Não levou desaforo para casa. Por Alex Solnok
Temer não tem do que se queixar: o ministro Fábio Medina Osório cumpriu suas ordens, não levou desaforo para casa. Só que, ao contrário do exemplo que Temer apresentou na primeira e inesquecível reunião ministerial, o desaforo partiu de dentro do palácio e não das linhas inimigas.
Eliseu Padilha demitiu Osório, Osório não aceitou. (Mais ou menos, guardadas as devidas proporções como no episódio em que Paulo Henrique Ganso recusou-se a sair de campo quando o técnico quis substituí-lo.)
Gaúchos ambos, os dois bateram cabeça.
Advogado Geral da União, o que não é pouca coisa, Osório disse que só saía demitido por Temer e não por um ministro como ele:
“Que governo é esse, onde ministro demite ministro?”
Padilha chamou Temer, que consumou a demissão por telefone.
E tinha uma carta na manga para o cargo agora vago: Grace Mendonça, que trabalhava com Osório.
Elementar meu caro Watson: era a mulher que faltava no primeiro escalão.
Embora fosse do segundo.
O “Maquiavel de Tietê” deu aquela risadinha entredentes, como quem diz algo como “não contavam com a minha astúcia”.
Padilha mandou espalhar que Osório fora demitido por querer interferir na Lava Jato. E ponto final. Achou que o assunto estava enterrado.
Osório reagiu: foi à Veja contar a sua versão.
E a sua versão é arrasadora. E diametralmente oposta à de Padilha. Ele diz que pediu à Polícia Federal acesso a inquéritos de aliados do governo para abrir ações de improbidade administrativa contra eles e não os proteger, como insinuou Padilha.
A Polícia Federal enviou os inquéritos de Arthur Lira, Benedito Lira, Dudu da Fonte, João Alberto Pizzolatti Junior, José Otávio Germano, Luiz Fernando Faria, Nelson Meurer e Roberto Teixeira, do PP e de Renan Calheiros, Valdir Raupp e Aníbal Gomes, do PMDB.
Osório recebeu autorização do Supremo Tribunal Federal para conhecer os inquéritos, mas, apesar de a Advocacia-Geral da União precisar somente copiar os inquéritos em um HD, eles não chegavam até ele. A secretária encarregada da cópia, Grace Fernandes Mendonça, alegava repetidamente não encontrar um HD externo.
“Me parece que o ministro Padilha fez uma intervenção junto a Grace Mendonça, que, de algum modo, compactuou com essa manobra de impedir o acesso ao material da Lava-Jato”, disse Osório à Veja.
A sub que o enganava com os documentos ganhou imediatamente o seu lugar.
Osório ofereceu à Veja uma grande manchete: “O governo quer abafar a Lava Jato”.
Confirmou, portanto, a narrativa insinuada por Romero Jucá na famosa gravação que o derrubou do ministério do Planejamento.
É o primeiro escândalo do governo empossado há dez dias.
E que escândalo!
A primeira grande crise. Um recorde!
Como sabemos, todas as quedas de presidentes, desde 1992, começaram na capa da Veja.
Ao acusar o governo, Osório acusa Temer. Já delatado na Lava Jato, é o principal interessado em melar a operação.
Isso, sim, é obstrução à Justiça!
Ou Temer joga Padilha ao mar, ou vai fazer de conta que não viu e não ouviu.
Mas… derrubar mais um ministro? É crise sobre crise.
A essa hora o palácio deve estar procurando estratégias para atenuar os efeitos do incêndio a bordo.
Mas apagar incêndio com o Titanic em movimento é complicado.
A oposição poderá pedir uma CPI: a CPI da Lava Jato, com base nas declarações de Osório à Veja.
A oposição pode ser pequena, mas é barulhenta.
A situação vai se ver numa saia justa: vai defender o governo ou a Lava Jato?
A opinião pública, que já não vai com a cara do Temer ganhou mais um forte argumento para rejeitá-lo.
Tudo o que Temer temia, mas não queria que acontecesse.
E isso é apenas o começo de um governo ilegítimo. Mas pode ser o fim.
A “Buzina do Chacrinha” era um programa que “acaba quando termina”.
Este é um governo que acaba quando começa.
Artigo publicado originaolmente em http://www.brasil247.com/pt/blog/alex_solnik/254432/N%C3%A3o-levou-desaforo-para-casa.htm