Aldeia Nagô
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Oportunidade e oportunismos: teoria e prática em políticas culturais no PT por Morgana Eneile

6 - 8 minutos de leituraModo Leitura

Texto de Idelber Avelar publicado no
site da Revista Fórum em 5 de abril traz à tona questões que merecem
esclarecimento.


Ou o autor desconhece o processo histórico de construção
política e programática do PT – ignorando as relações do partido com
suas bases, seus governos e lideranças – ou omite deliberadamente essa
trajetória com o objetivo de comprovar seu equivocado raciocínio,
segundo o qual os avanços na Cultura, durante o Governo Lula, teriam
ocorrido "apesar "do PT.

O
instrumental político do Partido dos Trabalhadores serviu e serve de
base para a construção de muitas políticas em implantação no Ministério
da Cultura – construção que não nasce do Governo, mas existe desde o
início do PT, com a adesão de diversos intelectuais e artistas ao nosso
projeto de país, no que se refere às questões culturais e para além
delas.

Data da
década de 80 a primeira publicação do partido sobre o tema, denominada
"Política Cultural", com contribuições de Antonio Candido, Edélcio
Mostaço, Lélia Abramo e Marilena Chauí. O livro foi editado pela
Fundação Wilson Pinheiro, instituição anterior à Fundação Perseu Abramo.

É
interessante notar que o texto de Avelar aponta para a suposta
"ausência" do PT justo no momento em que a Fundação Perseu Abramo –
criada em 5 de maio de 1996 – lança duas novas publicações sobre a
temática: As Políticas Culturais e Governo Lula, de Albino Rubim,
reconhecido estudioso da temática na UFBA e atual Secretário de Estado
de Cultura da Bahia; e a coletânea de textos A Criação de um novo futuro
na Educação, Cultura, Ciência e Tecnologia, Esportes e Juventude, da
Coleção Brasil em Transformação 2003-2010, resultado de oficinas entre
diferentes construtores das políticas.

A
trajetória do PT enquanto gestor da Cultura não se iniciou no governo
Lula. Aquilo que convencionamos chamar de ‘O modo Petista de governar’
começou nas gestões locais e vem se consolidando no plano nacional. No
início do governo Lula, o Ministro Gilberto Gil citou o programa de
governo "A imaginação à Serviço do Brasil", construído por diversos
segmentos e muitos gestores locais como Márcio Meira, Hamilton Pereira,
Antonio Grassi, João Roberto Peixe, Sérgio Mamberti, Margarete Moraes,
Marco Aurélio Garcia e muitos outros colaboradores. Boa parte das
perspectivas adotadas, como o conceito das três dimensões da Cultura –
simbólica, cidadã e econômica – ou a visão antropológica do fazer-saber
cultural, estão presentes neste emblemático documento.

É
importante ressaltar, mais uma vez, que esse conjunto de conceitos não
surgiu espontaneamente em 2002, mas estava em construção desde a
campanha presidencial de 1989. Em 2002 demos um salto, promovendo
seminários regionais que agregaram ao debate centenas de militantes da
área, filiados ou não ao partido.

Um
dos maiores equívocos conceituais do texto de Avelar é associar o PT ao
modelo ‘bom negócio’ da Lei Rouanet, desconhecendo (ou omitindo) que
nossa formulação aponta tradicionalmente para a construção de
alternativas ao financiamento da cultura, tendo como eixo fundamental os
fundos e editais públicos, o que constitui campo de força para o fim do
mecenato como tal. Não fosse assim, uma de nossas bandeiras não seria o
Sistema Nacional de Cultura, baseado no conjunto CPF – Conselho e
Conferência, Plano e Fundo, unindo integração de conceitos com
participação social, distribuição de recursos de forma federativa e
descentralizada e planejamento de longo prazo.

A
ampliação do debate em torno deste e outros temas deu impulso
fundamental para a criação da Secretaria Nacional de Cultura PT e
respectivas instâncias regionais, hoje consolidadas em 24 estados da
federação. Se, antes, nos reuníamos basicamente nos momentos eleitorais,
ganhamos ao longo deste período complexidade e capilaridade, reunindo
milhares de militantes que constroem no dia-a-dia um universo de
políticas culturais nos diversos níveis governamentais e movimentos
sociais.

"Ser
petista" do século 21 tem muito a ver com um estado de reconhecimento
identitário que se desenvolve e se manifesta em diversos níveis de
militância. Para aqueles que não vivem o cotidiano orgânico partidário,
pode ser mais simples afirmar a ausência de algo do que participar
ativamente da construção de projetos coletivos. O amplo debate e a busca
de consensos tem sido uma das marcas fundamentais deste partido com
quase um milhão e meio de militantes filiados e com elevado grau de
diversidade de forças políticas e pensamentos.

Por
certo o Partido dos Trabalhadores não é o único espaço-local de
produção e formulação de políticas culturais, mas não será necessária
uma pesquisa aprofundada para verificar que foi pioneiro na incorporação
da dimensão cultural no seu programa partidário, com resoluções sobre
diversos aspectos e políticas estabelecidas no país. Exemplo prático
está na formulação de leis e projetos que tramitam no Congresso, a
maioria a partir de proposição de parlamentares petistas. Qualquer
cidadão, ao verificar as leis em tramitação e as já aprovadas, pode
comprovar este fato, seja na emenda constitucional sobre o Plano
Nacional de Cultura, na PEC 150 do Orçamento da Cultura, na PEC do
Sistema Nacional de Cultura e em tantas outras.

O
PT também é pioneiro em publicações que orientam o debate interno,
contribuindo para o desenvolvimento da prática na gestão cultural e nos
movimentos – todas disponíveis no site do Partido na página da
Secretaria Nacional de Cultura (http://www.pt.org.br/portalpt/secretarias/cultura-15.html).

Durante
os oito anos do Governo Lula, o PT participou em diversas esferas da
gestão do Ministério da Cultura e discutiu diretamente com os gestores
os rumos e práticas do MinC. Isso implica não somente compromissos com
os resultados, mas também a co-autoria de muitas das inovações e
práticas. Novas tecnologias e meios surgiram e a gestão soube acolher e
dar oportunidade de crescimento e desenvolvimento a elas, como, por
exemplo, à Cultura Digital – que, vale o registro, teve debate
específico na campanha de Dilma realizado pela Secretaria Nacional de
Cultura do PT em conjunto com diversos militantes do segmento.

As
diretrizes propostas para o Governo Dilma foram apresentadas e
construídas num processo muito amplo. Ele se iniciou no Congresso do PT
em fevereiro de 2010, onde as bases programáticas do PT foram
estabelecidas; se ampliou no debate interno, com contribuição de agentes
da sociedade; e entrou durante a campanha numa comissão ampla que
incluía todos os partidos da coligação. O resultado é público, e é nele
que devemos nos pautar para fazer as cobranças necessárias enquanto
Partido político no poder e base de sustentação do Governo.

A
área da Cultura tem para os próximos quatro anos um programa que aponta
os desafios colocados para os avanços, inclusive conceituais, das
conquistas obtidas no Governo Lula. Identificar qualquer iniciativa da
gestão atual como "ruptura" nos coloca acomodados num determinado
degrau, quando temos uma enorme escada para subir.

Toda
oportunidade de debater política pública deve ser aproveitada e
reconhecida. Mas rebaixar o debate para o nível das acusações genéricas,
sem lastro na realidade, não leva a parte alguma – embora possa servir
bem àqueles se movem por interesses outros.

Nosso horizonte continua onde sempre esteve.

Morgana Eneile é secretária nacional de Cultura do PT.

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