Aldeia Nagô
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Itaipu Binacional: miniatura da biocivilização por Leonardo Boff

4 - 5 minutos de leituraModo Leitura

Há hoje na cultura mundial muita desesperança e perplexidade generalizada. Não
sabemos para onde estamos rumando. O vôo é  cego num rumo ao desconhecido.


O que mais dói é a falta de alternativa ao modelo vigente que visa grande
acumulação em vista do acelerado consumo, à custa da depredação da natureza e
da geração de gritantes injustiças sociais a nivel mundial.
Com as "externalidades" surgidas (aquecimento global, escassêz de recursos,
desequilíbrio global do sistema-Terra) a sensação predominante é que assim como
está o mundo não pode continuar. Temos que mudar. Por isso, por todas as
partes, surgem novas visões e especialmente práticas que nos devolvem certa
esperança de que outro mundo é possível e necessário. A nova centralidade gira
ao redor do cuidado da vida, da salvaguarda da Humanidade e da proteção do
planeta Terra. O que vai nascer será uma biocivilização ou uma Terra da Boa
Esperança (Ignacy Sachs).

Eis que em nosso pais encontramos uma miniatura do desejo coletivo, uma pequena
antecipação daquilo que deverá ser dominante na Humanidade: o projeto
"Cultivando Agua Boa" da Itaipu Binacional em Foz do Iguaçu, no Estado do
Paraná.
Ai, num acordo entre Brasil e Paraguai, se construiu a maior hidrelétrica do
mundo com um reservatório de água de 176 quilômetros de
comprimento, onde estão estocados 19 bilhões de metros cúbicos de água,
utilizados por 20 turbinas que geram 14 mil megawatts.

Qual foi o "insight" de seus diretores  Jorge Samek e Nelton Friedrich já
nos inícios de sua administração em 2003? Que a água não se destina apenas para
produzir energia elétrica, mas também para gerar todo tipo de energia
necessária aos seres que dependem vitalmente da água, especialmente os humanos.

Foi então se modelou o projeto "Cultivando Agua Boa" que envolve os 29
municípios lindeiros nos quais vivem cerca de um milhão de pessoas, com a
criação de aves e suinos, das maiores do pais. Trata-se de um projeto altamente
complexo que envolve praticamente todas as dimensões da realidade, resultando
numa verdadeira revolução cultural, pois este é o propósito dos milhares que
implementam o projeto. É exatamente isso que precisamos: de um novo ensaio
civilizatório, testado numa miniatura, que seja viável dentro das condições
mudadas da Terra em processo de aquecimento e de exaustão de seus recursos. O
motto diz tudo:"um novo modo de ser para a sustentabilidade".

Sempre afirmei que a sustentabilidade foi sequestrada pelo projeto do capital,
esvaziando-a para impedir que significasse um paradigma alternativo a ele, já
que é intrinsecamente insustentável. Libertada deste cativeiro, ela adquire valor
central de um novo arranjo civilizatório que estabelece uma equação equilibrada
entre ser humano-natureza-desenvolvimento-solidariedade generacional. Em
Itaipu se conseguiu instaurar esta equação feliz. Começaram corretamente com a
sensibilização das comunidades. Quer dizer, iniciaram com o alargamento das
consciências, convocando nomes notáveis do pensamento ecológico, como F. Capra,
Enrique Leff (Pnuma latinoamericano), Marcos Sorrentino, Carlos e Paulo
 Nobre entre outros. Eu mesmo acompanho o projeto desde o seu início.
Definiram o espaço não pelos limites arbitrários dos municípios mas pelos
naturais das hidrobacias. Envolveram todas as comunidades, criando comités
gestores de cada bacia, legalizados pelas prefeituras. Sabiamente se deram
conta de que a educação ambiental representa o motor  da mudança de ser,
de sentir, de produzir e de consumir. Não é isso a inauguração de uma revolução
cultural? Formaram algumas centenas de formadores ambientais, atingindo
milhares de pessoas. Uma nova geração está surgindo que busca um modo
sustentável de viver.

No próximo artigo quero detalhar o vasto campo de atividades que vão desde o
aproveitamento dos dejetos sólidos gerando energia, até a inovação tecnológica
com o carro elétrico, a pesquisa sobre o hidrogênio, a criação do Centro de
Saberes e Cuidados Ambientais e a da Universidade Federal da Integração
Latino-Americana (UNILA).

Quem acompanha aquele projeto sai com esta certeza: a Humanidade é resgatável,
ela tem jeito, é possível, como dizia Fernando Pessoa, criar um mundo que ainda
não foi ensaiado.

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