Aldeia Nagô
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As verdades do Plano Real por Emiliano José

6 - 8 minutos de leituraModo Leitura

As
celebrações sempre devem ser olhadas com algum ceticismo. Diria olhadas à
Gramsci, com o pessimismo da inteligência. Assim devemos fazê-lo com o Plano
Real, cantado em prosa e verso nos últimos dias por prosadores e versejadores
tucanos. Vamos começar pelo que é real, sem trocadilhar. Não é possível, nem
justo que neguemos a capacidade do Plano Real de controlar a hiperinflação






Este foi o grande mérito, inegável mérito do plano. E isso não é pouca coisa
para um país que vivia mergulhado, atormentado pelo furacão inflacionário. 

Será, no entanto, que desde o marco inaugural do Plano Real, há coisa de 15
anos atrás, a economia brasileira navegou em mares calmos, infensa a
tempestades, imunes aos furacões da economia mundial, como cantam as vozes
tucanas? Já dissemos do mérito, agora vamos ao outro lado do real, da
realidade. Poderia, como gosto sempre, de voltar a Paulinho da Viola – "ta
legal, eu aceito o argumento, mas não me altere o samba tanto assim." FHC,
longe do que divulga, não estabilizou a economia brasileira. Vou tentar buscar
um autor que não provoque suspeitas. 

O governo de FHC "não ficará na história como o grande governo que poderia ter
sido porque deixou a desejar no plano gerencial, como a crise da energia de
2001 demonstrou, e principalmente porque fracassou no plano econômico. Não
apenas porque não logrou retomar o desenvolvimento: não chegou sequer a
estabilizar macroeconomicamente o país, de forma que deixou uma herança pesada
para o futuro governo." O autor da frase é ninguém menos que Bresser Pereira
(para quem quiser consultar: Desenvolvimento e Crise no Brasil, do próprio
Bresser Pereira, Editora 34, p. 335/336). 

No já distante ano de 1995, Luiz Nassif fazia soar o sinal de alerta sobre as
conseqüências óbvias do Plano Real: empresas pequenas e médias fechariam
provocando desemprego, grandes empresas reduziriam a produção, aumentando
também o desemprego, grandes bancos continuariam realizando grandes lucros
através da especulação financeira. Esses grandes lucros seriam bancados pelo
Estado e provocariam um grande aumento da dívida interna. E ele sustentava,
ainda, que a sustentação de semelhantes políticas requeria uma imprensa
monopolista e comprometida com a ideologia neoliberal. Tudo confirmado,
confirmadíssimo. (para consulta: Os cabeças de planilha, Ediouro, p. 218/219,
de Luiz Nassif). Voltemos a Nassif, apenas para reiterar o discurso dele sobre
a mídia: 

"Esse discurso" – o da ideologia neoliberal – "tinha começado a ser preparado
muitos anos antes. E a existência de uma mídia altamente concentrada facilitou
a propagação do discurso único. Quando Fernando Henrique abriu mão de qualquer
tentativa de reverter a vulnerabilidade externa da economia, o país voltou ao
ciclo pós-Campos Sales, do início do século (XX), tornando um refém da
ideologia da internacionalização financeira." 

Bresser Pereira atribui isso que ele chama de retrocesso de FHC à hegemonia do
pensamento conservador no interior da aliança que dava sustentação ao
presidente tucano. "O aumento da influência dos grupos liberal-conservadores, facilitada
pela ausência dos trabalhadores, levou amplos setores do governo a aceitar a
ideologia globalista do fim do Estado Nação." A citação é do livro já citado,
p. 397. 

A única dúvida minha em relação tanto a Bresser Pereira como a Luiz Nassif é
sobre se de fato FHC tinha originalmente algum pensamento que envolvesse
soberania nacional. Como sinceridade, não creio. Acho que o projeto tucano era
consistente e incluía uma integração subordinada à globalização em andamento,
uma submissão do Estado brasileiro aos centros do capitalismo internacional.
Pensamento que perdura até os dias de hoje, e a iniciativa da CPI da Petrobrás
está dentro do contexto desse pensamento nos dias atuais, sem que eu pretenda
tratar disso nesse texto para fugir do assunto. 

