Documentário “O Primeiro Beijo” desmistifica histórias de mulheres negras e relação com droga em narrativa sensível e crítica
Após 14 anos de investigação, Urânia Munzanzu apresenta experiências diversas de mulheres que convivem com o crack e alerta sobre omissão do Estado e silêncio da sociedade civil. Filme estreia dia 20 de novembro na Saladearte em Salvador
No Dia da Consciência Negra, Salvador recebe o lançamento do longa O Primeiro Beijo, documentário dirigido pela cineasta baiana Urânia Munzanzu (@munzanzuurania). O filme chega às telas como um manifesto político pela vida de mulheres negras que tiveram suas vidas e famílias atravessadas pelo crack, revelando como a droga – considerada pela diretora como uma “tecnologia de escravização moderna” – opera como mecanismo de extermínio, apagamento e feminicídio. A sessão de estreia acontece no dia 20 de novembro, no circuito da Saladearte em Salvador (BA).
Fruto de uma investigação que se estendeu por 14 anos, o documentário é produzido pela Acarajé Filmes, em parceria com a Modupé Produtora Audiovisual e Mulungu Realizações Culturais e tem distribuição da Olhar Filmes. “O primeiro beijo” é como, em Salvador, as mulheres nomeiam a primeira experiência com a droga. “Essa frase cheia de múltiplos sentidos, e de certa maneira sutilmente irônica, guarda a dor de mulheres para as quais as experiências de amor e de afeto estão necessariamente atravessadas pelas mais variadas formas de violência”, afirma Urânia.
O filme nasceu de um encontro em 2006. Na época, Urânia nem se imaginava cineasta, então jornalista e moradora do centro de Salvador, foi abordada por Rilda, mulher negra em situação de dependência química severa, que insistiu para que sua trajetória fosse registrada. “Eu vou morrer, mas antes disso quero falar dessa droga”. A partir desse chamado urgente, o documentário se constrói como testemunho, escuta e enfrentamento.
“A linha que me separava de Rilda era muito tênue. Era só o ‘primeiro beijo’ que ela deu e eu não dei. Sendo uma mulher negra e de santo, entendi que tinha uma espiritualidade gritando, e enquanto sujeito político, eu tenho um compromisso com a minha comunidade”, afirma a cineasta que, desde então, tem se voltado à construção narrativa de produtos audiovisuais com foco em em raça, gênero e política. Entre eles, o curta “Na Volta Eu Te Encontro” (2025) que recebeu 7 premiações em festivais pelo Brasil.
O filme conta com a participação especial da voz de Elza Soares, narrando o poema Canarinhas da Vila, de Landê Onawale; trilha sonora original de Jarbas Bittencourt e uma equipe majoritariamente negra que reforça a narrativa estética e política da obra. Com produções associadas de nomes como Lázaro Ramos e Thiago Gomes, o filme amplia o debate sobre como o Brasil constrói, alimenta e naturaliza suas “cracolândias”.
A coprodutora do filme, Susan Kalik, reforça que a mensagem central do documentário é compreender o crack dentro da estrutura que o produz. “Temos no Brasil um processo civilizatório construído com base necropolítica e o crack faz parte disto. Este filme lança olhar sobre mulheres que tiveram seus caminhos atravessados por esta droga maldita, não só como usuárias, mas como mães, filhas, esposas que resistem, persistem, sobrevivem. É um filme sobre dororidade, mulheridades e “sobre vivência”.
Um filme sobre vidas que resistem à sentença de morte
Entre entrevistas e relatos marcados por coragem, dor e humanidade, o filme coloca em primeiro plano mulheres dependentes químicas e seus familiares, expõe a ausência de políticas públicas, o impacto da violência racial e de gênero e as contradições de um Estado que normaliza o abandono. Ao mesmo tempo, evidencia a importância de redes de apoio e estratégias de resistência construídas por essas mulheres.
