30 anos de Movimento Poetas na Praça. Por Geraldo Maia
tivesse acontecido no Sul Maravilha (Rio de Janeiro, São Paulo, Minas Gerais,
Rio Grande do Sul) o Movimento Poetas na Praça já estaria devidamente canonizado
e entronizado como…
o mais importante movimento literário, social e político
acontecido no Brasil depois da Semana de Arte Moderna de 22 que pariu um tanto
festivamente o Modernismo brasileiro.
Já aquele deu início à Individuação
Socialista no campo das artes, da sociedade e da política. Senão vejamos: O MPP
tem início em janeiro de 1979 com a tomada da Praça da Piedade pelos poetas que
ali instalaram uma trincheira de resistência cultural e diariamente, por uma
década (não foi só uma semana), transformou o local no primeiro "Ponto de
Cultura" que se tem notícia no país, com a promoção de leitura diária de poemas,
textos, manifestos, etc, realizada por poetas, políticos, artistas, e por
cidadãos até então sem um espaço para expressar a sua voz e a sua criatividade.
Mas
não foi só leitura, teve também a popularização do livro, oferecido em diversas
formas práticas e baratas e por diversos meios de impressão, desde o mimeógrafo,
à reprografia, e mesmo feitos à mão, artesanalmente. A ordem era tornar o livro
acessível a todos. Mas também a literatura baiana, brasileira e universal foi
levada para a praça através de exposições biobibliográficas em homenagem a
diversos escritores além de leitura de textos dos principais livros dos mesmos.
Com isso manteve-se a chama do livro, da leitura e a da literatura acesa na
marra, pois os livros de Jorge Amado foram queimados, os de Gregório de Matos
proibidos juntos com os de Cuíca de Santo Amaro. Todos os dias, a partir das
16h, todos sabiam que na Praça da Piedade algo de libertário e revolucionário
acontecia ao alcance de todos e com a participação de todos.
A
Semana de 22 teve nomes como Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Tarsila do
Amaral, Menotti del Picchia, Cassiano Ricardo, Alcântara Machado, Plínio
Salgado, numa primeira instância e Raul Bopp, Geraldo Ferraz, Patrícia Galvão,
Jorge de Lima, Murilo Mendes, numa segunda fase, enquanto que o Movimento Poetas
na Praça, em Salvador, Bahia, teve num primeiro momento nomes como Antonio
Short, Eduardo Teles, Zeca de Magalhães, Geraldo Maia, Ametista Nunes, Gilberto
Costa, Margareth Castanheiro, Ronaldo Braga ao lado de artistas como os
dançarinos Tição, Jorge Watusi e Cafuné, os poetas e jornalistas Tony
Vasconcelos, Albenísio Fonseca e Fernando Conceição, do poeta e artista plástico
Jairo Rodrigues, dos cartunistas Nildão (ilustrou vários trabalhos de Antonio
Short) e Caó Cruz Alves (sempre presente em capas e ilustrações das revistas
editadas pelo MMP).
E
dos músicos Francisco Gileno e Beto Silva, além da presença das então iniciantes
Margareth Meneses e Sarajane, de atores como Luís Portugal e Ramom el Bachá, de
cineastas como José Humberto e Edgar Navarro, dos mestres poetas Carlos Anísio
Melhor e Fred Souza Castro, de mestres populares como Edson Ribeiro, Manoel
Almeida e Altamirando Camacan junto com o escritor Oleone Coelho Fontes,
políticos como Luiz Nova, Lídice da Mata, Ney Campelo, Fernando Shimidt que
participou do programa "Constituinte na Praça".
E
numa etapa seguinte nomes como Gilberto Teixeira, Joelsom Meira, Lino Almeida,
Edésio Lima, Miguel Carneiro, César Lisboa, Mário Garrido, Mário Oliveira,
Agenor Campos, André Piedade, Jurisdeth Castelúccio, Leny Queiróz, Chico
Nascimento, Tom di Paula, Douglas de Almeida, Walter César, Lula Miranda, Marcos
Peralta, Edgar Velame, Cacau Novaes, só para citar alguns. Mas todo esse esforço
contou com o apoio imprescindível do educador Hermano Gouveia, do poeta e
professor Jorge Portugal, do professor Edmundo, do poeta e sindicalista
professor Zé Wilson Bacellar.
