Aldeia Nagô
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O ataque de Israel à Síria e a história de Salma. Por Lúcia Heçena Issa

4 - 5 minutos de leituraModo Leitura
Lucia_Helena_Issa

Salma tinha apenas cinco anos em junho de 1967, quando, durante a Guerra dos Seis Dias, soldados israelenses mataram seu pai e dois de seus irmãos, destruindo centenas de famílias como a sua e ocupando ilegalmente as férteis

Colinas de Golã, um dos territórios que Israel ocupa ainda hoje, de forma ilegal e sem o apoio da comunidade internacional.

Ela me conta que a Guerra dos Seis Dias destruiu não apenas a sua família, e de milhares de crianças da sua cidade, mas também o único lugar que um dia chamou de lar, já que depois disso, Salma e a mãe viúva passaram a morar de favor, em condições precárias ou dependendo da ajuda de parentes da região de Homs.

Depois da Guerra dos Seis Dias e do chamado “Ataque Preventivo” de Israel ( Preventivo?) , um ataque que começou o conflito de fato e que matou milhares de sírios, Salma passou a mudar de escola com frequência, a mãe passou a sofrer de síndrome do pânico, e elas jamais voltaram a ter uma vida normal.

Naquele junho de 1967, Israel invadiu e ocupou ilegalmente, com o apoio bélico dos EUA , não apenas as Colinas de Golã, mas também o deserto do Sinai, a Faixa de Gaza, a Cisjordânia inteira e também Jerusalém Oriental.

De todos esses territórios , apenas Gaza foi devolvida depois de longos anos e pressões internacionais.

Os outros territórios, inclusive Jerusalém, continuam ainda hoje sendo cenário de ocupações ilegais israelenses, torturas, indignação internacional, apartheid, detenção de crianças palestinas e uma dor infinita para milhares de famílias como a de Salma.

As Colinas de Golã, invadidas em 1967, foram anexadas pelo governo de Israel , sem o aval da ONU e da comunidade internacional , que sempre considerou o território como absolutamente sírio, em 1981.

Israel, que começara a guerra com apenas 20.000 km2 de território sob seu controle, um país pequeno, mas com o apoio bélico dos EUA, terminaria o Guerra dos Seis Dias, com cerca de 102.000 km, um aumento ilegal de cerca de cinco vezes ao território original.

A ilegalidade das invasões territoriais e a assustadora violência do exército israelense consolidaram os planos sionistas para a região.Aquelas Colinas que povoam as lembranças de Salma, assim como as Serras do Mar e da Mantiqueira povoam as minhas, os momentos vividos por ela quando o pai e os irmãos ainda estavam vivos e a família vivia em uma casa linda e numa terra fértil , repleta de árvores frutíferas, numa Oriente Médio onde a seca um problema, jamais voltariam a ter paz.

Salma e milhares de outras meninas tiveram a infância destruída e foram obrigadas a crescer como refugiadas internas.
O conflito gerado pela invasão e pelo ataque de Israel em 1967 continua ainda hoje, já que, sem a devolução do território reconhecidamente sírio por parte dos israelenses, os dois países jamais assinaram um Tratado de Paz.

Durante a madrugada de hoje, não muito longe do campo de refugiados sírios em que conheci Salma, o exército israelense atacou a Síria, matando pelo menos trinta pessoas, entre sírios e iranianos, disparando cerca de 70 mísseis contra o país, utilizando 28 aviões F 15 e F 16. Na última terça-feira, a Síria já havia acusado Israel de atacar bases nos arredores de Damasco, matando 15 pessoas, incluindo oito iranianos.
Ataques israelenses desse tipo vêm se repetindo desde o ano passado.

“Atacamos quase todas as infraestruturas iranianas na Síria e, claro, deve haver dezenas de mortos”, disse o ministro da Defesa israelense, Avigdor Lieberman. ” Espero que este episódio fique para trás e que tenham entendido que quando sobre nós cair uma pequena chuva, sobre eles cairá a tempestade”.

Foi o maior ataque de Israel à Síria desde a Guerra do Yom Kippur , em 1973, poucos anos após a Guerra dos Seis Dias, e pode significar a escalada de conflitos na região, depois do descumprimento de Donald Trump em relação ao Acordo Nuclear com o Irã, na terça-feira.
Não sabemos ainda o que acontecerá na Síria a partir de agora e quantas vidas humanas ainda serão perdidas em um conflito que já deixou mais de 450 mil mortos e mais de dez milhões de refugiados.

Mas é em Salma e em todas as mulheres e crianças muçulmanas que receberam essa jornalista cristã com imenso amor, esperança, e atitudes que me emocionaram num campo de refugiados sírios, que eu penso desde ontem, quando começou o ataque de Israel. É em Salma e em todas as mulheres cujo olhar repleto de humanidade e esperança jamais esquecerei , que não consigo deixar de pensar desde o início dos ataques, é por elas que escrevo, e a elas que quero dar voz e é com elas que minha alma está hoje.

Lúcia Helena Issa é jornalista, escritora e ativista pela paz. Foi colaboradora da Folha de S.Paulo em Roma. Autora do livro “Quando amanhece na Sicília”. Pós- graduada em Linguagem, Simbologia e Semiótica pela Universidade de Roma e embaixadora da Paz por uma organização internacional. Atualmente, vive entre o Rio de Janeiro e o Oriente Médio.

Omar Sanadiki

Artigo publicado originalmente em https://www.brasil247.com/pt/colunistas/luciahelenaissa/354384/O-ataque-de-Israel-%C3%A0-S%C3%ADria-e-a-hist%C3%B3ria-de-Salma.htm

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