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O fim das verdadeiras loiras? por Laure Belot e Véronique Lorelle

7 - 9 minutos de leituraModo Leitura

Vai ser pouco depois de 2200, na Finlândia, que nascerá a
derradeira loira do planeta. Esta afirmação foi repercutida por diferentes
veículos de comunicação, desde o "New York Times" até à BBC.


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Desde 2002,
contudo, a Organização Mundial da Saúde (OMS) – citada como a fonte deste estudo
que anuncia "a extinção do gene que caracteriza os verdadeiros loiros" – não se
cansa de clamar que ela "nunca conduziu pesquisas sobre este assunto".

Apesar dessas ressalvas, a brincadeira não deixa de ter fundamento. O
planeta conta 6,5 bilhões de indivíduos, dos quais cerca de 1 bilhão na África e
4 bilhões na Ásia (da Turquia ao Japão), segundo o Population Reference Bureau
(Centro de Estatísticas e Informação sobre População, Saúde e Meio-ambiente, com
sede em Nova York). Em 2050, a população mundial terá aumentado para 9 bilhões
de humanos. Os 3 bilhões de pessoas suplementares serão principalmente oriundos
da África, da Ásia e da América do Sul.

Logo, a freqüência dos loiros,
que são raros fora dos países ocidentais – mesmo se eles podem ser encontrados
de maneira esporádica na África do Norte e no Oriente Médio – vai diminuir. E
isso acontecerá tanto mais que essa cor de cabelos, assim como os olhos azuis,
se deve a genes recessivos. "Para ser loiro, é preciso herdar dois genes que
comandam esta característica, sendo que um provém do pai, e o outro da mãe",
lembra o geneticista Axel Kahn. "Se, em todo o mundo, o número de genes loiros
permanece constante, ao passo que aquele de genes morenos vai aumentando, haverá
uma probabilidade decrescente de que duas pessoas herdem dois genes loiros, os
quais constituem uma condição impreterível para que eles sejam loiros".

Segundo Kahn, uma hipótese realista seria a "de uma intensificação das
misturas das populações, e do advento de um perfil de humano mestiçado, do tipo
brasileiro".

A L'Oréal, a companhia líder mundial em produtos de beleza,
já se antecipou a esta evolução. Ela está construindo em Saint-Ouen
(Seine-Saint-Denis, região parisiense) um centro mundial que será dedicado a
pesquisas relativas a tudo o que se refere aos cabelos. Neles, 600
pesquisadores, que deverão operar a partir de 2010, trabalharão "numa nova forma
de beleza, o cabelo mestiçado", explica Patricia Pineau, a diretora da
comunicação deste setor de pesquisas.

Desde já, segundo uma pesquisa que
foi conduzida em torno de milhares de cabeleiras, e que será publicada na
revista especializada "Human Biology" neste outono, a L'Oréal recenseou oito
diferentes tipos de cabelos em vez de três, na escala mundial. "Até então,
distinguia-se o cabelo caucasiano, o africano e o asiático. Nós conseguimos
elaborar uma classificação mais respeitosa da geografia humana, e baseada na
forma e no grau de crespidão do cabelo: desde o muito rígido (Ásia, Índia,
México…) até o encrespado intenso (Gana, Nordeste brasileiro). Isso deverá
permitir que nos adaptemos à diversidade das cabeleiras induzida pela mestiçagem
das populações".

E desde já, surge também um paradoxo: no decorrer das
próximas décadas, a proporção de loiros naturais seguirá diminuindo, e, contudo,
o mito poderia muito bem crescer proporcionalmente. Já, na Europa, uma mulher em
cada três tinge os seus cabelos numa nuance de loiro, ao passo que, segundo
Joanna Pitman, autora do livro "Les Blondes" ("As Loiras", editora Autrement,
2005), apenas "um adulto em cada vinte nos Estados Unidos e mais ou menos a
mesma proporção na Europa" tem esta cor natural.

A que se deve este
fascínio? Segunda esta escritora, a história remonta a Vênus/Afrodite, deusa do
amor de cabeleira clara… "A partir de então, cada época conferiu [à louridão]
valores que refletiam as suas preocupações. Ela tornou-se um vício durante as
épocas obscuras, uma obsessão durante o renascimento, uma mística na Inglaterra
elisabetana (…), uma ideologia durante os anos 1930, um sinal de convite
sexual durante os anos 1950…", escreve Joanna Pitman. E em nossa época? Para a
escritora britânica Marina Warner, uma especialista nos mitos, "ser loiro
equivale a lembrar a cor da infância, a se envolver na busca da juventude
eterna".

