Aldeia Nagô
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A faxina não tem limite por Jorge Moreno

13 - 18 minutos de leituraModo Leitura

Como primeiro "blogueiro limpo" do governo, fui recebido, com pompas
e circunstâncias, no palácio residencial do Alvorada, para um jantar. Não tinha
visto ainda o Alvorada depois da reforma. Fiquei embasbacado, ao ponto de a
anfitriã, a presidente Dilma, comentar:



Depois de seis meses e
29 dias contados em pauzinhos, feito calendário de cadeia, o ministro do
Turismo, Pedro Novais, e eu fomos chamados ao Palácio para darmos explicações
sobre nossas saliências.

Como primeiro "blogueiro limpo" do governo, fui recebido, com pompas
e circunstâncias, no palácio residencial do Alvorada, para um jantar. Não tinha
visto ainda o Alvorada depois da reforma. Fiquei embasbacado, ao ponto de a
anfitriã, a presidente Dilma, comentar:

– Você está parecendo a filha pequena do Obama, que disse uma coisa bonita ao
entrar aqui. Ela não disse Palácio, disse casa: "Esta é a casa mais bonita
que já vi na minha vida. Achei lindo!"

Fui fantasiado de repórter: gravador, bloco de papel, iPhone 4 e até caneta.
Pensei: vai que num dia cheio como hoje, em que recebeu e negou-se a receber
tanta gente, a presidente resolve falar. Suei frio só de pensar que ela
quisesse me falar dessa maldita política industrial e, aí, eu tivesse de
trabalhar.

Mas a Dilma estava furiosa era com a Norma Pimentel Amaral.

– Estou detestando a Norma! Não gosto do que ela faz, do seu jeito de agir.

Passei a ter certeza de que, se a Norma Pimentel fosse do Dnit, já tinha sido
afastada.

Aliás, quando eu estava chegando ao Alvorada, recebi um torpedo do diretor de
Redação do GLOBO, Rodolfo Fernandes, assim: "Pergunta até onde vai a
faxina?"

Ora, fui chamado para jantar na intimidade do poder só porque não sou desses
repórteres chatos que querem saber de tudo. Eu só quero comer de tudo. A Dilma
tinha preparado um banquete para mim, e não ficava bem eu incomodá-la. Mas
chefe é chefe, e tive que cumprir a missão

– Presidente, por mim, não tocava nesse assunto chato, mas o Rodolfo Fernandes
me mandou perguntar até onde vai a faxina — perguntei, tremendo de medo.

E ela se derreteu:

– Pois diga que o que ele chama de "faxina" não tem essa coisa de
limite. O limite é mudar o Ministério dos Transportes. É transformar o
Ministério dos Transportes naquilo que é o seu próprio papel: a base da
infraestrutura do país. Mas também é bom que todos saibam que não estamos
agindo politicamente contra um partido. A ação é sobre pessoas que agiram de
forma errada, e nem todas essas pessoas são de um mesmo partido. Isso precisa
ser esclarecido.

Quando eu ia aprofundar o assunto, a presidente foi salva pelo gongo, com a
chegada de uma convidada especial do jantar:

– Eu pedi para a ministra Helena Chagas não te avisar que teríamos a presença
da sua nova musa: a ministra Gleisi Hoffmann.

E eu, já gaguejando de emoção:

– Eu fui o primeiro a dizer que ela seria ministra, e meus seguidores do
Twitter brincaram que a senhora aceitou minha sugestão.

E a presidente:

– Pode espalhar que você que indicou. Eu deixo. E terás tomado uma das melhores
decisões da tua vida.

Depois disso, nem foi mais preciso eu perguntar se ela chamava a ministra de
"a Dilma da Dilma".

Eis os principais trechos da nossa conversa:

Solidão do poder

Com um governo tão agitado, Dilma diz ainda não ter experimentado a chamada
solidão do poder:

– Passei a conviver, isto sim, com a decisão solitária. Presidente da República
tem que decidir e ser responsável pela decisão. É o momento grave, importante,
que eu tenho comigo mesma. Posso ouvir e ouço, mas a decisão é minha. Essa é a
maior responsabilidade do presidente da República: saber decidir.

– E, nessa hora sagrada, a senhora não pensa, por exemplo, o que fariam seus
antecessores diante de situação semelhante? Sendo mais direto, a senhora não
pensa se a sua decisão vai agradar ao Lula ou não?

– Olha, a responsabilidade é tão grande que a gente não pensa em agradar ou
desagradar. A gente só pensa em tomar a decisão mais justa, mais correta. A
responsabilidade é do presidente da República perante a nação. A
responsabilidade do presidente da República é intransferível. Não dá para
pensar em ninguém.

