Aldeia Nagô
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Para salvar a vida: as mulheres no poder por Leonardo Boff

4 - 5 minutos de leituraModo Leitura

Há uma feliz singularidade na atual disputa
presidencial no Brasil: a presença de duas mulheres, Marina Silva e Dilma
Rousseff.





Elas são diferentes, cada qual com seu estilo próprio, mas ambas com
indiscutível densidade ética e com uma compreensão da política como virtude a
serviço do bem comum e não como técnica de conquista e uso do poder,
geralmente, em benefício da própria vaidade ou de interesses elitistas que
ainda predominam na  democracia que herdamos.

Elas emergem num momento especial da história do
pais, da humanidade e  do planeta Terra. Se pensarmos radicalmente e
chegarmos à conclusão como chegaram notáveis cosmólogos e biólogos de que o
sujeito principal das ações não somos nós mesmos, num antropocentrismo
superficial, mas é a própria Terra, entendida como superorganismo vivo,
carregado de propósito, Gaia e Grande Mãe, então diríamos que é a própria Terra
que através destas duas mulheres nos está falando, conclamando e advertindo.
Elas são a própria Terra que clama, a Terra que sente e que busca um novo
equilíbrio.

Esse novo equilíbrio deverá passar pelas
mulheres predominantemente e não pelos homens. Estes, depois de séculos de
arrogância, estão mais interessados em garantir seus negócios do que salvar a
vida e proteger o planeta. Os encontros internacionais mostram-nos
despreparados para lidar com temas ligadas à vida e à preservação da Casa
Comum. Nesse momento crucial de graves riscos, são invocados aqueles sujeitos
históricos que estão, pela própria natureza, melhor apetrechados a assumirem
missões e ações ligadas à preservação e ao cuidado da vida. São as mulheres e
seus aliados: aqueles homens que tiverem integrado em si as virtudes do
feminino. A evolução as fez profundamente ligadas aos processos geradores e
cuidadores da vida. Elas são as pastoras da vida e os anjos da guarda dos
valores derivados da dimensão da anima (do feminino na mulher e
no homem) que são o cuidado, a reverência, a capacidade de captar, nos mínimos
sinais, mensagens e sentidos, sensíveis aos valores espirituais como a doação,
o amor incondicional, a renúncia em favor do outro e a abertura ao Sagrado.

O feminismo mundial trouxe uma crítica
fundamental ao patriarcalismo que nos vem desde o neolítico. O patriarcado
originou instituições que ainda moldam as sociedades mundiais como: a razão
instrumental-analítica que separa natureza e ser humano e que levou à dominação
sobre os processos da natureza de forma tão devastadora que se manifesta hoje
pelo aquecimento global; criou o Estado e sua burocracia, mas organizado nos
interesses dos homens; projetou um estilo de educação que reproduz e legitima o
poder patriarcal; organizou exércitos e inaugurou a guerra. Afetou outras
instâncias como as religiões e igrejas cujos deuses ou atores são quase todos
masculinos. O "destino manifesto" do patriarcado é do dominium mundi (a dominação
do mundo), com a pretensão de fazer-nos "mestres e donos da
natureza"(Descartes).

Atualmente, os homens (varões) se fizeram
vítimas do "complexo de deus" no dizer de um eminente psicalista alemão K.
Richter. Assumiram tarefas divinas: dominar a natureza e os outros, organizar
toda a vida, conquistar os espaços exteriores e remodelar a humanidade. Tudo
isso foi simplesmente demais. Não deram conta. Sentem-se um "deus de araque"
que sucumbe ao próprio peso, especialmente porque  projetou uma máquina de
morte, capaz de erradicá-lo da face da Terra.
 
É agora que se faz urgente a atuação salvadora da mulher. Damos razão ao que
escreveu anos atrás o Fundo das Nações Unidas para a População:"A raça humana
vem saqueando a Terra de forma insustentável e dar às mulheres maior poder de
decisão sobre o seu futuro pode salvar o planeta a destruição". Observe-se: não
se diz "maior poder de participação às mulheres"coisa que os homens concedem
mas de forma subalterna. Aqui se afirma: "poder de decisão sobre o futuro."
Essa decisão,  as mulheres devem assumir, incorporando nela os
homens, pois caso contrário, arriscaremos nosso futuro.

Esse é o significado profundo, diria,
providencial, das duas candidatas mulheres à presidência do Brasil: Marina
Silva  e Dilma Rousseff.

Leonardo Boff escreveu com Rose Marie Muraro Feminino
e masculino.Uma nova consciência para o encontro das diferenças (2002).

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