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A complexidade do mundo. Por Cláudio Guedes

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Claudio_Guedes

O julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o poder das assembleias legislativas estaduais em revogar a prisão e medidas judiciais cautelares impostas a deputados foi suspenso, inconcluso, nesta quinta-feira, 07/12.

Até o momento, por cinco (5) votos a quatro (4), uma maioria relativa se manifestou contrária ao poder das assembleias de revogar as prisões. Mas, por ser o julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), é necessária a definição por maioria absoluta, ou seja, de seis (6) ministros da corte.

A questão é controversa, sem dúvida.

Tenho opinião sobre o assunto. Acho que a Constituição da República é clara: no país todo poder emana do povo e é exercido em nome deste. Como consequência, parlamentares, que são eleitos pelo povo para exercer em seu nome o poder, só podem ser afastados do parlamento – seja federal ou estadual – pelos próprios representantes do povo. É um princípio republicano e democrático.

Um parlamentar, enquanto parlamentar, não pode ser afastado do seu mandato – pelo povo conferido – pelo poder judiciário (juízes não são representantes do povo). Caso denunciado pelo poder judiciário, é preciso autorização da maioria do poder legislativo, ao qual pertence o parlamentar, para o processo continuar, determinar o seu afastamento ou a sua prisão.

Quando uma casa parlamentar age com “espirito de corpo” e nega uma autorização para investigação, afastamento ou prisão, de um parlamentar sobre o qual sobram indícios de participação em crimes, ela está se degradando. A degradação deve ser punida. Mas pelos eleitores, uma vez que os mandatos são provisórios e sujeitos a um processo contínuo de renovação. Sem mandato, o parlamentar acusado de crimes perderá sua imunidade, e acertará suas contas com a justiça.

O princípio da inviolabilidade do mandato parlamentar é correto e evita abusos por parte do poder judiciário sobre representantes do povo. É sempre bom ressaltar que o poder judiciário não é formado apenas por juízes corretos, republicanos e democratas. Muito pelo contrário: muitos juízes são corruptos, autoritários, parciais e partidários. É um perigo à democracia juízes terem o poder de afastar parlamentares eleitos pelo voto popular. É descabido.

Entretanto, nos dias atuais, a justiça no país quer, porque quer, um papel de protagonismo político, estranho à Constituição. Tanto no caso de Aécio Neves X MPF/STF, como no caso dos deputados estaduais cariocas X MPE/TRF-2, as solicitações de afastamento/prisão deveriam ser encaminhadas, antes das medidas cautelares e da ordem de prisão terem sido efetivadas, ao Senado Federal e à Assembléia Legislativa do RJ para as devidas autorizações. É o que se encontra estabelecido tanto na Constituição Federal quanto na Constituição do Estado do Rio de Janeiro. Não o foram. E a reação dos parlamentares juntou cumplicidade (absurda) com indignação republicana (correta). Deu no que deu.

No julgamento de hoje, os ministros Edson Fachin, Rosa Weber, Luiz Fux, Dias Toffoli e Cármen Lúcia (todos indicados por governos petistas) votaram contra o poder das assembleias de revogar as medidas judiciais contra parlamentares. Marco Aurélio Mello, Alexandre de Moraes, Gilmar Mendes e Celso de Mello votaram a favor do poder das assembleias, reconhecendo que tal direito é decorrente do princípio presente, de forma explícita, na Constituição Federal de 1988.

O que isso significa? Apenas que o mundo jurídico é complexo e que sua relação com a política é, muitas vezes, muito mais difícil de ser interpretada do que sonha a vã filosofia comum.

Claudio Guedes é Empresário e Professor

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