Aldeia Nagô
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O fim de um ciclo em que a velha mídia foi soberana por Luis Nassif

6 - 8 minutos de leituraModo Leitura

Dia
após dia, episódio após episódio, vem se confirmando o cenário que traçamos
aqui desde meados do ano passado: o suicídio do PSDB apostando as fichas em
José Serra



a reestruturação partidária pós-eleições; o novo papel de Aécio
Neves no cenário político; o pacto espúrio de Serra com a velha mídia,
destruindo a oposição e a reputação dos jornais; os riscos para a liberdade de
opinião, caso ele fosse eleito; a perda gradativa de influência da velha mídia.

O provável anúncio da saída de Aécio Neves  marca oficialmente o fim do
PSDB e da aliança com a velha mídia carioca-paulista que lhe forneceu a
hegemonia política de 1994 a 2002 e a hegemonia sobre a oposição no período
posterior.
Daqui para frente, o outrora glorioso PSDB, que em outros tempos encarnou a
esperança de racionalidade administrativa, de não-sectarismo, será reduzido a
uma reedição do velho PRP (Partido Republicano Paulista), encastelado em São
Paulo e comandado por um político – Geraldo Alckmin – sem expressão nacional.

Fim de um período
odioso

Restarão
os ecos da mais odiosa campanha política da moderna história brasileira – um
processo que se iniciou cinco anos atrás, com o uso intensivo da injúria, o
exercício recorrente do assassinato de reputações, conseguindo suplantar em
baixaria e falta de escrúpulos até a campanha de Fernando Collor em 1989.
As quarenta capas de Veja – culminando com a que aparece chutando o presidente
– entrarão para a história do antijornalismo nacional. Os ataques de
parajornalistas a jornalistas, patrocinados por Serra e admitidos por Roberto
Civita, marcarão a categoria por décadas, como símbolo do período mais abjeto
de uma história que começa gloriosa, com a campanha das diretas, e se encerra
melancólica, exibindo um  esgoto a céu aberto.
Levará anos para que o rancor seja extirpado da comunidade dos jornalistas,
diluindo o envenenamento geral que tomou conta da classe.
A verdadeira história desse desastre ainda levará algum tempo para ser contada,
o pacto com diretores da velha mídia, a noite de São Bartolomeu, para afastar
os dissidentes, os assassinatos de reputação de jornalistas e políticos,
adversários e até aliados, bancados diretamente por Serra, a tentativa de criar
dossiês contra Aécio, da mesma maneira que utilizou contra Roseana, Tasso e
Paulo Renato.

O general que traiu
seu exército

Do
cenário político desaparecerá também o DEM, com seus militantes distribuindo-se
pelo PMDB e pelo PV.
Encerra-se a carreira de Freire, Jungman, Itagiba, Guerra, Álvaro Dias,
Virgilio, Heráclito, Bornhausen, do meu amigo Vellozo Lucas, de Márcio Fortes e
tantos outros que apostaram suas fichas em uma liderança destrambelhada e
egocêntrica, atuando à sombra das conspirações subterrâneas.
Em todo esse período, Serra pensou apenas nele. Sua campanha foi montada para
blindá-lo e à família das informações que virão à tona com o livro do
jornalista Amaury Ribeiro Jr e da exposição de suas ligações com Daniel Dantas.
Todos os dias, obsessivamente, preocupou-se em vitimizar a filha e a ele, para
que qualquer investigação futura sobre seus negócios possa ser rebatida com o
argumento de perseguição política.
A interrupção da entrevista à CNT expôs de maneira didática essa estratégia que
vinha sendo cantada há tempos aqui, para explicar uma campanha eleitoral sem pé
nem cabeça. Seu argumento para Márcia Peltier foi: ocorreu um desrespeito aos
direitos individuais da minha filha; o resto é desculpa para esconder o crime
principal.
Para salvar a pele, não vacilou em destruir a oposição, em tentar destruir a
estabilidade política, em liquidar com a carreira de seus seguidores mais
fiéis.
Mesmo depois que todas as pesquisas qualitativas falavam na perda de votos com
o denuncismo exacerbado, mesmo com o clima político tornando-se irrespirável,
prosseguiu nessa aventura insana, afundando os aliados a cada nova pesquisa e a
cada nova denúncia.
Com isso, expôs de tal maneira a filha, que não será mais possível varrer suas
estripulias para debaixo do tapete.

