Aldeia Nagô
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Cotas para brancos na universidade por Nelma Cristina Silva Barbosa

4 - 5 minutos de leituraModo Leitura

As cotas sempre são um assunto polêmico, mas quando o debate ocorre entre membros da academia o cenário é ainda mais curioso.


As cotas sempre são um
assunto
polêmico, mas quando o debate ocorre entre membros da academia o cenário
é
ainda mais curioso. A universidade é a instituição que toma para si a
autoridade da produção de saberes válidos para toda a sociedade através
da rigidez
científica e de sua pseudo-neutralidade – neutralidade essa que sempre
favorece
o enunciado eurorreferenciado, branco, masculino, heterossexual, cristão
e
capitalista. Esse tipo de discussão expõe o racismo "nem um pingo
cordial" do
meio acadêmico, que insiste em orientar as nossas mentalidades e
posicionamentos sociais.

Mas quem manda na
universidade?
Os grupos humanos detentores de poder na sociedade, uma tal de "elite".
Na
Bahia, essa elite é formada por mestiços de pele clara, os brancos
baianos. Afinal,
cor e classe no Brasil caminham juntas. Essa tal elite, aliás, sempre se
beneficiou das cotas, cotas para brancos. Portanto, sempre teve mais
oportunidades de ascensão social.

O que dizer do
vestibular,
ferramenta que exclui aqueles que não foram treinados em colégios
particulares?
E quanto a mobilização anti-Enem que assistimos? Antes da unificação do
vestibular, a seleção para ingresso de alunos era feita na própria
faculdade.
Sabe-se de algum filho de governador ou desembargador que tentasse
ingressar no
ensino superior por esse processo e que ficasse de fora naquele tempo?
Será que
não há mesmo nenhuma semelhança com o que acontece ainda em algumas
seleções de
mestrados e doutorados, feitas diretamente nos programas de
pós-graduação? Será
que não há também reserva de vagas (cotas) seguindo um mérito tão comum
na
academia: o da condição de amigos e parentes? Quem entra na universidade
por
esse tipo de cota sempre foi chamado de brilhante, inteligente e os
outros,
aqueles que furam o cerco, são apenas os "esforçados" e recentemente
"cotistas". Não fossem os "esforçadinhos" não teríamos exceções como
Milton
Santos, por exemplo.

As cotas para brancos
tem sido
responsáveis pela presença de seres marcantes e notáveis na vida
universitária
e da sociedade em
geral. Vejamos: no início do século XX um governador atribuiu
o atraso econômico baiano à quantidade de mestiços e negros. Noutro dia,
já no
século XXI, um professor universitário atribuiu as notas baixas de
alunos de
medicina à presença negra na universidade. Parafraseando um certo
escritor (acadêmico
também), autor de artigo recente desta coluna, 
"qualquer idiota ocupa cargo – devido às "cotas" para brancos.

 A Bahia,
governada pelas cotas para brancos,
reflete em suas vergonhosas estatísticas sociais e educacionais as
conseqüências desta prática.  Os números
revelam que as desigualdades sociais se originaram das desigualdades
raciais,
provando que no Brasil nunca houve democracia racial.
Mesmo lutando e sendo, dessa forma, sujeito das transformações sociais,
os
negros não conseguiram eliminar o preconceito e a discriminação
existente na
sociedade brasileira e em suas estruturas de poder, especialmente
aquelas
ligadas a Educação. Organizados, ativistas negros somam conquistas na
luta para
a igualdade racial no Brasil, tais como o aparato legal anti-racista que

temos (racismo só se tornou crime inafiançável e imprescritível a partir
da
Constituição de 1988) e ainda a reparação social por meio de políticas
afirmativas como a reserva de vagas no ensino superior. O cumprimento
destas
conquistas, algumas até já garantidas por lei, não é tarefa fácil, pois
os
conservadores racistas continuam alerta e armados para sua perpetuação
nos
espaços de poder.

Poderíamos listar aqui
os
sobrenomes de famílias de tradição acadêmica, famílias cotistas, eu
diria! Lá
encontraremos resquícios da decadente oligarquia baiana reinando em suas
cátedras. Basta fazer a conexão de nomes e relações de parentesco nas
universidades e uma análise mais apurada dos processos de seleção dos
concursos
públicos para docente universitário, para bolsistas de iniciação
científica ou para
alunos de pós-graduação que perceberemos as cotas para brancos, que de
tão alvas
já se tornaram invisíveis e intocáveis.

Nelma Cristina Silva Barbosa

Professora do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Baiano (IF Baiano)

nelma13@gmail.com

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