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Paradoxos do mundo presente por Luís Carlos Lopes

3 - 4 minutos de leituraModo Leitura

Curiosamente, em um momento histórico onde a sustentação de
um golpe é problemática, o grau de mobilização externa é bem menor do que no
passado. Em outras épocas, a solidariedade mundial seria muito maior e bem mais
atuante. O povo hondurenho está bravamente enfrentando sua cruz nas ruas.


Data: 11/07/2009

Não existem dúvidas de que as mídias contemporâneas criam um
universo próprio que dita às suas audiências o que elas devem ter em mente.
Consequentemente, o que devem fazer na vida concreta. Logo, pode-se falar em
controle, manipulação e até mesmo robotização do comportamento dos mais
afetados. Considera-se que existem diferenças na obtenção de resultados. Isto
porque as mensagens, apesar de serem universais, não geram comportamentos
idênticos em todo o tecido social. Como se vive em uma sociedade de massas, é
compreensível que os efeitos atinjam simultaneamente a milhões, dando a
impressão que todos foram vencidos e aceitaram desígnios que se apresentam como
vindos dos céus.

Estas mídias têm sujeitos, isto é, proprietários e
associados que as usam de acordo com os seus interesses políticos, econômicos e
até mesmo estéticos. Eduardo Galeano tem carradas de razão de reclamar da
publicidade que estimula a falta de ética e cria zumbis do consumo. Só que não
se trata mais de, exclusivamente, levar as pessoas ao desejo de comprar
mercadorias reais. É muito mais do que isto, se quer que elas se confundam com
as mercadorias, principalmente, com os símbolos que estas portam. Conseguindo-se
isto com partes substantivas do tecido social, os objetivos foram alcançados e
rios de dinheiro correm para os cofres de sempre.

É preciso convencer a
maioria que um ídolo pop seja alguém sobrenatural. Por isto, imune a qualquer
crítica, mesmo que este pratique comportamentos anti-sociais e seja um equívoco,
enquanto ser humano. Ou ainda, seja também manipulado pelas mesmas forças a quem
serve. O importante é que paire no Olimpo das personas midiáticas e de lá
comande, simbolicamente e aparentemente, a venda de inúmeros produtos das
indústrias do tempo presente. Se ele morre, é necessário prolongar ao máximo o
velório, para que ele continue a inspirar o mesmo processo, enquanto for
possível. Quando a onda cessar, certamente buscar-se-á outro, para continuar a
acesa a chama do fenômeno.

Os nazistas da primeira metade do século
passado sabiam que a repetição e o emocionalismo eram capazes de mobilizar as
massas. Por meio da prostituição da emoção, é possível naturalizar a onda
midiática ficcional apoiada em fatos reais. Fazer com que as pessoas tenham sua
capacidade racional obstruída e repitam, muitas vezes sem o saber, o roteiro
agendado pelos donos das mídias e dos poderes que as suportam.

O
terrível Golpe de Estado em Honduras, que lembra o passado tenebroso e recente
da maioria das nações latino-americanas, apesar de timidamente noticiado, não
desperta maiores paixões. Afinal, as mentes da grande maioria já estão
fortemente ocupadas com choques midiáticos e comerciais muito bem articulados
pelos mesmos de sempre. Em outras épocas, a solidariedade mundial seria muito
maior e bem mais atuante. Curiosamente, em um momento histórico onde a
sustentação de um golpe é problemática, o grau de mobilização externa é bem
menor do que no passado. O povo hondurenho está bravamente enfrentando sua cruz
nas ruas. Torçamos para que vençam.

Não há como culpar as audiências. Na
verdade, elas são fundamentalmente vítimas, sobretudo, os jovens. Sabe-se que
este veneno não é recente, na verdade simplesmente exacerbou-se a dose diária e
reveladora do conservadorismo radical do mundo contemporâneo. Resta esperar que
a onda passe e que de alguma forma o gigante adormecido desperte de seu sono
paradoxal. Isto chama a responsabilidade de quem percebe o problema e não deseja
se omitir.

Artigo publicado originalmente
em www.cartamaior.com.br

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