Discreto ou exagerado, o ciúme é sempre limitador. Por Regina Navarro Lins
A maioria das pessoas que respondeu à enquete da semana acredita que o parceiro deve saber do nosso ciúme.
“Ainda estamos começando a aprender a evitar o ciúme. O ciúme é o corpo estranho que nos ameaça constantemente. Foi o desejo de possuir — inevitável, talvez, enquanto a propriedade dominou todas as relações — q tornou os amantes tão inseguros, com medo da perda.”, diz o historiador inglês Theodore Zeldin.
Muitos resolvem bem as questões práticas da vida, mas não conseguem ficar sozinhas. Só estão bem ao lado da pessoa amada. Reeditando a mesma forma primária de vínculo com a mãe, o antigo medo infantil de ser abandonado reaparece.
Se o amor é a solução de todos os problemas e se o convívio amoroso é a única forma de atenuar o desamparo, a pessoa amada se torna imprescindível. Não se pode correr o risco de perdê-la. O controle, a possessividade e o ciúme passam, então, a fazer parte do amor.
A relação amorosa entre homens e mulheres sempre foi prejudicada pelo ciúme. Inicialmente o ciúme do homem estava ligado ao medo de falsificação da descendência — dar seu nome e criar um filho que não fosse seu. Esse temor serviu como justificativa para a violência extrema que as mulheres sofreram nas sociedades patriarcais. Cabia-lhes exclusivamente ser virtuosas e obedientes.
A revolução sexual dos anos 60 irrompeu no mundo ocidental trazendo a separação definitiva entre sexo e reprodução e, consequentemente, a igualdade de condições entre homens e mulheres nessa área, além do fim do tabu da virgindade.
No entanto, com toda essa liberação e ao contrário do que se poderia supor, o homem continuou ciumento e a mulher passou a expressar essa emoção na mesma intensidade que ele.
Quando a pessoa consegue elaborar bem a dependência infantil e também se libertar da submissão aos valores morais, se percebe menos ciumenta. Caso contrário, é difícil ter autonomia suficiente e podem reaparecer as antigas inseguranças.
O ciúme envolve uma espécie de ansiedade de abandono. Para superar os crescentes sentimentos de impotência, o ciumento se esforça por sufocar o outro. Seus interrogatórios e pedidos de garantia de fidelidade fazem parte das tentativas de controle.
O professor de Filosofia e escritor, Luiz Alfredo Garcia-Roza elabora uma reflexão interessante: “O ciúme é um produto da opacidade do outro. O outro é sempre opaco pra nós. Eu não tenho a menor ideia do que você está pensando de mim nesse momento, e vice-versa. Em suma: você não tem acesso à minha subjetividade, nem eu à sua. A relação entre dois seres é marcada pela ausência de garantia. Por maior que seja a prova de amor dada, ela pode não ser verdadeira. Essa possibilidade de falsear é que é a mola do ciúme. Ciúme é a contrapartida da ausência de garantia.”
O ciúme, independente da forma como se apresente — discreto ou exagerado — é sempre tirano e limitador. Não só para quem ele é dirigido, mas também para quem o sente.
Acredito que para uma relação a dois valer a pena, alguns fatores primordiais: Total respeito ao outro e ao seu jeito de ser, suas ideias e suas escolhas. Nenhuma possessividade ou manifestação de ciúme que possa limitar a vida do parceiro.
Artigo publicado em http://reginanavarro.blogosfera.uol.com.br/2016/07/05/discreto-ou-exagerado-o-ciume-e-sempre-limitador/