Aldeia Nagô
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Carta Aberta ao Sr. Julio Cesar Mesquita por Eugênio Neves e Claudia Cardoso

5 - 6 minutos de leituraModo Leitura

Prezado Sr. Julio César Mesquita,
tivemos o desprazer de ler a nota da ANJ assinada pelo senhor. É difícil
dizer, se ela é mais cretina, ou mais patética.


Iniciemos pela questão semântica: o senhor acusa a Petrobras de atitude
antiética e esquiva. Bem, no nosso modesto entendimento, atitude antiética é
a de quem falta com a ética, o que não parece ser o caso da Petrobras por,
simplesmente, ter tornado público um tema que é, naturalmente, da esfera
pública. Se o senhor não sabe, esclarecemos: a Petrobras é uma empresa mista,
mas o Estado é o acionista majoritário. Assim, todo o cidadão brasileiro tem
o direito de ter acesso a todas as informações que dizem respeito a esta
empresa, venham elas de onde vierem.

E esquiva? Esquiva é atitude de quem se esconde ou esconde alguma coisa. O
que também não é o caso da Petrobras, quando publiciza perguntas que lhe
foram feitas a título de entrevista, o que indica uma ação a se tornar
pública. Qual seria o sentido desta ou de qualquer entrevista para um jornal,
se seu conteúdo não viesse a se tornar público?

Segue a nota: Numa canhestra tentativa de intimidar jornais e jornalistas, a
empresa criou um blog. Onde se configura essa canhestra tentativa de
intimidação? Desde quando divulgar informações de interesse público é uma
atitude canhestra ou intimidatória? Omitir, sim, é canhestro. A criação de um
blog é um direito de qualquer pessoa ou instituição. É uma ferramenta pública
disponível na Internet e está acessível a qualquer um que deseje usá-la. E o
blog da Petrobras foi criado, justamente, para publicar as omissões que os
jornais, a quem o senhor representa, costumam praticar, sistematicamente, em
relação a qualquer assunto e, agora, em particular, a Petrobras. Então, quem
age de forma esquiva e canhestra?

Com relação à inaceitável quebra da confidencialidade que deve orientar a
relação entre jornalistas e suas fontes. Como assim??? Parece-nos que a maior
preocupação, nesse sentido, deveria ser da fonte e não do jornal!!! Quem
corre o risco maior é sempre quem passa a informação! E podemos acrescentar,
aí também, a questão da confiabilidade. Essa é uma relação de mão dupla. Quem
informa tem a garantia de que a informação não será manipulada de acordo com
interesses dessa ou daquela empresa de mídia? O senhor como Vice-Presidente
da ANJ deveria saber o quanto esse risco é grande. Tanto é assim, que a
Petrobras precisou criar um blog para publicar, na íntegra, as informações
que os próprios jornais solicitaram e mutilaram.

"[…] as perguntas enviadas à sua assessoria de imprensa pelos
jornalistas antes mesmo de publicadas as matérias às quais se referem".
Para quem conhece a mídia brasileira, fica fácil de entender o porquê dessa
atitude da Petrobras. Ela, simplesmente, quis se resguardar dessas
costumeiras omissões e manipulações que os jornais fizeram sobre as
informações que esta empresa encaminhou. E sobre o "processo no caso de
suas informações não receberem um "tratamento adequado"", é um
direito inalienável da fonte e não tem nada a ver com intimidação.(O senhor
já esqueceu do "dossiê" da Dilma?) Tem a ver, sim, com praticar
jornalismo de verdade, factual. A fonte declarou X e o jornal publica X e não
Y. Nessa equação, não há espaços para processos. Simples!!!

"Princípios universais de liberdade de imprensa". Na opinião de
Vice-Presidente da ANJ, quais são exatamente esses princípios? Vamos lhe dar
o benefício da dúvida: talvez, o senhor tenha confundido liberdade de
imprensa com liberdade de empresa. Para ser mais claro, se o senhor não
entendeu: confundiu o direito universal de ser bem informado, com aquilo que
as empresas de mídia no Brasil e no mundo impõem ao público como informação.

O senhor deveria saber. E, se não sabe, irá aprender agora: acabou a era da
informação num único sentido. O mundo mudou, Sr. Julio César Mesquita. Isso
que a Petrobras fez, já é feito há muito tempo na blogosfera. Uma mentira,
uma manipulação só dura o tempo de alguém postar a outra versão dos fatos
publicados nos jornais. A manifestação contra a "ditabranda" em
frente a Folha de São Paulo este ano, para citar um exemplo, mostrou, para
quem sabe observar, que nada mais será como antes em matéria de jornalismo.

A mídia corporativa sempre subestimou o papel desempenhado pela blogosfera.
Mas é, justamente ela, que tem garantido um princípio elementar do
jornalismo: o contraponto.
A Petrobras, democraticamente, fez uso desse contraponto. Garantiu o direito
da sociedade a ser livremente informada, ao disponibilizar as informações
omitidas pela imprensa.

O contraponto é o que permite a formação da opinião pública, ou seja, quando
a população tem acesso às várias informações sobre o mesmo assunto. Nós não
nos sentimos lesados pelas informações disponibilizadas pela Petrobras. Nós
nos sentimos lesados pelas informações omitidas pelos sócios da ANJ.

A Petrobras, ao criar seu blog, deu transparência às informações. Quem tem,
sistematicamente, se negado ao democrático escrutínio de seus atos, é a mídia
corporativa brasileira!!!

O fato é esse: vocês perderem a tutela da informação. E isso é intolerável
para o senhor e seus amigos da ANJ!

No mais, melhore a qualidade dos seus argumentos. A considerar pela nota que
o senhor emitiu, dá para entender o porquê dos jornais estarem em tamanha
decadencia.

Artigo publicado originalmente em http://dialogico.blogspot.com/

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