Segundo o autor, nossa elite econômica também é uma continuidade perfeita da elite escravagista. Ambas se caracterizam pela rapinagem de curto prazo. Antes, o planejamento era dificultado pela impossibilidade de calcular os fatores de produção. Hoje, como o recente golpe comprova, ainda predomina o quero o meu agora, mesmo que a custo do futuro de todos.
Como que explicando a ala Trabalho informal na cidade, em que trabalhadores braçais são representados executando atividades extenuantes, Jessé afirma ainda que a ralé de novos escravos, mais de um terço da população, é explorada pela classe média e pela elite do mesmo modo que o escravo doméstico: pelo uso de sua energia muscular em funções indignas, cansativas e com remuneração abjeta.
Como se sabe, foi justamente o meio da pirâmide de distribuição de renda que perdeu com o processo de crescimento dos anos 2000: os 40% intermediários reduziram sua participação na renda de 34% para 32% naqueles anos, em um processo que foi chamado pelo pesquisador Marc Morgan de squeezed middle, ou miolo espremido.
Enxergando o crescimento acelerado dos salários na base e o encarecimento do trabalho doméstico e dos serviços em geral, é possível que essa classe intermediária tenha se unido à elite esta sem qualquer razão material para a insatisfação no apoio ao impeachment de 2016. Diante da evidência de que, desde então, sua situação só piorou, tais setores podem vir a mudar de lado.
Parecem ter se enganado os que pensavam que o desafio dos próximos embates eleitorais resume-se a encontrar candidatos ficha limpa dispostos a defender o programa econômico que já está sendo implementado. A Tuiuti apenas escancarou o que já estava claro em pesquisas de opinião: a impopularidade de Temer explica-se também por sua agenda antidemocrática.