A diretora conta que pensou em uma construção narrativa e estética que contasse a história de vida dessas mulheres, mas que não passasse por uma exploração da dor. “Eu escolhi tirar essas mulheres da rua, de perto da boca, de lugares sujos e sem dignidade. Eu as levei para um teatro. Um espaço com um camarim, banheiros limpos, espaço para elas se arrumarem – se quisessem – tinha boa comida, água, frutas para que elas pudessem se alimentar e falar em um espaço seguro”
Para a diretora, O Primeiro Beijo é um manifesto político, um assunto indigesto, mas necessário, que o Estado e a sociedade evitam discutir. “Minha esperança é que este filme chegue para jovens negras e negros, que as escolas possam levantar esse debate, que a informação circule nos espaços onde todos os dias chegam fuzis e sua “balas perdidas”. Esse filme é para meu povo. É pra gente não morrer“, conclui Urânia Munzanzu.
“O PRIMEIRO BEIJO” é uma produção da Acarajé Filmes com co-produção da Modupé Produtora. Produção associada: Mulungu Realizações Culturais. Este projeto foi contemplado nos Editais da Paulo Gustavo Bahia e tem apoio financeiro do Governo do Estado da Bahia através da Secretaria de Cultura via Lei Paulo Gustavo, direcionada pelo Ministério da Cultura, Governo Federal. Paulo Gustavo Bahia (PGBA) foi criada para a efetivação das ações emergenciais de apoio ao setor cultural, visando cumprir a lei complementar n.º 195, de 8 de julho de 2022.
Serviço
O que: Lançamento do documentário O Primeiro Beijo
Quando: 20 de novembro
Onde: Saladearte – Salvador
Direção: Urânia Munzanzu
Duração: 110 min | Classificação: 16 anos
Acompanhe em:
Ficha Técnica
Produtora: Acarajé Filmes
Co-Produtora: Modupé Produtora Audiovisual
Produtora Associada: Mulungu Realizações Culturais
Produção Executiva: Urânia Munzanzu e Susan Kalik
Direção: Urânia Munzanzu
Roteiro: Urânia Munzanzu e Susan Kalik
Direção De Fotografia: Edinho Alves, Gabriel Teixeira e Maoma Faria
Direção de Produção: Flávia Santana
Produtores associados: Lázaro Ramos e Thiago Gomes
Distribuição: Olhar Filmes
Montagem: Thiago Gomes Rosa
Trilha Sonora Original: Jarbas Bittencourt
Pesquisa: Urânia Munzanzu E Lorenlai França
Assistente de Direção: Tais Amordivino
Câmera: Tatiana Trad, Alexandre Rosa, Paulo Roberto Santos
Assistente De Câmera: Jaine Oliveira
Imagens Extras: Falani Afrika E Ismael Silva
Iluminador Teatro: Marcos Fernandes
Colorização, Desenho de Som e Mixagem: Modupé Produtora
Som Direto: Dudoo Caribe
Assistente De Som Direto: Cristiana Fernandes
Captação de Som de Elza Soares: Ricardo Muralha E Vilma Neres
Participação Especial (Voz): Elza Soares
Poema Original: Canarinhas Da Vila De Landê Onawale
Organização de Material Bruto: Raiane Vasconcelos, Daiane Rosário e Letícia Figueiredo.
Participam desse filme: Rilda Lima, Lorenlai França, Sandra Regina Oliveira, Camila Oliveira Dos Santos, Vânia Gonzaga Da Silva, Amanda Priscilla Lima Rosa, Annelise Moreira, Thiffany Odara, Elenita Da Silva Oliveira, Maria Luciene Araújo, Nilzete Leão e Andressa Leão Nascimento.
Site e Redes Sociais: Giovana Romano Sanchez e Rubian Melo
Tradução de Textos: Giovana Romano Sanchez
Programação Visual para Site e Redes Sociais: Diego Ribeiro e Giovana Romano Sanchez
Fotos Still: Alile Dara Onawale, Vilma Neres, Mel Ádun e Ismael Silva
Fotos para Material de Apoio: Jefferson Dias e Léo De Azevedo
Produção de Base, Locações e Entrevistas: Tais Amordivino, Ismael Silva, Flávia Santana e Juê Olívia
Assistente de Produção: Daniele Andrade e Padma Lima
Platô: Loiá Fernandes
Motoristas: Antônio Costa, Carla Ramos e Almir Damasceno
Biografia da Direção (Urânia Munzanzu)
Urânia é mulher negra, sapatão , nascida e criada no pelourinho, em Salvador-Bahia. Cineasta, roteirista, poeta e produtora. Mestre em antropologia pela UFBA, fundadora da Frente Marginal de Arte Negra e CEO da Acarajé Filmes. Produz narrativas transatlânticas, passando pelo Brasil, Caribe e África com foco em raça, gênero e política de mulheres negras. Tem se dedicado a desenvolver e conceituar o “cinema de cozinha”, um método que desenvolveu para ancorar os anseios políticos e estéticos do cinema negro que produz.
