Aldeia Nagô
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Depois do capitalismo (Geoff Mulgan) e Global Green New Deal (PNUMA) por Geoff Mulgan

5 - 6 minutos de leituraModo Leitura

A bobagem do "fim do capitalismo" tem uma contrapartida inteligente em
ensaio de Geoff Mulgan publicado na edição corrente de "Prospect"
(sempre uma boa leitura para quem se interessa por reflexão
inovadora). Mulgan, diretor da Young Foundation, faz um convite para
se imaginar o que será o capitalismo depois da crise, este período de
transição para um mundo em que – por que não? – os mercados estarão
enquadrados numa moldura de relações econômicas e sociais muito
diferentes destas a que as últimas gerações se habituaram. "A lição
que vem do próprio capitalismo é que nada é permanente – ‘Tudo que é
sólido desmancha no ar’, disse Marx. No interior do capitalismo tanto
há forças que lhe minam os fundamentos como as que o levam adiante."


Diz ainda Mulgan: "Não estou sugerindo que o capitalismo vai
desaparecer [o título de seu artigo, "After capitalism", pode ser
entendido como uma provocação irônica]. Economias de mercado complexas
e interconectadas continuarão a gerar enormes superávits, alimentados
pelo contínuo fluir de novo conhecimento tecnológico. Mas (…) o
capitalismo não mais dominará a sociedade e a cultura ao ponto em que
o faz hoje. O capitalismo pode, em suma, tornar-se um serviçal, em vez
de ser o senhor. Depressões anteriores foram cruéis, mas também
lançaram idéias das margens para dentro das correntes dominantes,
acelerando seu movimento através dos três estágios que Schopenhauer
descreveu como inerentes a todas as novas verdades, que primeiro são
ridicularizadas, depois sofrem violenta oposição, e finalmente são
tratadas como axiomáticas.

""Essas acomodações periódicas", observa Mulgan, "são tão inerentes ao
capitalismo como as crises financeiras – na verdade, é somente através
da crise e da reforma institucional que o capitalismo se adapta a um
ambiente em transformação e redescobre as referências morais que são
tão vitais para os mercados funcionarem bem. A acomodação do final do
século 19 veio em resposta ao receio de que se fizesse uma revolução e
nos deu a seguridade social, a educação universal, os sindicatos e o
sufrágio universal, pondo fim aos ideais do liberalismo daquele
século. Uma segunda acomodação veio 50 anos depois, por causa da
depressão e da guerra, e tornou variações da democracia social e
cristã a norma em todo país rico, fazendo crescer a participação dos
Estados no PIB e introduzindo mãos visíveis para guiar a mão invisível
do mercado".

E adiante:
"As últimas grandes acomodações se deram em torno do Estado, e Estados
estão sendo levados a desempenhar papéis muito mais ativos à medida
que a recessão avança. Mas algumas das mais importantes garantias de
segurança encontram-se além do alcance direto do governo. Nos Estados
Unidos, a proporção das pessoas que dizem não ter a quem falar sobre
problemas importantes aumentou de 10 para 25% em 20 anos. A biologia e
a ciência social contemporâneas confirmaram quanto somos animais
sociais – dependentes dos outros para nossa felicidade, nosso
auto-respeito, nossa valoração e mesmo nossa vida. Não há contradição
inerente entre capitalismo e comunidade. Mas aprendemos que essas
conexões não são automáticas: precisam ser cultivadas e recompensadas,
e as sociedades que investem grandes proporções de seus superávits em
publicidade para persuadir as pessoas de que o consumo individual é o
melhor caminho para a felicidade terminam pagando um alto preço.

"O fato de que nossas relações sociais são tão importantes quanto
nossa renda pode mudar o modo como políticas são pensadas. O efeito de
curto prazo da recessão será que focalizaremos nossa atenção no
desestimulante declínio do PIB. Mas a tendência de prazo mais longo se
dá em direção a conferir-se menos importância ao PIB do que a outras
medidas de êxito social, incluindo o bem-estar. (…) O que também
está além do PIB é uma idéia mais pluralista de como as empresas devem
ser conduzidas."

(…)
"Um grande espaço político está se abrindo. De imediato, esse espaço
está sendo preenchido com raiva, medo e confusão. No longo prazo,
poderá ser preenchido com uma nova visão do capitalismo e sua relação
com a sociedade e a ecologia, uma visão que tornará mais claro o que
queremos e o que não queremos ver em crescimento. No passado,
democracias repetidamente dominaram, orientaram e revitalizaram o
capitalismo. Impediram a venda de pessoas, de votos, de cargos
públicos, de trabalho infantil e de órgãos humanos, e impuseram
direitos e regras, ao mesmo tempo que direcionavam recursos para
atender às ncessidades do capitalismo em matéria de ciência e
capacitações, e foi a partir dessa mistura de conflito e cooperação
que o mundo alcançou o extraordinário progresso do último século.

"Para descobrir o que vem em seguida, talvez devamos olhar para cima.
As linhas de edificações, no horizonte, servem para o mais simples
teste quando se quer saber o que uma sociedade valoriza, e onde seus
superávits são controlados. Poucos séculos atrás, as maiores
construções nas cidades eram fortes, igrejas e templos; então, durante
algum tempo, foi a vez dos palácios. No século 19, prédios públicos,
estações de trem e museus os ensombreceram. E então, no final do
século 20, em todos os lugares estavam os bancos. Poucos acreditam que
continuarão ali. (…) Mas o que virá agora? Precisamos renovar nossa
capacidade para imaginar e ver, através da tormenta que ainda está se
formando, o que se encontra adiante."

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