Aldeia Nagô
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Gilmar tentando parar o tempo por Luis Nassif

3 - 4 minutos de leituraModo Leitura

Há uma guerra declarada do
presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Gilmar Mendes contra Ministério
Público, Polícia Federal e juízes de primeira.



Não se tente personalizar o
conflito. Ele tem implicações muito mais profundas, é reflexo de um dos
fenômenos mais importantes dos últimos tempos: a mudança total de paradigmas no
sistema de informações do país, obrigando a uma mudança completa em hábitos
políticos e empresariais consolidados.


No meu livro "Os Cabeças de
Planilha", procuro traçar paralelo entre as primeiras décadas do século e as
últimas. Primeiro, a República, coincidindo com um período de esbornia
financeira global.


Os chamados financistas controlam
a política econômica, garantem a política de governadores – com práticas cada
vez mais corruptas – ao mesmo tempo em que emerge uma nova sociedade urbana e
eclodem revoltas a partir das bases do Exército – os tenentes. Essas mudanças
são aceleradas pelas novas mídias – na época, o rádio, que permite a explosão da
informação e da cultura urbana brasileira.


Agora se tem a volta do pêndulo
repetindo o ciclo. Primeiro a esbórnia dos primeiros anos de redemocratização.
Depois, a financeirização absurda, que permitiu que sistemas de crime organizado
participassem dos esquemas de poder.


A cada dia que passa, mais bancos
de dados são disponibilizados para consulta pública, mais jornais, mais
arquivos, mais blogs, em um processo irreversível de
transparência.


Por exemplo, a operação Castelos
de Areia revelou o nome de um lobista que intermediava as doações políticas da
empreiteira. Uma breve consulta ao Google revelou que era filho de um Ministro
do Tribunal de Contas da União.


Um leitor do Blog identificou uma
reportagem de uma revista semanal, de 1996, levantando acusações contra o
Ministro, na época candidato a governador do Distrito Federal. Depois, outro
leitor informou que, depois que se tornou Ministro, dois irmãos passaram a
patrocinar causas no TCU. Uma breve pesquisa nos arquivos do TCU comprovou a
afirmação.


Outra pesquisa mostrou que o
Ministro é relator de processos envolvendo a empreiteira. Depois, será possível
obter mais dados consultando os bancos de dados legislativos, dos tribunais de
primeira e segunda instância, das revistas, sites e blogs.


Essa lufada de ar fresco e de
informação está mudando o Brasil. Tenta-se disfarçar, criando escândalos em cima
da empregada do deputado, da assessora do senador. São as pequenas mazelas que
acabam recebendo mais destaque que os grandes esquemas criminosos. Passam a
sensação de que se está denunciando a corrupção, enquanto se tenta esconder a
grande corrupção debaixo do tapete.


É esse processo de transformações
que está trazendo de volta o fenômeno do tenentismo. Não mais oficiais do
Exército tentando derrubar o poder, mas policiais, procuradores, juízes,
jornalistas independentes tentando impor o primado da lei, enquanto tribunais
superiores – e o presidente do Supremo – tentam conter a onda moralizante.


Não tem volta. Apesar das
invectivas de Gilmar Mendes, não tem como tapar a peneira. É o mesmo que
pretender parar o tempo e o avanço da civilização.







Publicado originalmente no Blog: www.luisnassif.com.br
E-mail: luisnassif@ig.com.br


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