Aldeia Nagô
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Retiro. Por Mônica San Galo

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Semana passada fui à Avenida Sete de Setembro fazer umas compras, amolar umas tesouras e me sentir um pouco gente. Ando muito arredia e a Avenida Sete é antídoto perfeito para solucionar essa deficiência.

Não há coisa de que goste mais do que andar em meio às gentes..

…barracas de frutas, peixes e verduras, homens vendendo castanhas de caju torradas, biscoito avoador, carimã pra bolo e biscoitinhos de goma inacreditáveis, além dos banhos de folha de tudo o que é jeito, prá tirar mau-olhado, pra chamar homem, pra descarrego, pra abrir caminhos, eu mesma comprei um bocado!

E incensos! Amo incensos! Acho até que devo ter sido bruxa em alguma encarnação. Quer dizer, talvez esteja sendo nessa mesmo e não tenha me dado conta, tonta que sou, minhas bruxarias nem fazem tanto efeito assim..

Aquela pedrinha de incenso queimando dentro do nagé tem tanto poder sobre minha pessoa!.. fico nostálgica, fico gente boa, viro anjo, penso em serenidades, enquanto finjo não sentir a brasa dentro do coração, arrebentando aurículas e ventrículos impotentes e atordoados, fazendo-o fibrilar loucamente.

Camisolas de quinze reais penduradas na barraca, sensualíssimas, seduzindo os mais empedernidos celibatários, até monge é capaz de pecar diante de tanta luxúria. Eu sou apreciadora de uma boa indaga, indagar é comigo, para tanto provoco o camelô, que coisa cara, moço, Deus me livre, não faz menos?, ao que ele retruca, Dona, não meta Deus nisso não que ele se ofende! A senhora, moça branca, rica, parecendo ministra de igreja, dizer que quinze reais é caro!.. Nem o cão acredita, que dirá o Pai-Nosso… Olhe bem e veja se o seu marido não vai lhe apreciar numa lindeza dessas!

Agradeço e saio rápida, conversa descambando pra lado tão pessoal e íntimo não concebo, sinto o rosto avermelhar, sim, sou dessas que ainda cora!

Inda mais sendo conversa que mistura tudo, Deus e o diabo, pecados e penitências, Ave Maria!

Sigo, rindo, em busca de morangos, não os encontro, em seu lugar vejo acerolas vermelhas, escarlates, tão bonitas rebrilhando ao sol!

A negra belíssima, braços roliços, peitos enormes num vestido tomara-que-caia estampado por flores gigantes, roxas e amarelas, uma rainha iabá, a carapinha envolvida num torço azul anil, pescoço coberto por guias coloridas, rasga o céu com o som escandaloso da gargalhada diante da barraca de mariscos, numa conversa sem fim com o barraqueiro, conversa descarada, cheia de propostas indecentes, a boca vermelha de dentes brancos pronta pra aproveitar tudo, tudo mesmo o que possa entrar por ali, a alegria, o ar que respira, o viver em toda a sua plenitude..

Voltei mais leve pra casa, há vida em outros planetas. É reconfortante saber.

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