Amizade com FH

Eu não ia entrar neste tema, mas foi a própria presidente que invadiu primeiro
a minha intimidade.

– Você tem que se definir entre a Mariana Ximenes e a Manuela D’Ávila – cobrou
ela, sobre um assunto que falo mais adiante.

Foi a deixa para eu entrar no tema preferido do colunista Nelson Motta:

– A senhora vive o mesmo dilema. Eu soube que o Lula cobra muito da senhora
esta sua amizade com FH.

Dilma reage no lance, quase pulando da cadeira:

– Não é verdade! Isso não é verdade! O presidente Lula nunca tratou desse tema
comigo, nem em brincadeira!

– Diretamente, não. Mas ele já se queixou para terceiros na sua frente.

Diante do fato, a confissão inevitável, e às gargalhadas:

– Meu Deus! Como esse Sérgio Cabral é fofoqueiro! Ah, ele me paga! Pode
escrever, ele me paga!

E já como ré confessa:

– Realmente, o presidente Fernando Henrique é uma pessoa muito civilizada,
muito gentil. É uma conversa muito agradável. Tem gente que fica estarrecida
com essa convivência, já que temos pensamentos políticos diferentes. Exatamente
por isso é que as pessoas devem conversar. O governante, o político, não pode
ficar limitado ao pensamento do seu grupo. Eu defendo a convivência dos
contrários. Há pessoas muito agradáveis e inteligentes no governo e na
oposição. Acho que, não só pelo prazer da boa prosa, mas, como presidente da
República, tenho o dever de conversar com os diversos pensamentos da sociedade.
Eu não sou presidente de um partido ou de uma coligação partidária, eu sou
presidente da República.

E eu insistindo:

– Mas o PT não fica com ciúmes do FH?

– O PT já tá bem grandinho para não ter ciúmes de ninguém. Ciúme é um
sentimento juvenil, eu acho.

Tento mais uma investida, já na saída do encontro:

– FH diz ter muitas saudades da piscina daqui. Quando ele era presidente,
trouxe Lula aqui. Deixa ele tomar banho na piscina daqui, presidente!

E a presidente, toda faceira, fazendo-se de desentendida:

– Mas neste frio?

Pronto, FH, bem que tentei te ajudar, mas não consegui.

Moda & musa

Dilma quis saber tudo sobre Mariana Ximenes. O gancho foi fácil, mas quase
provoca uma briga entre as mulheres: os meus sapatos. Em resposta aos elogios,
informei:

– Presente da Mariana Ximenes. Ela pediu para eu usá-los neste jantar.

– Lindos – comentou a ministra Helena Chagas.

– Ferragamo – identificou Gleisi.

Respondi:

– Caríssimos!

Helena balança a cabeça de vergonha com a minha indiscrição.

Aí, começou a confusão. A Helena Chagas estranhou um sapato com furos, mas sem
cadarço. A presidente zombou:

– Helena, está na moda esse tipo de sapatos. Eu já vi vários assim, não tão
lindos como estes. É chique: sapatos de cadarços sem cadarços.

Política e apoio

A presidente quis saber a diferença de idade entre a Mariana e a Manuela. Chocou-se
ao saber que tinham a mesma idade: 30 anos.

– Gente, eu conheci a Manuela menina. As duas não parecem ter essa idade.

Fiz o comercial da Manu:

– E agora a senhora vai vê-la prefeita de Porto Alegre, se o PT deixar.

– Mas o Tarso Genro me garantiu que vai apoiá-la!

(Ah, se o jornal cortar esta parte!)

Fidelidade a Lula

A presidente sabe a data exata em que ela e Lula passaram a conviver com mais
intimidade.

– O curioso é que ele falava com todo mundo, menos comigo. Não me dava a menor
pista de que eu era a escolhida. Hoje nós nos entendemos só com olhar. Não há
como tentar nos separar.

Mesmo assim, eu tento:

– O Lula tá agora em campanha pelo Nordeste. Campanha para quem?

A presidente rebate:

– Lula nasceu no meio do povo. Não imagino o Lula trancado num escritório. Ele
é da rua, das praças. Adoro vê-lo beijando as pessoas nas ruas, fazendo um
afago na dona Canô e fazendo a festa no Nordeste.