A marcha da história

Os
episódios dos últimos dias me lembram a lavagem das escadarias do Senhor do
Bonfim. Dejetos, lixo, figuras soturnas, almas penadas, todos sendo varridos
pela água abundante e revitalizadora da marcha da história.
Dia após dia, mês após mês, quem tem sensibilidade analítica percebia
movimentos tectônicos irresistíveis da história.
Primeiro, o desabrochar de uma nova sociedade de consumo de massas, a ascensão
dos novos brasileiros ao mercado de consumo e ao mercado político, o Bolsa
Família com seu cartão eletrônico, libertando os eleitores dos currais
controlados por coronéis regionais.
Depois, a construção gradativa de uma nova sociedade civil, organizando-se em
torno de conselhos municipais, estaduais, ONGs, pontos de cultura, associações,
sindicatos, conselhos de secretários, pela periferia e pela Internet,
sepultando o velho modelo autárquico de governar sem conversar.
Mesmo debaixo do tiroteio cerrado, a nova opinião pública florescia através da
blogosfera.
Foi de extremo simbolismo o episódio com o deputado do interior do Rio Grande
do Sul, integrante do baixo clero, que resolveu enfrentar a poderosa Rede
Globo.
Durante dias, jornalistas vociferantes investiram contra UM deputado
inexpressivo, para puni-lo pelo atrevimento de enfrentar os deuses do Olimpo.
Matérias no Jornal Nacional, reportagens em O Globo, ataques pela CBN, parecia
o exército dos Estados Unidos se valendo das mais poderosas armas de destruição
contra um pequeno povoado perdido.
E o gauchão, dando de ombros: meus eleitores não ligam para essa imprensa. Nem
me lembro do seu nome. Mas seu desprezo pela força da velha mídia, sem nenhuma
presunção de heroísmo, de fazer história, ainda será reconhecido como o momento
mais simbólico dessa nova era.

Os novos tempos

A
Rede Record ganhou musculatura, a Bandeirantes nunca teve alinhamento
automático com a Globo, a ex-Manchete parece querer erguer-se da irrelevância.
De jornal nacional, com tiragem e influência distribuídas por todos os estados,
a Folha foi se tornando mais e mais um jornal paulista, assim como o Estadão. A
influência da velha mídia se viu reduzida à rede Globo e à CBN. A Abril se
debate, faz das tripas coração para esconder a queda de tiragem da Veja.
A blogosfera foi se organizando de maneira espontânea, para enfrentar a
barreira de desinformação, fazendo o contraponto à velha mídia não apenas entre
leitores bem informados como também junto à imprensa fora do eixo Rio-São
Paulo. O fim do controle das verbas publicitárias pela grande mídia,
gradativamente passou a revitalizar a mídia do interior. Em temas nacionais,
deixou de existir seu alinhamento automático com a velha mídia.
Em breve, mudanças na Lei Geral das Comunicações abrirão espaço para novos
grupos entrarem, impondo finalmente a modernização e o arejamento ao derradeiro
setor anacrônico de um país que clama pela modernização.

As ameaças à liberdade
de opinião

Dia
desses, me perguntaram no Twitter qual a probabilidade da imprensa ser calada
pelo próximo governo. Disse que era de 25% – o percentual de votos de Serra.
Espero, agora, que caia abaixo dos 20% e que seja ultrapassado pela umidade relativa
do ar, para que um vento refrescante e revitalizador venha aliviar a política
brasileira e o clima de São Paulo.

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