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Antonio Torres, o escritor e seu ofício por Luis Nassif

3 - 4 minutos de leituraModo Leitura

O grande escritor é ele e seu ofício solitário, ele com ele. Não ambiciona riqueza ou poder. Sua ambição é o reconhecimento dos leitores e dos iguais, os demais escritores.


Muitos
escrevem pensando apenas no reconhecimento posterior; outros ambicionam o
reconhecimento imediato. Mas seu mote, sua seiva vital é o
reconhecimento de seus pares.

Um
grande escritor não nasce, é construído ao longo de décadas e de
livros, de personagens que cria, de tramas que tece, de sentimentos que
explora, na solidão intermitente de seu quarto, raras vezes nos salões
dos poderosos. Explora novas formas de conhecimento, a atualização
permanente da leitura e da análise de pessoas e circunstâncias.

Não
busca a popularidade fácil dos jornalistas, a exploração do factual, do
imediato, o atendimento da catarse dos leitores. O grande escritor
ambiciona a eternidade. Para os de família quatrocentona, a eternidade
pode ser um mausoléu no Cemitério da Consolidação; para os muitos ricos
letrados, uma fundação que leve seu nome; para o provincianismo
brasileiro, um nome de rua.

Para o grande escritor, deveria ser a Academia Brasileira de Letras (ABL). Mas não é.

A
ABL, a casa de Machado de Assis, que deveria ser a guardiã implacável
dos valores da literatura, a defensora intransigente da meritocracia, a
defensora dos escritores, o selo de qualidade, o passaporte final para a
posteridade, é uma casa menor, em alguns momentos parecendo mais uma
cloaca de fazenda do que um lugar de luzes e de letras.

Ao
preterir o escritor Antônio Torres em favor do jornalista Merval
Pereira, a ABL demonstrou a pequenez não propriamente dela, mas de uma
certa elite superficial brasileira, provinciana, atrasada.

De
pouco adiantou o fato de que os livros de Torres ajudaram o Brasil a
ser mais conhecido por leitores da Itália, Argentina, México, Estados
Unidos, Alemanha, Inglaterra, Portugal, Bélgica, Holanda, Israel,
Bulgária. Ou o fato de dois livros seus – Um táxi para Viena D’Áustria e
Essa Terra – traduzidos na França, terem levado o governo francês, em
1999, a lhe conferir o título de "Cavaleiro das Artes e das Letras".

Merval
tem a visibilidade e o poder proporcionados pela Rede Globo. Tem moeda
de troca – o espaço na Globo, podendo abastecer o ego de seus pares e as
demandas da ABL. Poderia até ganhar prêmios jornalísticos, jamais a
maior condecoração da literatura brasileira.

Tem
apenas dois livros, um de 1979, feito a quatro mãos, outro mais
recente, mera compilação de artigos que escreve para o jornal "O Globo".

Mas
representa poder – no caso, a mídia -, assim como, em outros tempos, o
poder era o general Lyra Tavares, Getúlio Vargas, Roberto Marinho, ao
quais também se curvou a ABL.

De
Merval, duas declarações de endosso. Da indescritível Nelida Piñon,
enaltecendo seu… cavalheirismo. E a informação de que, dos acadêmicos,
conhece apenas João Ubaldo Ribeiro – colunista de "O Globo".

Nos
grandes jornais, nenhuma crítica. Inúmeros colunistas tiveram cócegas
nos dedos, para denunciar o ridículo. Mas o corporativismo falou mais
alto.

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