Os mais queridos

Dilma sobre governadores:

– Tenho uma boa convivência com todos eles, inclusive com os da oposição. Gosto
muito, mas gosto muito do Anastasia, por exemplo. E o Téo Vilela, o que é
aquilo? Que simpatia, todo manhoso. É difícil não o atender! Eu adoro o Eduardo
Campos, adoro a mulher dele, dona Renata. Eu só chamo assim porque o Eduardo
Campos só chama ela de "dona Renata". Ah, deixa eu falar do Jaques
Wagner. Meu Deus! Se eu me esquecer do Jaques Wagner, não volto à Bahia.

Mas o destaque vem mesmo para os meninos do Rio:

– Confesso que, no governo Lula, eu tinha um pouco de ciúmes com o Cabral.
Agora deveria ocorrer o inverso: o Lula ter ciúmes do Cabral. Só que Lula
também adora o Cabral. Pezão, nem se fala. Pezão é companheiro que todo
governante gostaria de ter por perto… – e desanda a falar do vice-governador,
chamando-o de "o leão da montanha", por tê-lo visto trabalhando como
louco na tragédia da Serra.

Brinco que, em vez de ciúmes, Maria Lúcia, a mulher de Pezão, fica toda
orgulhosa dessa relação. E ela:

– A Maria Lúcia é um doce de pessoa. Ela sabe, e eu já disse isso pro Pezão,
que o marido dela não tem olhos para mim, só para o dinheiro do governo. O
Pezão não sabe a cor dos meus olhos. Ele parece a história do Tio Patinhas, que
no lugar dos olhos da pessoa só via duas moedas. Ele só sabe pedir e pedir
dinheiro.

Injustiça a um
brasileiro.

Dilma fala com o coração:

– Uma das coisas mais tristes da política é a ingratidão. O exemplo maior é
Ulysses Guimarães. Devemos ao esforço dele, à luta dele, o fato de estarmos
hoje numa democracia. É muito triste o que fizeram com ele.

Foi aí que fiz a minha primeira provocação contra o principal aliado, o PMDB:

– Fizeram isso com ele e farão com a senhora. Aliás, já fizeram: tiraram a
senhora e ele do programa de TV. Eu disse ao seu vice que o doutor Ulysses,
nesse veto, estava em boa companhia.

E a presidente, tampando a boca como se estivesse surpresa e docemente
constrangida:

– Você falou isso para o vice-presidente?

A presidente disse que os ensinamentos políticos de Ulysses Guimarães nunca
perderão a atualidade. E lembrou uma de suas famosas frases:

"O corrupto suja a denúncia que faz. Quando aponta o erro, não quer
justiça, quer cúmplice."

Fã de Chico e Mônica
Salmaso, Dilma não tolera ‘gângster’ Cortez

A Dilma é feito o padre Jorjão e o Artur Xexéo. Finge que não vê novelas.
Informa que só consegue ver "Insensato coração" no sábado. Mas
apareceu para o jantar reclamando:

– O problema de "Insensato coração" é que morre gente demais. E eu
não gosto da personagem da Glória Pires, o que mostra o seu grande talento de
atriz. Não gosto desse comportamento da Norma. Eu gosto da Natalie.

E a ministra Helena, toda alegre:

– Dela com o Cortez? Eu adoro ela com o Cortez.

Dilma responde:

– Que Cortez! Eu não tolero esse gângster. O Cortez é um gângster. Tem que
ficar na cadeia! Eu falo é da Natalie e do irmão, o Douglas. Agora ricos, não
perderam os laços com a inocência e a pureza. Douglas faz o papel de burro, mas
consegue passar a imagem de uma pessoa inteligente, pela ternura do personagem.
O verdadeiro burro é aquele que se acha inteligente sem ser e acha que consegue
enganar os outros. Desses burros, quero distância.

E prossegue:

– Eu sou noveleira, sim, mas saudosista. Tenho saudades do Sinhozinho Malta e
do "Casarão". Graças a Deus que surgiu o canal Viva. Fico ligada
nele. Mas, com a autoridade de uma grande noveleira, eu digo: não tem para
ninguém. A melhor autora de novela é a Glória Perez. Novela é folhetim. A
Glória é a autora que mais entende e conhece o gosto do brasileiro. Eu sou
presidente do fã-clube da Glória Perez.

Programa
preferido

A presidente revela o que mais gosta de ver na televisão atualmente:

– Graças ao canal Viva, posso rever o "Sai de baixo". Por que um
programa bom desses acaba? Não consigo entender. A Marisa Orth é uma das
melhores atrizes que conheço. Consegue fazer humor de primeira, sem rir. Isso é
fantástico. O Falabella, sim, não consegue esconder o riso dos textos que
escreve. O Falabella é um ator e autor genial.

