Aldeia Nagô
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Noruega prospera e oferece lição de economia por Landon Thomas Jr.

6 - 8 minutos de leituraModo Leitura

Quando o capitalismo parecia à beira do colapso no outono passado, a ministra
das finanças da Noruega, Kristin Halvorsen, que sempre foi cética em relação ao
mercado livre, fez mais do que se vangloriar.


Conforme investidores de
todo o mundo entraram em pânico e passaram a vender ações, ela nadou contra a
maré, autorizando o fundo soberano da Noruega, de US$ 300 bilhões, a aumentar
seu programa de compra de ações em US$ 60 bilhões – ou cerca de 23% da produção
econômica do país.

"O momento não era tão ruim", disse Halvorsen,
sorrindo de satisfação com a recuperação ampla do mercado mundial que começou no
início de março.

A crise financeira global afetou as economias de
praticamente todos os países do mundo. Mas não da Noruega.

Com uma
espécie de resistência profundamente entalhada no caráter nacional, da mesma
forma que os fiordes esculpem a paisagem acidentada do país, a Noruega prosperou
ao trilhar seu próprio caminho. Enquanto outros ostentavam, o país economizava.
Enquanto outros limitavam o papel do governo, a Noruega fortalecia seu Estado de
bem-estar social com benefícios desde o berço até o túmulo.

E em meio à
pior crise mundial desde a Depressão, a economia da Noruega cresceu pouco menos
de 3% no ano passado. O governo tem um superávit orçamentário de 11% e suas
contas estão completamente livres de dívidas.

Em comparação, os Estados
Unidos devem acumular um déficit fiscal de 12,9% do PIB este ano, aumentando sua
dívida total para US$ 11 trilhões, ou 65% de toda a economia do país.

A
Noruega é um país relativamente pequeno, com uma população bastante homogênea de
4,6 milhões e a vantagem de ser um grande exportador de petróleo. A receita do
petróleo somou US$ 68 bilhões no ano passado à medida que os preços subiram para
níveis recordes. Apesar de terem sofrido uma queda acentuada desde então, o
governo não está particularmente preocupado. Isto porque a Noruega evitou a
armadilha em que muitos dos países ricos em energia caíram.

Em vez de
desperdiçar suas riquezas, ela aprovou uma legislação assegurando que a receita
do petróleo fosse diretamente para seu fundo soberano, fundo estatal que é usado
para fazer investimentos em todo o mundo. Agora, seu fundo soberano está próximo
de ser o maior do mundo, apesar de ter perdido 23% no ano passado por causa de
investimentos em queda.

A relativa frugalidade da Noruega contrasta
fortemente com a situação da Inglaterra, que gastou a maior parte de sua receita
de petróleo da North Sea – e muito mais – durante os anos de alta. Os gastos do
governo subiram de 42% do PIB em 2003 para 47%. Em comparação, os gastos
públicos na Noruega caíram de 48% para 40% do PIB.

"Os EUA e a Inglaterra
não têm senso de culpa", disse Anders Aslund, especialista em Escandinávia no
Instituto Peterson para Economia Internacional em Washington. "Mas na Noruega,
em vez disso, há um senso de virtude. Se você recebe muito, você tem uma
responsabilidade."

Eirik Wekre, economista que escreve roteiros no tempo
livre, descreve os sentimentos dos noruegueses em relação à dívida com as
seguintes
palavras: "Não podemos gastar esse dinheiro agora; seria como
roubar das gerações futuras."

Wekre, que pagou sua casa e seu carro em
dinheiro, atribui esse consenso amplo à iconoclastia do país. "O homem mais
forte é aquele que se mantém sozinho no mundo", diz ele, citando o dramaturgo
norueguês Henrik Ibsen.

Ainda assim, até Ibsen deve admitir que é mais
fácil se manter sozinho quando o país dispõe de reservas de petróleo que o
tornam o terceiro maior exportador do mundo. O dinheiro que veio do ouro negro
desde o início dos anos 70 fez com que até mesmo o mais rígido dos noruegueses
relaxasse e aproveitasse sua boa sorte. O PIB per capita do país é de US$ 52
mil, atrás apenas de Luxemburgo, entre as democracias industriais.

Como
na maioria dos países do mundo, o preço das casas também subiu na Noruega, tendo
triplicado em uma década. Mas não houve uma bolha imobiliária porque os
financiamentos não foram excessivos. Depois de uma correção de 15%, os preços
estão subindo novamente.

Ao contrário de Dublin, na Irlanda, ou Riad, na
Arábia Saudita, onde as obras pararam com arranha-céus construídos pela metade e
guindastes imóveis tomam conta do horizonte, Oslo permanece com um ar de
modéstia que lembra muito mais um vilarejo pesqueiro do que uma capital do
Ocidente. Um recém-inaugurado teatro de ópera de US$ 800 milhões é um dos poucos
sinais de opulência.

A maioria dos bancos noruegueses, diz Arne J.
Isachsen, economista da Escola Norueguesa de Administração, continuam saudáveis
e prudentes ao conceder empréstimos. Os bancos representam apenas 2% da economia
e a fiscalização pública rígida sobre suas práticas de empréstimo evitaram que
eles assumissem o mesmo risco que derrubou as instituições bancárias da vizinha
Islândia. Mas eles certamente não fecharam as portas para os empréstimos.
Isachsen, como muitos na Noruega, tem uma segunda casa e uma linha de crédito
aberta no banco que usou recentemente para comprar um barco novo.

Alguns
noruegueses temem que, apesar de uma casa de campo e um barco não chegarem perto
dos excessos cometidos em Nova York ou Londres, a riqueza do petróleo e a
generosidade do Estado tenham corrompido a firme ética de trabalho
norueguesa.

"Esta é a política da troca do petróleo pelo lazer", diz Knut
Anton Mork, economista do Handelsbanken em Oslo. Um estudo recente, diz ele,
descobriu que os noruegueses trabalham menos do que qualquer outro cidadão de
países democráticos industriais.

"Nós nos tornamos complacentes",
acrescentou Mork. "Cada vez se constrói mais casas de veraneio. Temos férias
mais longas do que a maioria, benefícios extremamente generosos e políticas de
licença médica. Algum dia o sonho vai acabar."

Mas esse dia está longe.
Por enquanto, o ar está limpo, há bastante emprego e a ajuda do governo é
onipresente – até para os marginalizados.

Logo na esquina do banco
central da Noruega, por exemplo, Paul Bruum pegava uma seringa cheia de
anfetaminas e a espetava no braço musculoso. As marcas e inflamações entregam
seus muitos anos de usuário de heroína. Ele diz que os US$ 1.500 por mês que
recebe do governo são suficientes para ele se alimentar e comprar
drogas.

Bruun, 32, diz que nunca trabalhou, e admite que não está em
posição de procurar emprego. "Eu não culpo ninguém", diz ele. "O governo
norueguês me sustenta da melhor forma que pode".

Para a ministra
Halvorsen, até o lado ruim do sonho norueguês parece muito bom comparado aos
pesadelos econômicos no resto do mundo.

"Como socialista, sempre disse
que o mercado não é capaz de regular a si mesmo", disse ela. "Mas até eu fiquei
surpresa com o tamanho do fracasso".

Tradução: Eloise De Vylder

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