Pegaram o Haddad. Por Camilo Vannuchi
— Tava demorando.
— O quê?
— Pegaram o Haddad.
— Tá zoando!
— Sério. Pegaram o Haddad. Já era.
— Que papo é esse? O que você ouviu?
— Indiciado pela Polícia Federal por crime de falsidade ideológica. Esquema pra pagar dívida de campanha envolvendo uma empreiteira, tá bom pra você?
— Caraca, até o Haddad?
— Pois é. Fim da linha pro Malddad. A petralhada chora. Vai, malandra!
— Putz.
— É melhor JAIR pensando no plano C, porque o plano B também deu merda, querida. Quem mandou acreditar em petista? Cadê a saudade do teu ex agora? Ex é assim mesmo: só fode a gente.
— Péra aí, porra. Deixa eu tomar um gole d’água. Agora me conta. O que a Polícia descobriu?
— Falsidade ideológica, caralho. Ficou surda?
— Mas qual a prova? Tem recibo de transferência bancária?
— Não.
— Conta no exterior?
— Não.
— Uma sala cheia de malas repletas de dinheiro vivo?
— Não.
— Já sei: uma pasta cheia de papéis com a anotação “CX2” encontrada no apartamento do Haddad?
— Não, porra.
— Ué. Não tô entendendo.
— O dono da UTC foi quem falou. Abriu o bico. Deu a letra toda.
— Delação premiada?
— Claro. Viva a Lava Jato!
— Mas ele mostrou alguma coisa?
— Ele disse que o Vaccari, aquele salafrário, pediu dinheiro pra pagar a dívida da campanha. Dinheiro desviado, é óbvio. O meu, o seu, o nosso. Só não vê quem não quer.
— E tem áudio dessa conversa?
— Não.
— Vídeo gravado pelo sistema de segurança?
— Não.
— Vídeo de celular?
— Não.
— Puxa vida. Mas o Vaccari confirma a história, né?
— Também não. Tudo parça.
— No mínimo alguma assinatura do prefeito foi encontrada.
— Não.
— O nome dele? Ou o apelido, numa lista de propinas da UTC?
— Nada.
— Mas para a PF indiciar um ex-prefeito… Encontraram ao menos alguma obra superfaturada tocada pela UTC na gestão Haddad?
— Não. A única vez que a UTC venceu uma concorrência era para fazer um túnel na Avenida Roberto Marinho, mas a obra foi cancelada pela administração.
— Uai. Mas esse repasse da UTC entrou na conta do prefeito? Ou na conta da campanha? Vazaram cópia do extrato?
— Nada disso, chuchu. O esquema era forte. A UTC pagou uma gráfica.
— Uma gráfica?
— É. A gráfica imprimiu material de campanha pro Haddad e não recebeu. Aí pediram para a UTC honrar a dívida. Com dinheiro de propina, lógico.
— Vixe. E o dono da gráfica confirma?
— Não.
— Não? O esquema foi operado pelo diretor financeiro da gráfica?
— Não.
— Já sei, foi pelo gerente?
— Não, que mania…
— Péra. Você tá querendo me dizer que a PF indiciou um ex-prefeito com base na delação premiada de um empreiteiro que afirmou ter dado dinheiro para a campanha eleitoral do Haddad através de um pagamento feito a uma gráfica que fornecia serviços para o PT?
— Isso mesmo.
— E que o tesoureiro do PT nega, o dono da gráfica nega, o prefeito nega?
— Exatamente.
— E não tem assinatura, nem rubrica, nem áudio, nem vídeo, nem sala cheia de malas de dinheiro, nem conta no exterior, nem papelada com a anotação “cx 2”, nem extrato bancário, nem qualquer outra prova?
— Pra você ver. Os caras são ninja.
— Ninja???
— Coisa de profissional. Roubaram pra caralho e não deixaram nem uma pista sequer. Não é incrível?
— Com certeza. Essa Polícia Federal é realmente incrível.
Camilo Vannuchi é Jornalista, escritor, mestre e doutorando em Ciências da Comunicação pela USP, membro da Comissão Municipal da Verdade da Prefeitura de São Paulo
Artigo publicado originalmente em https://www.brasil247.com/pt/colunistas/camilovannuchi/337112/Pegaram-o-Haddad.htm