Mas não deixa de falar de seus ídolos:

– Como brasileira, sinto o maior orgulho de termos a Fernanda Montenegro. Na
primeira vez em que a vi, fiquei muito nervosa, disfarcei ao máximo. Eu acho
que sempre me sentirei nervosa diante da Fernanda Montenegro.

Ídolos

Em plena crise do Palocci, Dilma recebeu um vídeo dos festivais da TV Record e
se lembrou dos seus ídolos:

– Gente, eu vi Marília Medalha, novinha, o Sérgio Ricardo jogando o violão.
Revi esse lance e percebi que o próprio Sérgio Ricardo, depois, fica
arrependido do gesto. O Chico, menino, já era essa gracinha. O Chico realmente
povoa até hoje a fantasia de toda a nossa geração e da atual, você não acha?

– Presidente, eu gosto só da obra do citado – respondo.

E a ministra Helena:

– Toda mulher tem o direito sagrado de ter fantasias com o Chico.

Aí quem balança a cabeça sou eu, mas sou logo derrotado pela Gleisi e pela
presidente. Dilma confirma:

– Nossa, o Chico é o máximo. A família Buarque de Hollanda tem uma marca
curiosa no frontal do rosto. Não toda, mas a maioria. Um detalhe que vem da
testa, dos olhos e do nariz. A nossa ministra Ana de Hollanda tem bem esse
traço do Chico.

E, voltando ao festival, falou com admiração de Caetano, Gil e de outros que
fizeram nome na música brasileira.

– Bom, Gil é de casa. Somos amigos. Mas eu tenho uma curiosidade muito grande
de conversar com o Caetano. Ele é muito culto, inteligente. Deve ser um papo
encantador, doce, envolvente.

Mas, na música, neste momento, não há lugar para ninguém nos ouvidos da
presidente. Errei, quase ninguém: a Dilma continua fiel à Cássia Eller e à
Fernanda Takai. Mas a paixão da hora é uma só: Mônica Salmaso.

– No Twitter, onde falo toda hora com a senhora, botei uma música dela para
conheceres, e aquele ministro Orlando Silva, um estraga-prazeres, retwittou
dizendo que a senhora já tinha ouvido a Mônica no Congresso do PCdoB.

A resposta bem-humorada de Dilma:

– Que "aquele" ministro Orlando Silva não saiba, mas não foi no
congresso do PCdoB que eu conheci a Mônica Salmaso. Ouço a Mônica desde o primeiro
CD dela. Ela é perfeita. É incrível. Curioso é que a gente gosta dela de
primeira. Tenho o maior respeito e admiração por todas as nossas grandes
intérpretes, mas a Mônica é demais.

Presidente fala sobre Blairo e também de Aécio

A presidente Dilma citou poucos políticos no jantar. Deu um destaque especial
ao senador Blairo Maggi, com este exemplo:

– Dizem que o Blairo conseguiu reverter lá fora a fama de bicho-papão do
meio-ambiente. Eu acrescento: aqui dentro também. Isso não foi fácil. Você sabe
que o Minc é a pessoa mais difícil do mundo. Pois o Minc conseguiu conviver em
perfeita harmonia com o Blairo, sem abrir mão das suas convicções. A história
da chegada da família dele a Mato Grosso é muito interessante…

– Quando o Lula, depois de ver as fazendas do primo, da irmã e do tio comentou
que era o mais bem-sucedido programa de agricultura familiar?

– Não foi nessa. Isso é bem Lula. O Lula tem cada tirada.

A presidente, finalmente, acabou citando o nome do mais provável adversário do
PT em 2014, Aécio Neves:

– No velório de Itamar, fiquei preocupada com o Aécio. Estava pálido. Ele não
deveria ter ido. Ele quase morreu naquela queda (de cavalo), sabia? Escapou por
milagre. Coitadinho, teve de tomar morfina. Esse acidente do Aécio me deixou
triste. Graças a Deus, ele já está recuperado. Já voltou até a fazer discurso
contra meu governo.

Perguntei se o núcleo doce do governo se reúne à noite para fofocar, jogar
cartas ou falar mal dos homens. E Dilma:

— Se a gente se reunir para se divertir, a gente acaba só falando de trabalho.
Não dá para, por exemplo, botar nós três aqui com a Ideli e a Miriam. Acaba em
trabalho. A gente mal tem tempo de se arrumar.

— Mas a ministra Helena, toda a vez que a senhora demite alguém, vai pro salão
arrumar os cachos. Ela adora confirmar demissão bem arrumada.

Ontem, numa roda de ministros, Dilma avisou:

– Prestem atenção nos cabelos da Helena. Se estiverem cacheados, algum ministro
caiu.

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