estados e do Distrito Federal. “A plataforma é um espaço de monitoramento e diálogo com os estados”, ressaltou Sousa. No entanto, para ter uma noção mais adequada de como está o problema da poluição do ar no Brasil, é necessário a expansão e a continuidade do monitoramento da qualidade do ar no país todo.

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