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Documentário sobre o genocídio da juventude negra entra em cartaz em Salvador

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O longa-metragem “O Caso do Homem Errado” que aborda a questão do extermínio da população negra inicia seu circuito comercial na capital baiana a partir desta sexta-feira (27), na SaladeArte Cinema do Museu, localizado no Corredor da Vitória. Após a exibição do filme ocorrerá um debate com a presença da diretora Camila de Moraes, da professora, doutora em Teoria e Crítica da Literatura e Cultura pela UFBA, Denise Carrascosa e do jornalista e escritor Edson Cardoso.

 

O documentário iniciou o circuito comercial nacional em Porto Alegre no mês de março e com grande público permaneceu em cartaz por duas semanas. Segundo a equipe, a intenção desta produção independente é conseguir, no ano de 2018, entrar em cartaz em mais algumas cidades brasileiras para que mais pessoas tenham acesso à essa produção audiovisual e assim ampliar o debate em torno do racismo que mata uma parcela significativa de indivíduos por conta da pigmentação de sua pele. Segundo dados da CPI do Senado sobre o Assassinato de Jovens todo ano, 23.100 jovens negros de 15 a 29 anos são assassinados. São 63 por dia. Um a cada 23 minutos. A CPI toma por base os números do Mapa da Violência, realizado desde 1998 pelo sociólogo Julio Jacobo Wasilfisz a partir de dados oficiais do Sistema de Informações de Mortalidade do Ministério da Saúde. O último Mapa da Violência contabilizou que cerca de 30 mil jovens são assassinados por ano no Brasil e 77% são negros. Ainda de acordo com o Mapa, a taxa de homicídios entre jovens negros é quase quatro vezes a verificada entre os brancos, 36,9 a cada mil habitantes, contra 9,6. Além disso, o fato de ser homem multiplica o risco de ser vítima de homicídio em quase 12 vezes.

 

O Documentário – “O Caso do Homem Errado” conta a história do jovem operário negro Júlio César de Melo Pinto, que foi executado pela Brigada Militar, em 1987, em Porto Alegre/RS. O crime ganhou notoriedade  após  a imprensa divulgar fotos  de Júlio sendo colocado com vida na viatura e chegar, 37 minutos depois, morto a tiros no hospital. O filme traz o depoimento de Ronaldo Bernardi, o fotógrafo que fez as imagens que tornaram o caso conhecido, da viúva do operário, Juçara Pinto, e de nomes respeitados da luta pelos direitos humanos e do movimento negro no Brasil. Além do caso que dá título ao filme, a produção discute ainda as mortes de pessoas negras provocadas pela polícia. A Anistia Internacional, inclusive, fala de genocídio da juventude negra devido ao grande número de jovens negros assassinados pelas forças de segurança no País. O filme também apresenta dados atuais sobre essa violência contra a comunidade negra.

Em agosto 2017, o documentário fez a sua estreia nacional no 45º Festival de Cinema de Gramado. Em novembro, na sua primeira participação internacional em festivais, ganhou o prêmio de melhor filme no 9º Festival Internacional de Cine Latino, Uruguayo y Brasileiro, em Punta del Este. No início deste mês participou da I Mostra Itinerante de Cinema Negro Mahomed Bamba (MIMB) que ocorreu em Salvador.

 

Mulheres no Cinema – Realizado pela produtora de cinema gaúcha Praça de Filmes, o documentário tem a coordenação de duas mulheres negras,  Camila de Moraes que assina a direção e Mariani Ferreira que faz a produção executiva, ambas jornalistas. Segundo dados apresentados no final de janeiro deste ano pela Agência Nacional de Cinema (Ancine) que fazem parte do estudo “Diversidade de Gênero e Raça nos lançamentos de 2016”, analisou 142 filmes lançados comercialmente no respectivo ano, conclui que mesmo a população brasileira tento 51% de mulheres e 54% de negros, os homens brancos dirigiram 75,4% dos longas-metragens e na outra ponta desta tabela as mulheres negras não assinaram a direção, o roteiro ou a produção executiva de nenhum filme nacional naquele ano.

O estudo mostra que 19,7% de mulheres brancas dirigiram longas. Os homens negros dirigiram 2,1%. O roteiro desses filmes também foi escrito principalmente por homens brancos, 59,9%, mulheres brancas, 16,2%, e parcerias entre homens brancos e mulheres brancas, 16,9%. Os homens negros foram roteiristas em 2,1% dos filmes e estiveram em parcerias com homens brancos em 3,5%. Dados atualizados do Grupo de Estudos Multidisciplinar da Ação Afirmativa (Gemaa), vinculado ao Instituto de Estudos Sociais e Políticos da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, que acompanha o tema, mostram que mulheres negras não dirigiram ou roterizaram um filme sequer entre os de maior bilheteria no período de 1995 a 2016. Na verdade houve uma queda da presença feminina no audiovisual. Em 2015, mulheres dirigiram e roterizaram 19% e 23% das obras de espaço qualificado, números que diminuíram para 17% e 21% em 2016. Nos últimos oito anos, conforme o balanço, os índices flutuaram. Mulheres dirigiram 10% dos filmes em 2014, sem nunca ultrapassar 24% de todas as produções, recorde observado em 2012.

