O Povo Pediu no carnaval de 2018 por Nelson Pretto
Lá pelo final dos anos 70 do século passado, um grupo de músicos se reuniu com muitos outros amigos e amigas e, todos juntos, começaram a cantar para seus males espantar.
Tudo começou com a ideia de construir um pequeno trio elétrico, um artefato sonoro-musical, para Lula Gazineu tocar. Estávamos em 1978.
Nascia, assim, pelo menos na ideia, o “trio” de nome Sarigão, movido pelo slogan-bordão: O Povo Pediu, o Sarigão saiu! Como o tal Sarigão nunca saiu das nossas cabeças, restou somente O Povo Pediu. Vale lembrar que o nome e o slogan foram criação de Ciro Boy, Ciro Baptista D’Orleans e Bragança, poeta e matemático, como ele se autointitulava à época.
Puxados por Lula Gazineu, Tito, Quito, Ciro Boy, Mara Bu, Dilase, Mara, Palito e tantos outros, foram juntando uma verdadeira malta de gente a celebrar a alegria e o carnaval. Mas não só o carnaval. Bastava ter um motivo e lá íamos nós celebrar o dia de Reis, Réveillon, São João e tudo mais que permitisse uma ou muitas folias.
Os ensaios – que nome pomposo para os nossos encontros de pura improvisação! – aconteciam na casa de um ou de outro, nos bares, na rua, em qualquer canto… e o grupo foi crescendo e, mais que de repente, decidiu-se encarar o carnaval de 1979.
Em um dos encontros, na barraca de Valdete, em Piatã, chegou-se à conclusão de que aquele grupo, que atendia por Regional, ficaria, de fato e de direito, denominado O Povo Pediu. Batizado feito, chegou a hora de designar o local do encontro, horário de saída, horário esse nunca cumprido, e a composição de uma música para ser o enredo do novo bloco. Prontamente recorremos ao grande poeta Zé Enrique Barreiro, que criou, em parceria com Lula Gazineu, a primeira composição autoral d’O Povo Pediu. É deles, portanto, a autoria de nosso hino, linda poesia e melodia a embalar, desde então, nossas folias. Isso tudo “porque cantar nos encanta, porque este amor nos uniu. Porque a força foi tanta, porque o Povo Pediu”!
Logo em seguida, Gazina e Zé Enrique lançaram o manifesto indicando que “o Carnaval é de todos e todos estão ao meu lado”. Depois veio A Roda que “é um laço, corrente de aço que fecha o prazer”.
Gileno Félix Antônio Menezes botaram o povo para pedir um beijo.
As músicas foram se sucedendo. Pura beleza e poesia.
Mas para O Povo sair também precisava de um ponto de apoio para os esquentas e criações de cartazes: o ap de Nelson Pretto, inicialmente no Canela, na casa de sua mãe, e depois no edifício Pedra da Sereia. Pura folia a alegria aqueles encontros!
Não sabemos de quem foi a ideia de sair do Pé do Caboclo, no Campo Grande, decisão muito acertada. Afinal, o carnaval ainda era com banquinhos e cadeiras nos passeios da avenida Sete. Sair dali em direção à Castro Alves era, portanto, abrir “oficialmente” o carnaval, já que estávamos apenas na sexta-feira. Falar, hoje, de apenas na sexta feira, parece brincadeira.
Havia também a nossa Porta Estandarte, a querida Mara Bu, que já nos deixou. Sertaneja, grande, braba e destemida, acumulava as funções de Porta Estandarte e Segurança. Depois de Mara, vieram Diana e Linda.
Embalado no repertório autoral e com a filosofia de cantar marchinhas de antigos carnavais e sátiras, o Povo foi aglutinando participantes e admiradores-seguidores.
Como o carnaval foi se agigantando, a saída passou a ser nas quintas feiras, ainda no Pé do Caboclo. Mara Bu vacilou e só chegou na sexta-feira, atrasada. Gileno não perdoou, e mandou um Mara Bu com direito a coro e tudo. Mais uma música passou a integrar o repertório d’O Povo Pediu.
O trajeto inicial era do Campo Grande até o Beco de Maria da Paz, onde acontecia a Lavagem do Beco. Como, sem se saber por que, a lavagem parou de ser realizada, lá foi o bloco descer a Ladeira de São Bento para chegar ao pé do poeta, na Praça Castro Alves. Não era um percurso fácil. Consumida maior parte do tempo para chegar do Caboclo à antiga Manon, ali na esquina da Casa de Itália, só restava aos músicos puxar um Corre Corre Lambretinha para dar uma acelerada e, quem sabe, chegarmos inteiro à Piedade. Haja fôlego!
O tempo foi passando, o carnaval mudando e se eletrificando cada vez mais. O Povo começou a sua peregrinação por novos locais para as saídas. Já esteve no Pelourinho, no Campo Grande (só que em direção ao Garcia), no Rio Vermelho, entre outros tantos lugares.
Mas o Povo Pediu não para e, alcançado novos voos, estará, dia 12 próximo, segunda feira, no Recife Antigo, na Rua do Carmo, para sair, sem corda, sem registro e com muita alegria. O horário? Ahhhh, é carnaval.
Divirta-se:
“Como se fosse brincadeira de roda – memória
Jogo de trabalho da dança das mãos – macias
O suor dos corpos na canção da vida – história
O suor da vida no calor de irmãos – magias
(…)
Vai se formando a roda
Cada qual no seu lugar
Cada passo que nos leva
E leva o nosso cantar
Se o povo pediu um dia
Nós iremos rodear
Vai vem abre essa roda
Vai vem que a roda roda
Vai vem que a roda é um laço
Vai vem que a roda é um abraço”.