Balaio de Ideias: Pelo veto ao texto final do Estatuto po Luiz Alberto
O tortuoso
percurso legislativo do Estatuto da Igualdade Racial começou em 7 de
junho de
2000. O Projeto de Lei 3198/2000 foi uma articulação dos diversos
setores do
movimento negro brasileiro. Este texto amplamente discutido com a
população
negra tratava, por exemplo, de questões como reparação, saúde da
população
negra, direitos das comunidades remanescentes dos quilombos, cotas para
negros e
negras nas universidades e repartições públicas.
O
Estatuto em sua versão original seria um conjunto legítimo de proposições
legislativas que levaria a população negra brasileira à inclusão social. Na
prática, seria a verdadeira igualdade de direitos pela qual lutamos desde os
tempos de Zumbi dos Palmares. Mas, infelizmente fomos derrotados pelas forças
conservadoras do Senado Federal com a aprovação de um texto esfarelado e
esvaziado. O Brasil acaba de perder a oportunidade de construir a verdadeira
democracia racial.
O
Estatuto esfarelado é tão pernicioso quanto a Abolição sem reparação. O que
assistimos no Senado foi um jogo de forças e acordos que unicamente defendiam os
interesses da elite desse país – super representada no Congresso Nacional. Eles
comemoram, conseguiram esmigalhar o Estatuto e provar que não temos força
política para aprovar o conjunto de leis, tais como: a luta pelo direito a terra
e às ações afirmativas – que ao longo da história nos foi negado.
Continuam
eles, enfim, legislando por nós.
A
bancada "demo-tucana" que ataca todas as políticas do governo Lula direcionadas
para a população negra elaborou a versão final apresentada pelo senador
Demóstenes Torres (DEM/GO) que vai contra tudo o que estava como premissa na
versão proposta em 2000 recentemente revisada pela Câmara
Federal.
Foram
retiradas questões importantes referentes a saúde da população negra, às cotas
nas universidades, em partidos políticos e no serviço público e as ações em prol
das comunidades quilombolas foram de tal forma modificadas que na prática
inviabiliza a aplicação do preceito constitucional (art. 68 do ADCT) – que versa
sobre os direitos territoriais do povo quilombola. O artigo proposto
inicialmente, que dava garantias aos territórios quilombolas e previa
regularização das terras, foi um dos pontos mais questionados pelos ruralistas
e foi retirado após acordos.
Atuei
juntamente com organizações do movimento negro contra este texto final e estou
certo de que o presidente Lula irá manter a coerência com as políticas de seu
governo voltadas para a população negra, especialmente aquelas direcionadas às
comunidades quilombolas desse país – que têm sofrido violentos ataques de
fazendeiros-, e irá vetar a proposta apresentada pelo Senado Federal. O texto
aprovado não beneficia a população negra, pelo contrário, fortalece os processos
contra as cotas nas universidades e contra o Decreto 4887/03 que tramita no
Supremo Tribunal Federal (STF).
É
válido lembrar que esse partido – o DEM – que sugeriu o questionado texto do
Estatuto, aprovado, é o mesmo autor da ADIN (Ação Direta de
Inconstitucionalidade) contrária ao Decreto 4887 – que versa sobre a titulação
de terras quilombolas – e da ADPF (Argüição de Descumprimento de Preceito
Fundamental) contra as cotas para negros e negras nas
universidades.
O
movimento negro brasileiro, em seus diferenciados setores, está decepcionado com
a proposta final do Estatuto. Foram anos de articulação e mobilização para
garantir um resultado insatisfatório e distante do que sonhamos e acreditamos
enquanto política e garantia de direitos para a população negra brasileira. Foi
um verdadeiro golpe em nossas conquistas e uma recusa aos nossos
direitos.
Luiz Alberto é
deputado federal pelo PT-BA