“Diante desses dados é preciso criar medidas específicas para garantir um olhar mais plural, pois essas produções que temos são os olhares que vão construir o imaginário das novas gerações, e essas produções são feitas, na maioria das vezes, por homens brancos. As disparidades que vemos são o reflexo da sociedade. Então, nós fizemos questão de ocupar o espaço de direção e produção executiva do documentário ‘O Caso do Homem Errado’, pois é para demarcar espaço, é um ato político, é que para os próximos estudos da Ancine sobre o ano de 2017 tenha registrado, ao menos, uma produção de longa-metragem dirigida por uma mulher negra e que entrou em circuito comercial. Estamos dando um passo de cada vez. Sabemos que temos produções no audiovisual negras, que temos mulheres negras nas mais diversas áreas produzindo e escrevendo uma nova história através desse outro olhar, porém percebemos a dificuldade que é chegar nos registros e regulamentações de toda uma obra audiovisual. No nosso caso tivemos uma parceria com uma produtora já registrada na Ancine, mas e as produções negras que não tem produtoras como fazem para dar esse passo? O registro é caro, as taxas para ter todos os documentos exigidos para exibir o filme em uma sala de cinema ou em TV. É  tudo pago e caro. Como conseguir esses recursos financeiros? Essas questões todas surgiram para nós na pós produção do documentário, que está sendo mais difícil que imaginava, pois é um processo executivo, burocrático, que demora, porém por mais exaustas que estejamos, fizemos um acordo de não desistir, de nenhum passo atrás. Vamos ocupar todos os espaços!”, desabafo da diretora Camila de Moraes.

 

Convidados

Denise Carrascosa – Professora Adjunta do Instituto de Letras da Universidade Federal da Bahia . Bacharel em Letras com ênfase em Tradução pela Universidade Salvador e Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito da UFBA. Doutora em Teorias e Crítica da Literatura e da Cultura pelo Instituto de Letras da UFBA. Ensina literaturas anglófonas na graduação e é professora do Programa de Pós-Graduação em Literatura e Cultura, nas linhas de pesquisa de Teoria de Literatura e Estudos de Tradução. Atualmente, pesquisa literaturas “con(tra)temporâneas”, em inglês e português, em articulação com os seguintes temas: literatura como performance, escritas de si, políticas de si, subjetividades marginais e traduções literárias afrodiaspóricas. Líder do grupo de pesquisa: Traduzindo no Atlântico Negro. Coordenadora do Projeto de Extensão Corpos Indóceis & Mentes Livres, que faz uso da arte literária em sentido expandido como tecnologia de produção política de si para pessoas em situação de encarceramento. Autora do livro Técnicas e Políticas de Si nas Margens: literatura e prisão no Brasil pós-Carandiru. Co-autora do livro Cartografias da Subalternidade: diálogos no eixo Sul-Sul. Organizadora do livro Traduzindo no Atlântico Negro. Participa do Conselho Editorial da Editora Ogum’s Toques Negros.

 

Edson Cardoso – Nascido em Salvador, Edson Lopes Cardoso é mestre em Comunicação Social pela Universidade de Brasília (Unb) e Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo (Usp). É autor dos livros Bruxas, espíritos e outros bichos (Mazza Edições, 1992), Ubá (Edição do Autor, 1999), Gravatá da Fonte (Edição do Autor, 2016) e, na sede do Instituto Mídia Étnica, o autor fará sessão de autógrafo de Negro, não: a opinião do jornal Irohìn, publicado em 2015 pela editora Brado Negro. Na obra estão reunidos os editorias escritos por Edson Cardoso no jornal Irohin, que entre (1996-1999) e (2004-2009), cobriu as principais agendas referentes ao enfrentamento ao racismo no Brasil.

 

SERVIÇO

O Quê: Documentário “O Caso do Homem Errado” – Circuito Comercial em Salvador

Quando: 27.04.2018 a 02.05.2018

Horário: 19h30

Local: SaladeArte Cinema do Museu (Av. Sete de Setembro, 2.195, Corredor da Vitória – Museu Geológico)

Valor do Ingresso: Segunda-Feira e Terça-Feira, R$20,00 (inteira) e R$10,00 (meia) / Quarta-Feira, R$19,00 (inteira) e R$9,50 (meia) / Quinta-Feira a Domingo e Feriados, R$25,00 (inteira) e

R$12,50 (meia) / Alunos secundarista de escola pública pagam R$6,00.

Classificação: 10 anos

Capacidade do Cinema: 124 lugares

Ficha Técnica

Produtora: Praça de Filmes

Diretora: Camila de Moraes

Roteiro: Camila de Moraes, Mariani Ferreira e Maurício Borges de Medeiros

Produção Executiva: Camila de Moraes e Mariani Ferreira

Elenco: (Depoentes) Juçara Pinto, Paulo Ricardo de Moraes, Ronaldo Bernardi, Luiz Francisco Corrêa Barbosa, João Carlos Rodrigues, Jair Kirschke, Edilson Nabarro, Renato Dornelles, Paulo Antônio Costa Corrêa, Waldemar Moura Lima, Vera Daisy Barcellos, Romeu Karnikowski, Aline Gerber

Direção de Fotografia: Maurício Borges de Medeiros

Trilha Sonora: Rick Carvalho

Montagem: Maurício Borges de Medeiros

Desenho de Som: Guilherme Cássio dos Santos

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