Documentários: Diretora e Roteirista do longa-metragem O Primeiro Beijo (2024); Mulheres Negras em Rotas de Liberdade (em produção) longa-metragem com produção em no continente africano, co-produção Brasil/Benim/França; Candomblé (em desenvolvimento) longa-metragem que também será rodado no Benim e Nigéria. Roteiro, direção ; Roteirista e diretora do curta-metragem Abô (2021); Curta Metragem Merê (2018), Prêmio de Direção e o Selo Zózimo Bulbull de filme Curta Metragem e direção na Mostra de Cinema Adélia Sampaio; Longa Metragem Maestrina da Favela (2018). Assistente de direção, Prêmio de melhor documentário na MIMB 2019;
Projetos de ficção – As Joias de Oxum (2025) direção e roteiro; Na Volta eu te Encontro (2025) direção e roteiro, Prêmio de Melhor Filme de Ficção do Festival Cine Deburu 2025; Prêmio de Melhor Fotografia e Melhor Som no XX Panorama Internacional Coisa de Cinema; Prêmio de Melhor Filme na Mostra Outros Brasis do Festival Afroestima 2025; Prêmio de Melhor filme pelo Júri técnico no 32º Festival de Cinema de Vitória 2025; Prêmio de Melhor Filme Mostra Raízes no 8º Festival Lugar de Mulher é no Cinema; Prêmio Canal Brasil de Curtas no 53° Festival de Cinema de Gramado; Prêmio de Melhor Fotografia no 11° Recifest. Orquestra (em desenvolvimento), Prêmio Aldir Blanc, 2020; Nuevas Miradas – Cuba e Torino FilmLab – Itália (2023); Cátedra de producción EICTV (2023); Filma Afro (2023).
Séries: OMOYA (2021) direção e roteiro; Afroroutes (2019). Produtora e Assistente de direção na série musical produzida no Brasil, Tunísia, Marrocos.
Videoclipes: 14 de Maio (2021) artista Lazzo Matumbi; Iyá Nílá (2021) artista Nitorê Akadã
Sobre a Olhar Filmes – Nascida do desejo de buscar a pluralidade de experiências, visões de mundo e diversidade, a Olhar Filmes busca transpor fronteiras que limitam a ficcionalidade e a realidade, levando as produções a outros olhares, com o objetivo de sensibilizar e provocar reflexão, promovendo filmes que dialogam com a contemporaneidade, a multiplicidade de realidades e narrativas. Os filmes distribuídos pela Olhar já marcaram presença em vários festivais nacionais e internacionais, ganhando prêmios em muitos deles, como Festival de Cannes, Sundance Film Festival, San Sebastian, Festival de Berlim, Festival de Rotterdam, BFI London, Dok Leipzig, Frameline, Indie Lisboa, Festival de Gramado, Mostra São Paulo, Festival do Rio, dentre outros, somando mais de 700 participações e 150 prêmios. Contribuindo para o crescimento do cinema brasileiro, a Olhar Filmes já distribuiu filmes no BRasil e outras partes do mundo, e, recentemente, lançou sua própria plataforma de exibição, a OlharPlay, com catálogo vasto com muitos dos seus pais, além da disponibilidade nas plataformas populares de streaming, Globoplay, Telecine, Netflix, Mubi, Prime Video e Apple TV. Entre os títulos lançados pela Olhar, destacam-se os filmes “Meu Corpo é Político” de Alice Riff; “Nóis por Nóis”, de Aly Muritiba e Jandir Santin; “Os Primeiros Soldados” de Rodrigo de Oliveira; “Alice Júnior” de Gil Baroni;”Meu Nome é Daniel” e “Assexybilidade” de Daniel Gonçalves; “Vento Seco” de Daniel Nolasco; “A Mesma Parte de Um Homem” de Ana Johann; “UÝRA, A Retomada da Floresta” de Juliana Curi; “Rafiki” da diretora queniana Wanuri Kahiu; e “Praia Formosa” de Julia De Simone. Mais informações no site oficial: www.olharfilmes.com.br .
