Carta aberta a um bando de prevaricadores. Por Francisco Costa
(Art. 319 “Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício, ou praticá-lo contra disposição expressa de Lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal.”). Senhores Procuradores do Ministério Público Federal brasileiro
Antes de me ater ao motivo que me trouxe à esta missiva, aberta e pública, quero deixar claro que não me dirijo ou referencio a todos os Procuradores, mas aos que defino como bando, no título da matéria, os prevaricadores.
Para que entendam a minha motivação, partamos de uma situação utópica, hipotética, o que não deve soar estranho aos senhores, já que convicções pessoais ou de grupos têm sido usadas como provas materiais, factuais ou documentais, em entrevistas coletivas, com cobertura televisiva e uso de Power Point, o que em si e de per si caracteriza um ato de prevaricação, ao incriminar publicamente, fora e acima dos autos, em notório interesse político-partidário.
Mas vamos ao hipotético exemplo: imaginem os senhores que sobre mim pairassem dúvidas de ser narcotraficante, e que em uma operação da Polícia Rodoviária Federal, um automóvel de minha propriedade fosse flagrado transportando quase meia tonelada de pasta de cocaína, sendo conduzido por um funcionário meu, e que, posteriormente, numa conversa telefônica, gravada com ordem judicial, legalmente, entre mim e um amigo, sobre o qual também pairassem desconfianças e indícios de ser narcotraficante, em determinado momento eu afirmasse “não faço nada de errado, eu só trafico drogas”. O que faltaria para que os senhores oferecessem denúncia ou pelo menos iniciassem uma investigação em regime de urgência, dada a gravidade dos fatos e o risco que eu estaria oferecendo à sociedade?
Agora substituam o automóvel por um helicóptero, a Polícia Rodoviária Federal por Polícia Federal, e a mim por José Perrella de Oliveira Costa e já não estaremos mais no campo do exemplo e da hipótese, mas da realidade, conforme amplamente divulgado pela mídia, que reproduziu a gravação ad nauseam.
O que falta para o oferecimento de denúncia ao Superior Tribunal Federal – STF, uma vez que o cidadão citado tem foro privilegiado, por ser Senador da República?
Passemos agora a outro caso: no dia de ontem o Ministério Público Federal apresentou denúncia contra o ex-Presidente Luis Inácio Lula da Silva, pedindo prisão em regime fechado e pagamento de multa de mais de oitenta e sete milhões de reais.
Isto deve ser tão levado a sério que a própria mídia não está dando o devido destaque ao fato.
Vejamos: há documentos, em poder do Juiz que cuida do processo e com cópias nos autos, que inocentam o acusado. Das oitenta e sete testemunhas que prestaram depoimentos, entre as de acusação e as de defesa, oitenta e sete inocentaram o réu. O próprio Juiz já afirmou não haver provas contra o réu. Os senhores sabem que este é mais um factóide que dará em nada, como os anteriores. In dúbio pro reo, cadê as provas? Só convicções?
Esclareço que réu não da Justiça, mas dos senhores, ou de uma parte dos senhores.
Salta aos olhos mais atentos como tudo aconteceu, de maneira atípica, contrariando o procedimento já usual e consagrado no Ministério Público do Paraná, com vazamentos públicos seletivos, incriminando, declarações públicas bombásticas, coletivas à imprensa… Municiando as ilações e boatarias, uma tática política e não um procedimento jurídico.
Desta vez fizeram em surdina e rápido, como sempre deveria ter sido feito, para caracterizar a independência, a isenção e a imparcialidade, o mínimo a se exigir do Ministério Público, uma instituição apartidária, em tese.
Mais surpresa me causou o momento em que aconteceu a denúncia, como se plantada, justo quando o presidente do maior partido de oposição a Lula foi denunciado pela oitava vez, ao STF, e com pedido de prisão, justo no momento em que um emissário do Presidente da República foi flagrado com uma mala contendo vultosa propina, dada por quem se reuniu com o Presidente em sua casa, clandestinamente, já quase de madrugada.
O que pretendeu o Ministério Público do Paraná, ao denunciar Lula neste momento, quando poderia tê-lo feito antes ou deixar para fazer daqui a alguns dias, criar uma cortina de fumaça, irrelevando a gravidade dos atos praticados pelo governo federal e o presidente do maior partido de apoio a esse governo, ou equilibrar os pratos da balança da justiça, passando a ideia de que os dois lados se equivalem, são iguais?
Ao ter comportamento de omissão, em relação ao Senador Perrela, o Ministério Público deixou de praticar ato de ofício; ao denunciar o ex-Presidente Lula, de forma inadequada e em momento inadequado, o fizeram para “satisfazer interesse ou sentimento pessoal”, o que, nos dois casos, de maneira clara, concreta e insofismável caracteriza o crime de prevaricação, conforme o Art. 159.
O Ministério Público brasileiro, ou parte dele, não pode continuar funcionando como se diretório político de um segmento ideológico.
Quero continuar, preciso continuar, como de resto, todo o povo brasileiro, a acreditar e confiar no Ministério Público, oneroso e sustentado pelo cidadão contribuinte, o que passa pela reavaliação do comportamento de parte dos seus membros, de maneira a que se redirecione à imparcialidade e à isenção, conforme determina a nossa Constituição.
Atenciosa e preocupadamente
Francisco Costa é Professor