O Efeito Borboleta e a Petrobras por Filipe Couto
O matemático
Edward Lorenz, que faleceu ano passado, entrou para a história por
demonstrar como o resultado final de um sistema harmônico ou caótico
depende sensivelmente das condições iniciais de alimentação dos dados.
demostra-se essa relação pela alegoria do chamado “efeito borboleta”: o
bater de asas de uma borboleta poderia gerar distorções progressivas,
capazes de provocar um tufão do outro lado do mundo.
A despeito do tom exagerado do exemplo acima, é inegável que algumas
medidas simples podem ter impacto revolucionário na nossa forma de
enxergar o mundo.
Por isso, confesso que me deu uma satisfação danada ver a celeuma criada desde semana passada em função do lançamento do blogue Fatos e Dados da assessoria de imprensa da Petrobras.
O novo estilo de comunicação da Petrobras
O
projeto em si guarda a simplicidade típica das ideias geniais: usar uma
plataforma gratuita de distribuição de informações para se comunicar
com o grande público. Segundo a própria empresa, foi a necessidade de
apresentar “fatos e dados recentes da Petrobras e o posicionamento da
empresa sobre as questões relativas à Comissão Parlamentar de Inquérito
(CPI)” que motivou a criação desse espaço virtual.
Isso, por si
só, é um fato positivo: finalmente, a maior empresa do país aderiu aos
caminhos da web 2.0, aquela da interação, da colaboração, do
compartilhamento, da transparência. A empresa, que fatura por ano mais
que o PIB de muitos países e que produz informações de interesse de
milhões de pessoas, entendeu que é importante ser visível e estar
atualizada em termos comunicacionais.
Mas o que me agradou mesmo foi que a Petrobras resolveu publicar nesse espaço não só comunicados oficiais, mas também todas as perguntas encaminhadas a ela pelos mais diversos órgãos de imprensa, juntamente, é claro, com suas respostas.
Com
isso, a Petrobras (que, em termos alegóricos, está longe de ser uma
mera borboletinha) causou um rebuliço que tem tudo para criar um belo
temporal. Um temporal bem do tipo daqueles que Deus mandou para fazer
uma limpeza geral, quando ficou de saco cheio do que andavam fazendo
com a criação Dele.
Uma análise da imprensa brasileira
Já é sabido de todos que a qualidade da imprensa brasileira tem caído vertiginosamente nos últimos anos.
A adoção do estilo “neocon” mainardiano
(que se vale da linguagem agressiva, do denuncismo e da desinformação
para destruir a confiança da opinião pública em determinada pessoa ou
instituição), a submissão aos grandes grupos econômicos (que conseguem comandar notas, matérias e até linhas editoriais) e a escolha de pautas sensacionalistas
(que apelam para o medo e para o simplismo como armas agregadoras de
audiência) têm sido as características marcantes dos nossos meios de
comunicação.
O Fatos e Dados
nada mais é, portanto, que uma tentativa da Petrobras de tentar se
proteger contra a manipulação operada por essa imprensa chinfrim que
domina o cenário brasileiro. Publicando com antecedência as perguntas e
as respostas, o blogue impede as edições mal intencionadas, que têm
servido para fomentar os mais variados ataques à estatal.
A reação dos jornalões
Perdendo
o “direito sagrado à edição” e o “direito exclusivo de transmissão da
informação”, os jornalões, pretensos paladinos da justiça republicana,
entraram em desespero. O Globo, A Folha de São Paulo e O Estadão têm
manifestado claramente seu repúdio contra essa decisão da Petrobras nas
suas linhas editoriais. Curiosamente, com isso eles revelam ao leitor
atento e crítico as suas próprias vilezas e limitações.
Um exemplo claro aconteceu no dia seis de junho: enquanto O Globo publicou matéria em que diz “Petrobras vaza em blog informações obtidas por jornalistas”, lê-se na Folha “Petrobras usa blog para vazar reportagens”. É brincadeira?
Como
num sórdido cartel orquestrado, os grupos lançaram juntos uma campanha
de desinformação. Desinformação porque o uso do verbo “vazar” sugere ao
público ilegalidade; sugere ao público que se trata de informações
sigilosas e protegidas, a que só os próprios jornalistas teriam direito
e que a Petrobras deliberadamente resolveu divulgar.
Na terra brasilis
só faltava essa agora: jornalista com direito à propriedade intelectual
sobre a pergunta elaborada e sobre a resposta a ele dada.
De tudo que a imprensazona tem dito de ruim sobre o Fatos e Dados,
a única discussão que me parece um pouco interessante é a levantada
pelo jornalista Sérgio Leo, do Valor Econômico, em seu blogue
(http://verbeat.org/): e o direito ao furo de reportagem, à matéria exclusiva?
Nessa linha argumentativa, com a publicação antecipada das perguntas e
respostas, o jornalista pode se sentir desestimulado a consultar a
Petrobras como fonte, já que isso alertaria colegas para a pauta que
ele está levantando.
A consequência natural, segundo o Sérgio, é
sempre favorável à Petrobras: ou a matéria será publicada sem checagem,
o que diminui sua credibilidade, ou simplesmente não será feita matéria
nenhuma.
O que o nobre jornalista, no entanto, esquece é que
esse argumento tem como pressuposto básico a falta de ética no
exercício da profissão: apropriar-se da matéria dos outros é algo
hediondo nos meios jornalísticos. Se ele considera que esse tipo de
comportamento é possível, então a Petrobras tem mais é que se defender
mesmo…
O blogue da Petrobras não é um mal para o jornalismo,
mas para o tipo de jornalismo que tem sido produzido no Brasil nas
últimas décadas. O bom profissional não tem cerceado o seu compromisso
de buscar a informação a qualquer custo, nem tem relativizado o seu
direito de criticar a estatal ou o de denunciar irregularidades na sua
administração. O papel da boa imprensa, o de ser o ouvido e a voz da
sociedade, mantém-se íntegro.
Que
o desespero do senhor Ali Kamel (mestre-guia do jornalismo das
organizações globo; aquele mesmo que diz que não há racismo no Brasil)
e de seus pares seja só o início da grande tempestade que se anuncia.
Artigo publicado originalmente em http://asprimeiraspalavras.blogspot.com/