Em tudo, passado algum tempo, é bom fazer um balanço. Sereno, se possível. Ou,
ao menos, fundado em números, que sempre ajudam a afastar emoções exacerbadas.
Vamos analisar como estava a situação do País quando o presidente Lula estava
prestes a assumir a presidência da República pela primeira vez. Em 2002, a
inflação foi de 12,5%. Não era hiperinflação, reconheçamos, mas não era
civilizada. O risco país girava em torno dos 2400 pontos, índice hoje pelo
menos dez vezes abaixo. Está atualmente em torno dos 240 pontos. A taxa Selic
dos juros básicos era de 25%. O crescimento do PIB era o menor da série
histórica.
Vamos olhar um pouquinho a evolução da dívida pública mobiliária. Em 1994 era
de R$ 76 bilhões. Em 2002, de R$ 623 bilhões. E isso apesar do discurso privatista
neoliberal, que prometia que com a venda das estatais, um dos crimes graves do
FHC, a dívida pública seria substancialmente reduzida. A dívida, no entanto,
foi multiplicada por 10. E as estatais, as muitas que foram privatizadas, foram
entregues na bacia das almas a preço de banana. 

Foi essa política que levou o Brasil, sob o tucanato, a recorrer ao FMI por
três vezes, e sempre sendo obrigado a aceitar condições draconianas,
especialmente a obrigação de adotar políticas recessivas, que foi cumprida
religiosamente. Essa característica política de FHC ninguém pode subtrair: a
absoluta submissão às ordens dos centros do capitalismo internacional, seja de
seus países, seja de suas agências, como o FMI.
Primeiro, houve um empréstimo de US$ 41 bilhões, tomado ao FMI, ao Banco
Mundial de ao BIS na base do Deus-nos-acuda, quando da crise da Rússia, em
1998. Em 2001, novamente o País se ajoelha desesperado no altar do FMI, e
consegue mais US$ 15 bilhões. E, em 2002, mais um empréstimo de US$ 30 bilhões
e, neste caso, dada à erosão da credibilidade de FHC, o FMI pediu que o
empréstimo fosse avalizado pelos três principais candidatos a presidente da
República de então. E FHC, constrangido, teve que aceitar essa
humilhação. 

Quando dizíamos, nós do PT, que sob o tucanato havíamos nos aproximado da
situação Argentina, que à época declarara moratória depois de oito anos de
governo Menen, não estávamos exagerando ou envolvidos em quaisquer tentações
panfletárias. O neoliberalismo lá fora mortal. Aqui, faltou pouco, muito pouco
mesmo. 

A estabilização da economia brasileira, diferente do que apregoa o tucanato,
foi obra do governo Lula. A inflação foi controlada. O crescimento, retomado. A
dívida externa, eliminada como problema. A dívida interna teve uma redução
substancial e criou-se uma reserva cambial superior a US$ 200 bilhões, que
permite hoje ao país enfrentar de modo muito mais seguro a crise financeira
internacional. 

A exploração do petróleo da camada do pré-sal certamente nos colocará em outro
patamar, nos colocando em pé de igualdade com as principais economias do mundo.
E por isso, insista-se, o tucanato está agredindo a Petrobrás. Se pudéssemos
brincar com assunto sério, diríamos que inveja mata. O tucanato e as outras
correntes de oposição, ao lado da corrente majoritária da imprensa brasileira,
não suportam a idéia da soberania, da auto-afirmação do Brasil. E menos ainda
que um metalúrgico possa realizar o governo que mais favoreceu o povo
brasileiro, que mais afirmou a nação. As elites se mordem de raiva.

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