O
MPP influenciou diversos poetas que vieram conhecer de perto o que se passava na
Praça Nacional da Poesia, como foi batizada a Praça da Piedade, para comemorar o
Dia Nacional da Poesia, instituído
pelo movimento em homenagem à Castro Alves, na passagem do seu aniversário, 14
de março, e o de Glauber Rocha. Nomes como o do poeta Miltom Aguiar, de São
Paulo, do escritor Paulo Lins, do Rio de Janeiro, do poeta Mário Pirata, que
levou as lições do movimento para o Rio Grande do Sul, o próprio Zeca de
Magalhães que levou a prática do MPP para o Rio de Janeiro, não agüentou e se
mudou de uma vez para se integrar definitivamente no movimento com sua Arte
Delírio Noturno e seu jornal "A Todo Vapor". Antonio José, poeta do Ceará,
recitou com o MPP seus versos onde "lia no eclipse e via no apocalipse" os rumos
do que se tornaria o maior e mais importante movimento literário, político e
social no Brasil nas décadas de 80 e 90. O jornal "O Inimigo do Rei" publicou o
"Manifesto por Poesia
Revolucionária" escrito pelos integrantes do movimento dando início à série
de textos em torno da criação da Individuação Socialista proposta por
alguns de seus integrantes, notadamente os poetas Geraldo Maia e Eduardo Teles,
que escreveram o Manifesto Individuação Socialista em Abya
Yala, uma série de ensaios sobre o processo de invasão do continente de
Abya Yala chamado equivocadamente de América sob o ponto de vista dos invadidos.
O
MPP ganha o interior do estado. Eduardo Teles vai para Xique-Xique onde, morando
por algum tempo em um banco de praça, inicia um trabalho de organização dos
poetas e artistas através de recitais e rodas de leitura além da publicação de
antologias. Um outro grupo formado por Zeca de Magalhães, Margareth Castanheiro,
Airtom Pires e Geraldo Maia instala-se em Itabuna dando início a uma série de
atividades em torno da poesia e da literatura, incluindo a doação de importante
acervo para a biblioteca local em formação.
Surgem grupos de poetas faladores de poesia em Barreiras,
Simões Filho, Feira de Santana, Camaçari, Cachoeira, Jairo Rodrigues e César
Lisboa atuam em Santa Maria da Vitória, Manuka Almeida em Juazeiro, nos bairros
o grupo Cabra, de Castelo Branco, o Geafagra, na Fazendo Grande do Retiro atuam
em consonância com o MPP. Surgem outros grupos com o mesmo estilo ou inspirados
no estilo do MPP a exemplo de Movimento
Art Poesia, Estação Poesia, Associação Poetas na Praça, grupo Maccacca, Importuno Poético, enfim, a Praça da
Piedade passa a ser realmente o local de encontro e de expressão de todos os
movimentos organizados que começam a ganhar as ruas e que vão sendo criados a
partir do MPP como o Movimento dos Sem Teto, Movimento GLBT, Movimento
Indiodescendente, Movimento Negro, Movimento de Mulheres, e tantos outros que
encontraram na Praça da Piedade o legado de libertação e rebeldia que o MPP deu
continuidade a partir do levante dos Alfaiates ou Rebelião dos Búzios, dos Malês
e do maior mais genial poeta e revolucionário de todos os tempos, Antonio Frederico de Castro
Alves.
Grupos de Poesia Falada são formados e passaram a atuar
nas praças de outros estados como Sergipe, Pernambuco, Rio Grande do Norte,
Pará, Ceará, Paraíba, Minas Gerais, Rio de Janeiro (Passe na Praça que a Poesia te Abraça,
Poesia simplesmente, etc.), São
Paulo, Rio Grande do Sul, enfim, o país todo ganha poetas novos formados na
praça, nos recitais nas ruas, feiras, escolas e bares, poetas que perderam o
medo de falar, de cantar, de criar, de ousar o próprio grito a partir do exemplo
fundamental do Movimento Poetas na Praça.
O
Movimento Poetas na Praça completa 30 anos de presença no imaginário popular na
Bahia e de total descaso por parte das academias e órgãos públicos. Está
prevista para o ano de 2009, de 14 a 21 de março, a realização, depois de 10
anos de lutas, do Festival Latino AfroAbyatalano de Poesia e Literatura (FLAP)
simultaneamente em Salvador, Cachoeira e Camaçari para homenagear esse grande
movimento poético/social/político e seus dez anos de atividade ininterrupta e
para estreitar os laços de amizade entre os povos AbyaYalanos.
10
anos de recitais diários! 30 anos de atividades! Só isso já bastaria para que
sua importância fosse realçada, valorizada, reconhecida e pesquisada por todos
os cientistas da literatura, da política e dos movimentos sociais. Talvez a
partir desse evento se possa começar uma pesquisa capaz de colocar o MPP e seus
integrantes no devido lugar de verdadeiros revolucionários da poesia, da
sociedade e da política. E viva a Individuação Socialista!
Geraldo Maia, co-fundador do Movimento Poetas na
Praça