Gritar “Fora Temer” dentro da PF muito a ajudaria, por Armando Coelho Neto
Ao longo de três semanas, nossa conversa com o leitor girou em torno de treze normas sancionadas pela presidenta Dilma Rousseff que tornaram a Polícia Federal mais forte. Em três textos, uma a uma, aquelas normas foram tratadas, as quais complementaram um trabalho iniciado pelo ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva.
Aliás, talvez o único presidente da República a visitar a sede da instituição, em Brasília. Se ele entrou com salários e recursos, a titular dos 54 milhões de votos entrou com leis.?
Esse texto, que seria uma consideração final dos três outros, precisou de ajustes no meio de caminho e já envereda por outros meandros. Nele, cabe inicialmente lembrar que a cada operação contra o Partido dos Trabalhadores, a PF acaba passando atestado de idoneidade aos demais partidos. É como se o republicanismo tivesse ido pro brejo e tivesse se tornado uma polícia partidária. Inclusa na página suja dos golpes contra a democracia, não responde uma questão elementar: não prende tucanos por omissão, conivência ou incompetência? Se não é nada disso, que venha a público explicar.
Essa obscura posição da PF permite examinar melhor as especulações de que o atual comando da instituição seria, realmente, uma obra do governo impostor (Fora Temer). Nesse sentido, eis mais um dado para cálculo da idade do golpe. Afinal, paradoxalmente, foi muito rápido o entrosamento entre o comando da PF e o atual ministro da Justiça. Alguém lembra da visita desse último a São Paulo, quando disse que teria “novidades” na Farsa Jato? Isso teria ocorrido após encontro com o comando da PF. A novidade adiantada coincidiu com a subsequente prisão do ex-ministro Antônio Palocci…
Aquela quebra do republicanismo passa a ganhar força com boatos que correm em Brasília. “Sempre desconfiamos de que com a saída do PT do Governo Federal, a PF voltaria a servir o governo de plantão”. Mas, o que não se desconfiava é que o seria de forma tão rápida e escancarada. É daquela cidade que chegam comentários de que investigações sobre fundos de pensão em curso na PF/DF estariam passando por um “processo seletivo”. Para servidores, um dos sintomas estaria na misteriosa troca de comando na Delegacia de Combate ao Crime Organizado no Distrito Federal. Não é comum o chefe afastado permanecer na mesma delegacia. Seria imposição urgente para a qual a PF não se organizou?
Depois da mudança, uma especial e rápida análise teria sido solicitada sobre os tais fundos investigados. No início, os servidores imaginavam ser algo sério, mas logo surgiram suspeitas de tons seletivos. Foram surpreendidos com um suposto pedido de “mais celeridade”, na qual o aprofundamento da extensa rede de envolvidos perderam importância. Desconfia-se que a pressa exigida (e ou solicitada) tenha por objetivo deixar alguns alvos de fora. Até por que, segundo as cogitações, alvos prioritários já estariam definidos. Basicamente, pessoas ligadas ao Partido dos Trabalhadores entraram na alça de mira. Desse modo, a pouca coragem para investigar o tucanato parece estar sendo ampliada para os pemedebistas. E os outros?
Tudo isso acontece no pós-golpe, diante de uma pretensa conclusão de que, se o golpe é inevitável, “precisamos nos proteger”. Pelo jeito, o conteúdo das gravações divulgadas sobre o “estancamento da sangria” começa ganhar mais força. E, ao que parece, mais gente “precisa se proteger” ou de proteção. Nessa trilha, até os tocadores da Farsa Jato querem ter suas ações blindadas pela impunidade. É nesse clima de reciprocidade, de relações amistosas entre delatores e autoridades, que cresce a pontual aura de suspeita acerca da suposta nova orientação para as investigações nos fundos de pensão na PF/DF. É como se no ajuntamento das pedras, as notas de corredores da PF permitissem concluir que novos holofotes precisam ser lançados sobre a instituição.
São tantos os mistérios no quebra-cabeça do golpe, que já seria possível perguntar se as leis aprovadas por Dilma Rousseff, de boa-fé, também não integrariam o maquiavélico roteiro do golpe. Só mesmo isso poderia explicar a indiferença, a falta de reconhecimento e de respeito dos delegados da PF para com ela. Desse modo, ao invés de cogitarem de represálias contra nossos ímpetos de cidadania, deveriam lutar pelo direito de investigar todos… Gritar Fora Temer já seria um bom começo.
Armando Rodrigues Coelho Neto – jornalista e advogado, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-representante da Interpol em São Paulo
Artigo publicado originalmente em http://jornalggn.com.br/noticia/gritar-%E2%80%9Cfora-temer%E2%80%9D-dentro-da-pf-muito-a-ajudaria-por-armando-coelho-neto