Para o psicanalista Samuel Lepastier, o mito da louridão é
intimamente vinculado à história européia. O continente, que foi invadido por
povos loiros – os dórios, os francos – associou esta cor ao vencedor: "Trata-se
de um mito fundador da desigualdade das raças humanas, cuja versão a mais
delirante foi o racismo hitleriano", sublinha.

Mas a atração pelo loiro
se explicaria muito além do fenômeno sociológico ou cultural, segundo o
antropólogo canadense Peter Frost. Para este pesquisador, que estudou as formas
como o gene perdurou em certos lugares do planeta, isso estaria relacionado à
"seleção sexual que privilegia as cores vivas, e também as cores raras. A
atração sexual orienta-se para as variantes menos freqüentes e mais sedutoras.
Com isso, instala-se um equilíbrio dinâmico que conduz a uma diversidade cada
vez maior da espécie".

Diferentemente
do que afirmam os lugares comuns, seria, portanto, menos a cor dos trigos que
seduz do que a sua raridade num determinado grupo de população. Para ilustrar
esta tese, o pesquisador canadense cita os estudos do biólogo americano Thomas
Thelen. "Este último preparou três séries de slides que mostram mulheres
atraentes: a primeira apresentava 6 morenas; a segunda 1 morena e 5 loiras; e a
terceira 1 morena e 11 loiras. Então, ele pediu a um grupo de homens para
escolher, em função de cada série, a mulher com a qual eles gostariam de se
casar. O resultado do teste foi que quanto mais uma mesma morena era rara numa
série, quanto mais eles a escolheram".

As sociedades nas quais
predominam os cabelos de azeviche já se divertem com uma cabeleira diferente da
delas, o que é o caso, por exemplo, das lolitas japonesas. "Estão criando não só
tons loiros peroxidados [oxigenados], como também cabelos púrpuros ou verdes, as
quais são cores absolutamente inovadoras, e cujo objetivo permanece o mesmo:
chamar a atenção", assegura Peter Frost.

Ainda assim, segundo Samuel
Lepastier, nada diz que o mito loiro não será substituído por algum outro, à
medida que a esfera de influência do planeta for se deslocando rumo a Ásia e que
outras culturas dominantes forem surgindo. A força simbólica do loiro, conforme
lembra o psicanalista, é acima de tudo o fruto de duzentos anos de supremacia do
mundo ocidental, desde a colonização até a expansão da cultura americana, com as
suas deusas platinadas.

Os geneticistas, por sua vez, estão certos de
uma coisa: o caráter "fenótipo loiro" nunca se extinguirá, diz Axel Kahn. "Ele
poderá ressurgir aqui ou lá, um pouco como fazem atualmente as doenças raras". O
planeta não está protegido de novas surpresas. Atualmente, populações de loiros
naturais estão se desenvolvendo entre os esquimós do oeste do Ártico canadense e
os aborígines da Austrália central. "Nesses dois casos, trata-se possivelmente,
analisa Peter Frost, dos primórdios de uma evolução por meio de seleção sexual,
parecida com aquela que conheceram os europeus".

Tradução: Jean-Yves de Neufville

Visite o site do Le Monde
BLOND (Loiro): do latim "blandus" (encantador) e do latim
medieval "blundus" (amarelo). A palavra aparece no século 12 em francês e entra
no vocabulário corrente por volta de 1930 com as "deusas" de Hollywood. (Fonte:
Joanna Pitman, vide abaixo).

GENÉTICA: A cor dos cabelos é
determinada pelo gene MC1R, que regula a eumelanina (pigmento moreno-negro) e a
feomelanina (loiro-ruivo). A proporção desses pigmentos varia bastante conforme
as parte do corpo, seja no bulbo piloso, no íris ou na pele, daí a existência,
por exemplo, de morenos de olhos azuis. Segundo a metodologia empregada pela
L'Oréal, um cabelo loiro possui pelo menos 50% de pigmentos
claros.

PARA LER: "Les Blondes" (As Loiras), uma história muito
estranha, de Afrodite até Madonna, de Joanna Pitman (publicado na França pela
editora Autrement, 2005, e também nos Estados Unidos, com o título "On
Blondes").
"From the Beast to the Blonde: On Fairy Tales and Their Tellers"
("Da Fera às Loiras – Sobre contos de fadas e seus narradores"), de Marina
Warner (Chatto & Windus, 1994, editado no Brasil pela Cia. das
Letras).

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