O poder de destruição de Bolsonaro cala os militares. Por Moisés Mendes
A sabotagem à vacinação e a todas as formas de contenção da pandemia foi a mais criminosa, devastadora e cruel obra de destruição de Bolsonaro em quatro anos no poder.
Há muitas outras. Mas a sua ação destrutiva é interminável também entre aliados e continua ativa. Mesmo com o destruidor fora do governo e às vésperas de ser condenado, não uma, mas várias vezes.
Bolsonaro destruiu vidas pessoais e estruturas institucionais do seu entorno. Destruiu as vidas de dois auxiliares fiéis, agora abandonados. Anderson Torres e Mauro Cid estão condenados a pagar para sempre e lentamente os custos das conspirações arquitetadas pelo chefe.
Sabiam o que estavam fazendo, mas foram empurrados para as tarefas determinadas por um falso líder que fomentou o golpe e fugiu para os Estados Unidos.
Torres ainda teve a chance de fugir para o mesmo lado, numa combinação de estratégia desesperada (se der certo, voltaremos vitoriosos) e de covardia (se não der, não estaremos lá para ver).
Mauro Cid foi empregado de Bolsonaro e de Michelle, até para pagar contas. Historiadores da vida privada da caserna sabem que Cid talvez seja o mais subserviente dos oficiais da história da República a serviço, não do Estado, mas de uma família.
Ao se acumpliciar com generais medíocres, que envergonhariam os golpistas de 64, Bolsonaro destruiu a imagem das Forças Armadas. Não só como instituição de defesa do país, mas como organização agora incapaz até de aplicar um golpe.
Bolsonaro foi tutelado por militares que acreditavam no seu poder eleitoral e na capacidade de permanecer no governo, mesmo derrotado na eleição. Essa era a inveja que os generais tinham dele.
Foram incapazes de se dedicar a um projeto para o país, com fizeram a partir de 64, mas tinham a ambição de desfrutar por décadas do que o poder oferecia, de empregos no varejo a grandes negócios por eles avalizados ou observados à distância, incluindo o garimpo na Amazônia.
Bolsonaro destruiu a vida de mais de mil alucinados misturados a terroristas, que invadiram Brasília no 8 de janeiro e acabaram presos. Estão sendo condenados a até 17 anos de cadeia por terem acreditado no líder fujão.
Na aglomeração de Sila Malafaia na Avenida Paulista, em fevereiro, referiu-se a eles como coitados. É uma forma depreciativa de continuar desqualificando os manés que o levavam a sério.
Não há quem possa defender os coitados que Bolsonaro quer ver anistiados, numa ideia apenas retórica, para pelo menos dizer que faz algo por eles. Faria se compartilhasse com os manés e com todos os que destruíram os R$ 17 milhões que recebeu via PIX.
Hoje, não há como confrontar as vidas miseráveis dos invasores de Brasília com a situação de generais de muitas estrelas sob investigação por participação no núcleo golpista.
Mas todos, manés e militares, perderam a perspectiva de futuro, a partir do momento em que as estruturas e os personagens do golpe foram expostos e identificados.
É uma missão complicada salvar reputações pessoais da gente miúda, civil, desimportante e abandonada do 8 de janeiro. Mas é possível e deveria ser uma obrigação dos militares tentar salvar a imagem da instituição que Bolsonaro degradou com seus generais.
Por que as Forças Armadas não reagem, por seus líderes, mesmo os que já estejam de pijama, em defesa da instituição? Se as Forças Armadas não têm uma maioria golpista, como nomes respeitáveis das três armas não tentam reagir e parar a destruição da instituição?
Essa inação seria a prova de que a maioria ainda é golpista, mesmo que o plano do tenente expulso do Exército não tenha dado certo? Não é preciso responder.
Por que nomes de peso das Forças Armadas não tentaram e não tentam salvar a instituição da sanha destrutiva de um tenente e seus asseclas? Os silêncios ouvidos muito além do planalto central valem como resposta.
Moisés Mendes é jornalista, autor de “Todos querem ser Mujica” (Editora Diadorim). Foi editor especial e colunista de Zero hora, de Porto Alegre.
Artigo publicado originalmente no Brasil 247