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Reforma tributária e a desigualdade, por José Dirceu

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O Brasil é um dos países de maior desigualdade do mundo. É um país rico, mas a concentração de renda, riqueza e propriedade o faz um campeão da desigualdade: 1% da população tem 28,5% da renda nacional e 10% têm 50%. Além da pobreza e da miséria, a desigualdade é um dos principais entraves para o desenvolvimento nacional e não apenas para o crescimento econômico.

Um subconsumo histórico marca nossa economia, apesar de termos demanda e condições para crescer. Somos um dos maiores mercados internos do mundo, 5º país em território, 6º em população e 8ª economia. Temos indústria de base, soberania alimentar, energética e tecnológica, ainda que não desenvolvida.

O Brasil é um potencial à espera de investimentos. Necessitamos de dezenas de milhões de residências, metade da população não tem saneamento básico, 1/3 vive abaixo da linha da pobreza ou mesmo da extrema pobreza, carente de renda e do essencial para a vida. Toda nossa infraestrutura precisa se desenvolver e ser modernizada, é urgente investir em educação, ciência e tecnologia, em saúde e saneamento, transporte e habitação. A questão ambiental e a Amazônia não podem mais esperar.

Temos ao nosso lado um outro mercado de 200 milhões de habitantes, a América do Sul que estávamos integrando. E, o mais importante, temos condições para crescer apoiados no mercado interno e na capacidade produtiva já construída. O que nos impede então de crescer? A concentração histórica de renda e riqueza, agravada pela estrutura tributária e juros reais da economia que expropriam a renda principalmente da classe trabalhadora via impostos regressivos e indiretos. Uma estrutura tributária que vai na contramão da adotada no mundo desenvolvido que se apoia nos impostos sobre a renda, a riqueza e a propriedade. Além disso, em todos países desenvolvidos hoje os juros são negativos; daí, a fácil administração das dívidas internas sempre superiores ao PIB.

CONSENSO INTERNACIONAL
Há consenso internacional de que a desigualdade é hoje o principal entrave para o crescimento econômico e que se fazem necessárias reformas estruturais que desconcentrem a renda e a riqueza, começando pela tributária. O próprio FED norte-americano acaba de articular sua política monetária ao crescimento do emprego, ao pleno emprego e caminha para zero de juros. O Brasil é assim uma exceção gritante –os spreads bancários são uma apropriação ilegal da renda nacional.

Mais uma vez na contramão dos países desenvolvidos, a proposta de reforma tributária do governo não prioriza o fim de seu caráter regressivo e indireto sobre bens e serviços. E os juros bancários reais continuam extorsivos, apesar de uma inflação abaixo da meta e da menor Selic da nossa história.

O jornais Valor Econômico e O Globo realizaram, na série “E Agora Brasil”, um seminário sobre a reforma tributária em discussão no Congresso Nacional. No debate, nem uma palavra sobre a desigualdade, sobre impostos sobre a propriedade e a renda, sobre a riqueza. A única concessão a uma política tributária mais justa é a cobrança de impostos sobre lucros e dividendos, assim mesmo compensada no Imposto de Renda. Nada sobre taxar heranças e doações, fortunas, propriedade e uma real mudança no Imposto de Renda.

Antes de discutir o custo, realmente absurdo, do nosso sistema tributário ou a disfuncionalidade do atual ICMS, é urgente desmontar o atual sistema tributário que concentra renda em vez de a distribuir. E colocar abaixo o sistema bancário e financeiro, outro concentrador de renda, expropriador da renda do trabalho e da produção, particularmente das micro, pequenas e médias empresas.

ALIENAÇÃO SOBRE A DESIGUALDADE
Ao lado dessa alienação das elites sobre a desigualdade que asfixia o país e os brasileiros, vivemos num mundo de fantasia onde a crença religiosa no corte de gastos, teto de gastos, regra de ouro, substituem uma política de desenvolvimento e crescimento com distribuição de renda. Chegamos ao absurdo de destinar o lucro com as reservas cambiais, estas herdadas dos governos do PT, de R$ 325 bilhões para abater a dívida interna quando centenas de obras públicas estão paralisadas e o país demanda investimentos em sua infraestrutura econômica e social, em educação, ciência e tecnologia.

Não haverá solução sem investimentos, principalmente investimentos públicos. Com o agravante da pandemia e da recessão atual, é líquido e certo que somente crescendo vamos resolver questões como o deficit público e a dívida interna. Sem aumento da arrecadação, só vamos agravar a recessão e a pobreza. Sem criar empregos e renda, cada vez mais o país necessita de programas sociais de renda gerando um círculo vicioso que confirma a urgência de uma ampla reforma social, uma revolução social que desconcentre a renda, a riqueza e a propriedade e democratize mais nosso Brasil com uma reforma política e do Estado. 

 https://www.poder360.com.br/opiniao/economia/reforma-tributaria-e-a-desigualdade-por-jose-dirceu/

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